Título: Em ruas de Salvador, ususários à luz do dia
Autor: Martin, Isabela
Fonte: O Globo, 14/12/2008, O País, p. 3

Na Bahia, segundo Secretaria de Segurança, circulação do crack aumentou até 180%.

SALVADOR. A cena é cada vez mais degradante, entre adolescentes, adultos e até mesmo idosos moradores de rua de Salvador, principalmente os que perambulam entre a região da Calçada (cidade baixa) e o Farol da Barra, incluindo o Centro Histórico. Quase impossível apontar algum deles que não faz uso de crack, a droga cuja circulação cresceu 140% este ano na capital baiana, atingindo várias camadas sociais, segundo o Departamento de Tóxicos e Entorpecentes.

Algumas ruas de Salvador já estão marcadas pelo estigma do crack, tornando-se locais de encontro para os viciados a qualquer hora do dia. Na Rua 28 de Setembro, bem próxima à Praça Municipal, onde fica a sede da prefeitura, é comum ver pessoas com os cachimbos acesos e consumindo a droga desde as 8h até a madrugada.

O problema se expande ao aliar-se a outros, como furtos, roubos, prostituição e, em conseqüências mais extremas, ao assassinato e à morte do usuário pela degradação física e mental que a droga causa. Nesse quadro, cabem personagens diversos, desde os que foram abandonados pelas famílias, os que fugiram de casa por causa do vício e, ainda, os que seguem a tradição de parentes que morreram por causa das drogas.

É o caso de Vanessa Santos, de 20 anos, moradora de rua e garota de programa no Centro de Salvador:

¿ Nasci e fui criada aqui. Meus pais são da Cidade Nova (bairro de baixa renda da capital baiana), mas morreram por causa do crack.

Vanessa anda a maior parte do tempo ao lado de Ana Paula Maria dos Santos, de 18 anos, e Bruna Sampaio, de 20, todas viciadas em crack.

¿ Cobro R$15 pelo programa, mas elas chegam a fazer até por R$2. Não se valorizam ¿ revelou Vanessa, ao lado das amigas, detalhando os atos a que se submete e apontando os locais onde podem ser encontradas nas madrugadas.

Na rotina de Vanessa, diz ela, está a ajuda de um idoso morador da Praça da Sé.

¿ Quando acordo, passo lá, tomo banho, como alguma coisa e transo com ele, depois volto às ruas. Elas não têm um coroa para dar na mão ¿ diz ela, referindo-se às amigas.

Mas, se não tem um `namorado¿, Bruna tem os pais, no bairro de Itapuã. Ela jura, no entanto, que não espera a ajuda da família.

¿ Nunca. Jamais voltarei para casa. Tive problemas de família muito graves, vou morrer nas ruas.

O Departamento de Tóxicos e Entorpecentes (DTE), da Secretaria de Segurança Pública da Bahia, que engloba três unidades especializadas em tóxicos, registrou, nesses 11 meses, um aumento entre 150% a 180% na circulação de crack no estado.

¿ Até novembro, só as unidades do DTE apreenderam quase 23 quilos, contra 8,5 quilos em todo o ano passado. Em Salvador houve uma alta de 140% na circulação dessa droga ¿ informou o delegado Hélio Jorge, diretor do DTE.

O Centro de Documentação e Estatística Policial (Cedep) contabilizou 72,8 quilos apreendidos no estado, de janeiro a setembro, apesar de algumas delegacias não terem cumprido a determinação de fornecer os dados ao setor. Em 2007, o Cedep não tinha o recorte estatístico isolando as apreensões de crack.

¿ Mas as investigações mostram que houve um crescimento de entrada em todo estado, bem superior a 100%, por isso mais apreensões e mais prisões ¿ afirmou Hélio Jorge.