Título: O ex-mestre boêmio que personificou o AI-5
Autor: Otavio, Chico
Fonte: O Globo, 15/12/2008, O País, p. 5

Apontado como autor do ato, Gama e Silva decepcionou seus alunos da USP.

SÃO PAULO. Ninguém esperava que aquele professor gente boa, bem-humorado, que gostava de tomar chope com os alunos e fazer serenatas em noitadas boêmias, decepcionasse tanto. Na época, fim dos anos 1950, o professor Luís Antônio da Gama e Silva, de Direito Internacional Privado da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), era querido pela maioria. Mas no dia 13 de dezembro de 1968, quando era ministro da Justiça do regime militar, Gama e Silva assinou AI-5, a obra que o fez entrar para a História.

Foi um divisor de águas. Entre 1963 e 1967, ele foi reitor da USP. No meio do mandato, em 1964, logo após o golpe, foi convocado pelo ¿governo revolucionário¿ para assumir o Ministério da Educação e Cultura e, em 1967, o Ministério da Justiça. Em 1968, como ministro da Justiça, redigiu e anunciou, no dia 14 de dezembro, o AI-5.

¿ Ele não voltou mais depois que foi para o governo militar. A única coisa que havia lá na faculdade, reação comum dos estudantes, era de não entender como um professor de Direito foi redigir um ato institucional como aquele, que suprimia todos os direitos dos indivíduos. Não podia passar pela cabeça de qualquer estudante que ele fizesse aquela coisa abominável, ¿ lembra o advogado Marcos Aurélio Ribeiro, aluno da Faculdade de Direito na época.

Já o advogado José Ignácio Botelho de Mesquita, ex-aluno de Gama e Silva e professor emérito da faculdade, reconhece que a paternidade do ato agravou o sofrimento da Faculdade de Direito com as arbitrariedades que viriam depois.

¿ A coisa foi particularmente difícil porque vinha assinada pelo Gama e Silva, nosso professor.

Em 1944, Gama e Silva foi nomeado livre-docente de Direito Internacional Privado e recebeu o título de doutor em Direito. Em 1953, foi aprovado por unanimidade quando concorreu à cátedra da disciplina na faculdade onde havia se formado.

¿ Ele não tinha nada de brilhante. Era um professor desses que corteja aluno. Mas não se sobressaía nenhum pouco nesta casa. Quando se fala no AI-5, fala-se nos militares. Ele era um servidor dos militares. Não foi além disso ¿ comenta Plínio de Arruda Sampaio, um dos fundadores do PT, hoje no PSOL, ex-aluno de Gama e Silva.