Título: Militares que roubaram doações para desabrigados vão responder a IPM
Autor: Perboni , Juraci
Fonte: O Globo, 17/12/2008, O País, p. 4

Dez soldados e um sargento estão detidos e deverão ser ouvidos a partir de hoje.

FLORIANÓPOLIS. Os dez soldados e um sargento do Exército flagrados numa reportagem da RBS TV, afiliada da TV Globo, furtando donativos destinados a vítimas das enchentes em Santa Catarina deverão ser ouvidos a partir de hoje no inquérito policial militar (IPM) aberto para investigar a participação deles na ação que chocou o país. O Exército abrira sindicância para apurar a transgressão às suas normas, mas, ontem à tarde, o caso se transformou em IPM, diante do indícios de crime e da repercussão. Todos estão detidos no 23º Batalhão de Infantaria de Blumenau.

De acordo com o comandante da 14ª Brigada de Infantaria Motorizada em Florianópolis, general Manoel Luiz Pafiadache, responsável pelo Batalhão do Exército em Blumenau ao qual pertenciam os militares, os objetos furtados do pavilhão 1 do Parque da Vila Germânica foram devolvidos sábado, quando o comando soube da reportagem:

- Ainda não sabemos se foram todos que participaram. Vamos ouvir um por um. O que aconteceu foi falta de comando, de liderança do responsável pelo grupo, que era o sargento.

O general explicou que o fato de não ter havido o flagrante contra os soldados faz com que o caso precise agora ter uma apuração mais demorada. Ele disse que os militares poderão ser presos e até expulsos da corporação.

- Mas isso vai depender de decisão da Justiça Militar - disse o general, que não revelou o nome dos envolvidos.

Diante da repercussão do episódio, os militares do Exército que faziam a triagem dos donativos não estão mais no pavilhão 1. Porém, cerca de 800 homens continuam atuando nos abrigos e na segurança dos milhares de desabrigados.

Segurança do pavilhão em Blumenau é reforçada

Ontem, no pavilhão 1 da Vila Germânica, houve reforço na segurança e na de entrada e saída dos voluntários, após o episódio do furto de donativos. O secretário estadual de Desenvolvimento Regional, Paulo França, que gerencia o espaço, disse que já foram contratadas 13 pessoas para o setor de carga e descarga das produtos doados:

- Os voluntários só atuarão na montagem de cestas básicas e da separação de roupas e dos kits de higiene e limpeza.

França admitiu falhas, ao não se fazer um controle rígido dos voluntários. O secretário informou que deveria concluir ainda ontem a contratação de uma empresa de logística, encarregada de coordenar o recebimento e o despacho das doações para todo o estado.

Segundo o secretário, será definido novo local para o recebimento das doações. Do pavilhão 1, administrado pelo estado, saem os caminhões com as cestas básicas e os kits para os órgãos de defesa civil dos municípios do Vale do Itajaí, que atendem os desabrigados da região.

O Ministério Público Estadual enviou ontem aos promotores pedido para que obtenham dos municípios a lista das pessoas atingidas pelas cheias e se elas estão sendo atendidas. O objetivo é saber se não há desvio de finalidade dos donativos. Anteontem, o promotor Fabrício Cavalcanti, informou que investigará as irregularidades.

Os voluntários foram orientados também pelos promotores a denunciar os casos de irregularidades. Uma voluntária disse ontem que esse problema já vinha ocorrendo. A costureira Eliane Pedroso Alves, que está ajudando desde quinta-feira passada no pavilhão 1, disse ontem que senhora que apareceu na reportagem só separava as melhores roupas, o que gerou desconfiança entre os voluntários.

- Alguém do grupo chamou a sua atenção, mas ela respondeu que sabia o que estava fazendo. Mas, depois, ela saiu dali. E ninguém mais a viu, a não ser pela reportagem da televisão. Isso é gente que já pensa em fazer o mal - disse a costureira.

A estudante Janaína Cunha, voluntária desde o primeiro dia da tragédia, afirmou que o desvio foi um choque para todos, mas frisou que o trabalho não pode ser prejudicado por isso.

- Muitos voluntários deixaram de vir aqui por causa do episódio. Todo mundo ficou com medo de ser identificado como ladrão - disse.

Janaína, porém, ressaltou que o local precisa de mais pessoas para o trabalho.

* Especial para O GLOBO

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