Título: Três meses depois, nada se sabe sobre grampo
Autor: Carvalho, Jailton de
Fonte: O Globo, 18/12/2008, O País, p. 12

PF deve encerrar em janeiro investigações sobre escuta no STF, que até hoje não têm provas nem suspeitos.

BRASÍLIA. Os delegados da Polícia Federal Rômulo Berredo e William Morad deverão encerrar em janeiro as investigações sobre o suposto grampo em telefones do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes. Até o momento, depois de analisar os depoimentos de mais de 120 pessoas ao longo de três meses de investigação, os dois delegados não têm qualquer indício de autoria ou mesmo da existência do grampo. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva espera o resultado do inquérito para decidir se reconduz o delegado Paulo Lacerda ao comando da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).

- Não há dados que levem a uma pista da autoria, até porque ainda nem temos provas de se existe ou não a materialidade do crime - disse Berredo.

Segundo o delegado, a conclusão das investigações dependerá, a partir de agora, do resultado das perícias que o Instituto Nacional de Criminalística (INC) faz sobre dados e material coletado nas centrais telefônicas do STF, do Senado e das empresas de telefonia Vivo e Brasil Telecom. Na análise preliminar, peritos não encontraram indícios de grampo em telefones de Gilmar.

"É crime contra o Estado", diz delegado da PF

O escândalo teve início em setembro, quando a revista "Veja" divulgou trechos de uma conversa telefônica entre Gilmar e o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) e apontou como suspeitos agentes da Abin, órgão de assessoria da Presidência da República, e integrantes da equipe do delegado Protógenes Queiroz, ex-coordenador da Operação Satiagraha - que investiga o banqueiro Daniel Dantas. A revista não apresentou o áudio da gravação, que, para a polícia, seria um dado básico para amparar a acusação de escuta ilegal.

Diante da pressão de Gilmar e do ministro da Defesa, Nelson Jobim, Lula decidiu afastar Paulo Lacerda do comando da Abin até a conclusão do inquérito da PF sobre o assunto. Para a polícia, as acusações são de extrema gravidade. Berredo entende que a denúncia está relacionada a um crime contra o Estado. Não se limita apenas à bisbilhotice, invasão de privacidade ou vazamento de dados sigilosos. Isso explicaria a extrema preocupação com a busca de dados que comprovem a existência do grampo.

- Estamos diante de um caso muito grave. Imagina se se acusa a CIA de grampear um ministro da Suprema Corte dos Estados Unidos? É crime contra o Estado - disse Berredo.

Ao longo das investigações, a PF ouviu mais de 120 pessoas. Mais de 80 são agentes da Abin, que atuaram na Satiagraha ou que, de alguma forma, tiveram os nomes citados durante a apuração do caso. Já foram ouvidos também técnicos e seguranças do STF, do Senado e das companhias telefônicas que prestam serviços ao Supremo. Nenhum dos interrogados assumiu culpa ou apontou responsabilidades. Alguns levantaram hipóteses, consideradas inconsistentes à luz das informações recolhidas até o momento.

Segundo Berredo, todas as possibilidades estão sendo examinadas, e o desfecho da investigação, seja ele qual for, estará ancorado em provas técnicas. Mesmo que a conclusão seja que não é possível afirmar se houve ou não grampo sem a existência do áudio.