Título: Batalha urbana começa
Autor: Malkes, Renata
Fonte: O Globo, 06/01/2009, O Mundo, p. 25

Soldados israelenses combatem Hamas na Cidade de Gaza. Aumenta número de vítimas civis.

Com tropas operando já em toda a Faixa de Gaza, o décimo dia da ação militar israelense foi o mais sangrento desde o início da ofensiva por terra. Pesados bombardeios aéreos e de artilharia sacudiram o território palestino na noite de ontem, provocando bolas de fogo e densas nuvens de fumaça no centro da Cidade de Gaza, onde moram 400 mil dos 1,5 milhão de moradores da região. Pela primeira vez desde o sábado, dia da invasão, soldados de Israel combateram diretamente milicianos do Hamas em áreas urbanas.

Centenas de tanques e blindados formaram um cordão de isolamento nas regiões de Khan Yunis, no sul, e em Shajaieh, no norte, dividindo a Faixa de Gaza em três setores isolados. Fontes palestinas dizem que pelo menos 50 pessoas morreram ontem, a maioria civis. Médicos afirmam que mais de 550 pessoas morreram desde o início dos bombardeios, no dia 27 de dezembro, mas a proporção de civis mortos aumentou desde o início dos combates em terra. Pelo menos 20 crianças foram mortas ontem, segundo o médico Moaiya Hassanain.

Enquanto o número de mortos e feridos não para de crescer, a ministra do Exterior de Israel, Tzipi Livni, voltou a rejeitar um cessar-fogo, alegando que o país está numa ação de autodefesa. O número dois do Hamas em Gaza, Mahmoud al-Zahar, garantiu que o grupo não vai interromper o lançamento de foguetes contra Israel.

As tropas encontram forte resistência do Hamas nos confrontos por terra, mas cerca de 80 extremistas e suspeitos foram presos e levados para interrogatório em território israelense. A movimentação dos soldados é lenta e os pelotões dependem dos bombardeios da Força Aérea para avançar.

Ontem a aviação israelense atacou 130 alvos em Gaza. Os bombardeios foram concentrados em túneis clandestinos ao longo da fronteira com o Egito. Na Cidade de Gaza, uma mesquita que, segundo Israel, seria usada como depósito de armas, foi atacada. Uma família de 13 pessoas morreu na explosão. Nos arredores da capital de Gaza, um disparo de artilharia matou dois irmãos e um primo, todos com menos de 6 anos.

Depois de cercar diversos municípios e fazer pequenas incursões em bairros residenciais, os confrontos ganharam força em áreas densamente habitadas de Cidade de Gaza, Beit Lahiya e Beit Hanoun. As TVs árabes al-Jazeera e al-Arabiya disseram que três soldados israelenses foram mortos ontem, mas Israel não confirmou a informação.

Hamas aceita discutir crise no Egito

Na Cidade de Gaza, o comerciante palestino Omar al-Jamal, de 56 anos, contou que está preso na região desde a última viagem ao Brasil, no início de 2008. Nascido no território palestino, ele morou no Rio de Janeiro durante 33 anos e viajou a Gaza para resolver pendências na Justiça após a morte de seus pais. Ele não descarta a possibilidade de acionar a Cruz Vermelha e pedir ajuda para fugir da zona de combates.

¿ Nunca imaginei uma crise deste porte. Estamos todos com muito medo, não dormimos com o ruído das bombas e não temos luz, nem TV. Sei que há muitos civis morrendo e espero que tudo termine logo ¿ disse ele, por telefone.

Um repórter a serviço de uma TV iraniana foi preso por driblar as ordens da censura militar de não enviar reportagens durante os estágios iniciais da ofensiva terrestre. O jornalista é morador de Jerusalém Oriental e foi interrogado.

No campo diplomático, o governo rejeitou a proposta europeia de permitir o acesso de observadores em Gaza. Analistas acreditam que a negativa israelense em discutir uma trégua tem razão política. Às vésperas das eleições gerais, previstas para 10 de fevereiro, outdoors de Livni e do ministro da Defesa, Ehud Barak, foram espalhados na região sob fogo do Hamas.

¿ Sair de Gaza sem atingir objetivos concretos pode acabar com as chances de Livni e Barak nas eleições. Além disso, o Exército está determinado a vencer, para apagar o fiasco no Líbano, há dois anos ¿ avaliou o analista político Amit Segal, do Canal 10.

Mesmo sob a pressão, o Hamas lançou pelo menos 35 foguetes ontem contra Israel. Duas pessoas ficaram feridas no kibutz Shaar Hanegev. Em Ashdod, um foguete caiu numa creche vazia. Ashkelon foi a cidade mais castigada. Por volta do meio-dia, cinco foguetes caíram num intervalo de 15 minutos, levando pânico à população.

Apesar da mensagem de força, o grupo islâmico pode ter dado seu primeiro sinal de fraqueza ao aceitar o convite do presidente do Egito, Hosni Mubarak, para uma reunião de emergência a fim de discutir a crise, no Cairo. O encontro deve acontecer hoje, e o Hamas enviou dois membros de sua cúpula vindos de Damasco.

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