Título: A Amazônia pertence a todos nós, diz francês
Autor: Berlinck, Deborah
Fonte: O Globo, 20/12/2008, O País, p. 15

Às vésperas do encontro de Lula com Sarkozy, assessor do governo da França diz que a UE cobrará do Brasil redução de gases

Deborah Berlinck

PARIS. A União Européia (UE) quer que o Brasil assuma agora o compromisso de uma meta para redução de suas emissões de gases poluentes, como fez o bloco na semana passada, em Bruxelas, ao decidir diminuí-las em 20% até 2020. O governo brasileiro sempre se opôs à idéia, alegando o princípio das "responsabilidades diferenciadas": cabe aos grandes poluidores pagar a maior parte da conta do estrago e dar o primeiro passo.

O presidente francês Nicolas Sarkozy não concorda. Em entrevista, seu conselheiro diplomático, Jean-David Levitte, disse que "países como o Brasil podem e devem fazer mais", e entrou em terreno delicado para nacionalistas brasileiros, dizendo que a Amazônia "é de todos":

- O Brasil tem que aceitar a negociação e aceitar fazer um esforço traduzido por números precisos. A Amazônia está desaparecendo e pertence a todos nós, ao contrário do que o Brasil defende. O Brasil vai precisar se mexer e se engajar mais.

Este será um dos desafios de Sarkozy nos dois dias de sua visita oficial ao Brasil, a partir de segunda-feira: convencer o governo Lula a mudar sua política sobre o assunto. Mas há outros temas delicados, como a reforma do Conselho de Segurança da ONU. O Brasil batalha há anos para obter uma cadeira permanente no conselho. França, Inglaterra e Alemanha apóiam a reforma, para incorporar Brasil e outras potências, como Japão e a própria Alemanha. Mas Itália e Espanha - porque vão ficar de fora -- são contra.

Levitte disse ontem aos jornalistas que a Itália "aceitou fazer um pequeno gesto". Não disse qual. Mas o tema será discutido entre Lula e Sarkozy:

- São negociações duras e difíceis, porque a União Européia não tem posição única.

Uma coisa é certa: com ou sem oposição dos países, o governo brasileiro quer uma menção à ampliação no Conselho de Segurança no documento da cúpula Brasil e União Européia.

- O que não pode é não entrar (uma menção) - comentou um negociador brasileiro.

Imigração é outro dos temas delicados do encontro

A política agrícola européia - atacada pelo Brasil como altamente protecionista - e imigração são outros temas difíceis dos encontros. Sarkozy quer explicar a Lula a política de imigração da UE. O presidente brasileiro tem batido forte contra um plano adotado pelos europeus, por iniciativa da França, que prevê imigração seletiva e a expulsão em massa de clandestinos. Chegou a levantar a questão com o Papa Bento XVI, na visita oficial a Roma, em novembro.

- A reforma foi extremamente mal vista pela América Latina, no entanto outras regiões de onde muito mais imigrantes chegam à Europa, como a África, compreenderam o procedimento com mais naturalidade. Não demos a atenção necessária à América Latina, e isso causou muitos mal-entendidos, sobre os quais pretendemos nos explicar melhor - reconheceu Levitte.

Sarkozy vem ao Brasil para participar de duas cúpulas: uma entre a União Européia e o Brasil e outra bilateral entre França e Brasil. O encontro bilateral será marcado pelo anúncio de parceria estratégica com o Brasil, que resultará em "plano de ação concreto", segundo Levitte. Os dois países vão assinar tratados para preservar florestas na fronteira entre o Brasil e a Guiana Francesa, criar uma rede de pesquisas na Amazônia e transferir tecnologia para combater o garimpo ilegal na floresta.