Título: STF vai decidir briga entre Senado e Câmara
Autor: Vasconcelos, Adriana; Braga, Isabel
Fonte: O Globo, 20/12/2008, O País, p. 8

FARRA FISCAL: "O Supremo promulgar em nome de uma das Casas aí seria uma bagunça total", diz Demóstenes

Garibaldi recorre à Corte e acirra confronto com Chinaglia por causa de emenda que aumenta número de vereadores

Adriana Vasconcelos e Isabel Braga

BRASÍLIA. O clima de confronto entre os presidentes do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), e da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), por causa da polêmica aprovação de 7,3 mil novas vagas de vereadores, prosseguiu ontem sem qualquer sinal de trégua. Por ordem de Garibaldi, o advogado-geral do Senado, Luiz Fernando Bandeira de Mello, protocolou no Supremo Tribunal Federal (STF) mandado de segurança, com pedido de liminar, solicitando que a Mesa da Câmara assine a promulgação da proposta de emenda constitucional que recria 7.343 vagas de vereadores em todo o país, aprovada na madrugada de quinta-feira pelos senadores.

- Se o Supremo der a liminar, dará para promulgar a emenda na próxima segunda-feira - previu Garibaldi.

A Câmara se recusa a assinar a promulgação porque os senadores retiraram do texto, aprovado anteriormente pelos deputados, um artigo que reduz os gastos das câmaras legislativas.

"Tenho dor de cabeça demais"

De manhã, Chinaglia negou que essa recusa seja uma retaliação à decisão do Senado, semanas atrás, de devolver ao Executivo a MP da Filantropia que fora aprovada pela Câmara. Mas manteve o tom beligerante e cobrou uma definição da Comissão de Constituição e Justiça do Senado sobre essa devolução determinada por Garibaldi:

- Nesse nível não dá para discutir, e quero dizer que até hoje, na nossa compreensão, a MP (da Filantropia) está valendo. Quero que, de maneira formal, o Senado nos explique, para que eu possa informar a quem for me suceder (no cargo, em fevereiro). Temos que ter a responsabilidade de condução de acordo com as regras. Afinal, está devolvida ou não? Como gesto simbólico político, aplausos. Mas daí a abdicar do rigor da lei... Tenho dor de cabeça demais.

Ao saber da cobrança de Chinaglia sobre a MP da Filantropia, Garibaldi reagiu com ironia:

- Acho que está faltando espírito natalino. Essa cobrança não tem muita razão de ser. O assunto está sendo resolvido no Senado, onde o problema começou. Não há por que fazer disso um contencioso.

Para Chinaglia, a relação da Câmara e do Senado vinha sendo boa até as duas Casas divergirem sobre a emenda dos vereadores:

- Primeiro fingiram alguns que não sabiam que a decisão (da Mesa da Câmara) foi unânime e que os representantes de seus partidos participaram. Faltou a alguns honestidade intelectual. Ao atacar a Mesa, estão invertendo valores.

O mandado de segurança impetrado pelo Senado ressalta que a recusa da Câmara em promulgar a emenda, em razão de essa ter sido desmembrada, não se sustenta, até porque esse recurso já teria sido usado em pelo menos duas ocasiões: durante as reformas do Judiciário e da Previdência. No STF, o ministro Carlos Alberto Direito foi designado relator, mas ontem mesmo ele já estava de férias no Rio e só deve voltar dia 2. O presidente, Gilmar Mendes, como plantonista da mais alta Corte do Judiciário, poderá decidir sobre a questão a qualquer momento.

O Senado contesta ainda o argumento de que a parte aprovada da emenda dos vereadores, que aumenta o número de vagas nas câmaras municipais, independe da segunda, que reduziria repasses orçamentários. "Não há, pois, como sustentar juridicamente que uma norma é dependente da outra: são absolutamente autônomas e imediatamente aplicáveis. O que pretende fazer a Mesa da Câmara, ao buscar colher louros políticos defendendo uma vinculação juridicamente descabida, não é admissível sob a ótica da jurisprudência desta Colenda Corte". Ao analisar o pedido, o STF poderá intimar o presidente da Câmara para dar informações.

Demóstenes Torres (DEM-GO), que votou a favor da emenda, avaliou ontem que, diante do recesso parlamentar que começa segunda-feira, e das eleições para o comando do Congresso, a situação vai ficar indefinida até fevereiro:

- Os dois atuais titulares das Mesas não poderão mais resolver, ainda que tenham tempo durante as férias para isso, porque vai cada qual gerar um constrangimento se retroagir a sua Casa, de sorte que o impasse político está criado, acho que ele não tem solução, pelo menos até 1º de fevereiro.

- Nada melhor do que o presidente Garibaldi sentar com o presidente Chinaglia e acharem uma saída política - disse Tião Viana (PT-AC).

Já Demóstenes partiu para o ataque ao presidente da Câmara, argumentando que a criação do impasse foi uma "injuricidade" de Chinaglia "com o único objetivo de aparecer". Para ele, o melhor seria ter uma solução sem a participação do STF:

- O Supremo entrar e promulgar em nome de uma das Casas, aí seria uma bagunça total, porque a promulgação é um ato exclusivo do Congresso, equivale à sanção do Presidente da República num projeto de lei.

COLABOROU Rodrigo Vizeu

oglobo.com.br/pais