Título: Para CPI, delegada fez gravações ilegais
Autor: Sallum, Samanta
Fonte: Correio Braziliense, 19/03/2009, Cidades, p. 37

Comissão da Câmara dos Deputados que investiga escutas irregulares pede o indiciamento de Eneida Taquary por registrar conversas de advogados em apuração de denúncia no caso das fraudes da OAB-DF

A CPI do Grampo na Câmara dos Deputados pediu o indiciamento da delegada da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) Eneida Taquary por ter realizado escutas ilegais. As gravações se referem às investigações de outro crime: fraudes no Exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Os personagens envolvidos são advogados que travam uma disputa pela direção regional da entidade.

A história começa em 2006, quando as provas do segundo semestre da OAB-DF foram alvo de fraudes. A Polícia Federal (PF) e o Ministério Público Federal (MPF) abriram investigação. A própria entidade também apurou as denúncias internamente. Os problemas recaíram no então vice-presidente da seccional, Thompson Flores, que era presidente da Comissão de Exame de Ordem.

A primeira a ser acusada, por ele mesmo, foi a examinadora da sua própria banca: a professora de Direito Penal Priscila Almeida. Ela foi denunciada por beneficiar candidatos em troca de vantagem financeira. No entanto, Priscila deu um depoimento ao MPF apontando vários problemas de segurança e revelando que o esquema poderia ser maior e envolver mais pessoas. O desgaste com o caso levou ao afastamento de Thompson, apesar de nada ter sido provado contra ele. Mas, por ser responsável pela organização do exame, teve de deixar o cargo.

A delegada Eneida Taquary entra nessa história quando procurada, no início do ano passado, pela ex-secretária particular de Thompson Flores na OAB, Janaina Faustino. Ela contou à delegada que estaria sendo perseguida por um grupo de advogados. Na versão da ex-secretária, eles queriam que ela delatasse a direção da OAB ao MPF. O objetivo era incriminar a presidente da OAB-DF, Estefânia Viveiros, no caso das fraudes. Taquary, na época, era titular da delegacia do Lago Norte. Até então, toda a investigação do caso estava com a PF e o MPF.

Dois encontros de Janaína, ocorridos em 12 e 14 de fevereiro no bar Schloss (309 Norte), foram gravados por agentes da Polícia Civil. Nas imagens, a que o Correio teve acesso, os advogados Guilherme Castelo Branco, Luis Saboia e Ulysses Borges tentam convencer a ex-secretária de Thompson Flores a contar tudo o que sabia sobre as fraudes no exame ao Ministério Público. No inquérito aberto pela delegada Eneida Taquary, consta que Janaína foi procurada para que delatasse falsamente Thompson Flores e Estefânia Viveiros.

Quando as gravações se tornaram públicas, Thompson Flores usou-as em sua defesa. Apontou que eram prova de que ele havia sido vítima de uma trama para derrubá-lo da OAB por questões de disputa eleitoral. Os advogados, no entanto, rebateram afirmando que eles haviam sido alvo de uma armadilha. Criticaram a postura da delegada pelo fato de ela ser próxima a Thompson Flores ¿ que era chefe dela em uma faculdade de direito. O laudo oficial das degravações, feito pela PF, ficou pronto há cerca de dois meses, mas é inconclusivo.

O caso foi parar na CPI do Grampo. Janaína e Thompson foram convidados a prestar informações sobre as gravações. Os advogados gravados alegaram que a delegada Eneida Taquary tinha cometido irregularidades na investigação, que não teria competência e nem respaldo legal para realizar a escuta ambiental. Taquary foi procurada pelo Correio e informou, pela Divisão de Comunicação Social da Polícia Civil, que não se pronunciaria sobre o caso. Mesma postura do advogado Thompson Flores e da direção da OAB-DF.

¿A conclusão da CPI e o laudo da PF reforçam que as acusações contra nós são equivocadas. Agimos dentro da lisura, sempre em busca somente da verdade¿, disse Ulysses Borges.

Uma denúncia pela conduta da delegada no caso chegou à Corregedoria da Polícia Civil e acabou arquivada. O deputado Laerte Bessa (PMDB-DF), membro da CPI do Grampo, e ex-diretor-geral da PCDF criticou o relatório da comissão. Saiu em defesa dos delegados e policiais do DF apontados no documento. ¿Esse pedido de indiciamento é descabido. A CPI não investigou profundamente para concluir se realmente houve crime. Foi uma análise superficial. Não quero proteger alguém. Mas não posso concordar com injustiça¿, disse Bessa.