Título: Fora de hora
Autor:
Fonte: O Globo, 21/12/2008, Opinião, p. 6

TEMA EM DISCUSSÃO: Reeleição e mandatos

A reforma política já foi chamada de a "mãe de todas as reformas". Com razão, pois quanto mais bem construídas as fundações jurídico-legais do sistema político e partidário melhor a qualidade da representação nas Casas legislativas, maior a legitimidade dos partidos, mais oxigenado o regime democrático. O termo freqüentou muitos discursos, andou de boca em boca, e pensou-se que a Constituinte de 87 seria a chance para se executar a reforma de que o país necessitaria na reconstrução da democracia.

Constatou-se depois que o clima da época, com o país saindo da ditadura militar, impediria uma reflexão serena sobre o que fazer. Basta recordar a explosão de legendas, uma catarse para compensar a camisa-de-força do bipartidarismo forçado dos Anos de Chumbo. O próprio corporativismo parlamentar e certas alianças partidárias impediriam, como impedem, necessárias alterações no sistema de cláusula de barreira para acabar com as legendas de aluguel e facilitar, bem como sanear, as negociações para a formação de maiorias.

A rigor, estabelecida, na primeira fase da gestão de FH, a possibilidade de uma reeleição, e fixado o mandato em quatro anos para cargos majoritários, as alterações nas regras do jogo político-partidário que ainda faltam não merecem sequer o nome de reforma. São mudanças tópicas para fazer valer o bom conceito de fidelidade partidária, reduzir o número de legendas com assento no Legislativo, acabar com o senador sem voto (o suplente), assim como a possibilidade de coligação em eleições proporcionais.

Não há muito mais o que fazer. O PT e aliados se batem pelo fim da reeleição, com a extensão do mandato para cinco anos. Bastou isso para surgir o temor de um "golpe" legislativo para conceder a Lula o terceiro mandato consecutivo. A preocupação se justifica pelas pressões que devem partir de companheiros que usufruem poder e acesso a recursos públicos e temem pelo risco de o partido perder a eleição presidencial de 2010. Criam-se fórmulas para provar que o terceiro mandato consecutivo - uma heresia num regime democrático - está fora de questão no partido. Mas o problema não é apenas este: também não faz sentido mudar o sistema de reeleição e os mandatos. O modelo de virtuais oito anos de gestão, com a possibilidade de um "recall" após os primeiros quatro, ainda não foi suficientemente testado. Até agora funciona bem. Como provam os governos FH e Lula.