Título: Brasil e UE pela reforma do sistema
Autor: Almeida, Cássia; Bôas, Bruno Villas
Fonte: O Globo, 23/12/2008, Economia, p. 19

Sarkozy e Lula defenderão no G-20 mesma posição sobre fiscalização do setor financeiro.

AII Cúpula Brasil-União Européia, que acontece em meio à maior crise financeira global das últimas décadas, marcou a união do bloco europeu e do Brasil na defesa de reformas no sistema financeiro mundial. Num plano de ação acertado ontem à tarde, no Rio, falou-se de tudo, desde cultura a submarinos nucleares. O presidente da França, Nicolas Sarkozy, foi claro ao mostrar a disposição de chegar à reunião do G-20, que reúne as principais economias do mundo mais a União Européia, em abril, em Londres, com uma só posição.

- Brasil e Europa parecem falar a mesma língua na questão das mudanças no funcionamento do sistema financeiro mundial. Estamos decididos a fazer com que as coisas mudem profundamente. Decidimos, portanto, estreitar nossas posições e chegar a Londres com uma visão comum do papel do FMI (Fundo Monetário Internacional) no futuro e do sistema de controle de fiscalização das instituições financeiras - disse Sarkozy, presidente também do Conselho da União Européia.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que a parceria entre o bloco europeu e o Brasil trouxe convergência de interesses:

- Nesse momento de tanta incerteza e turbulência no cenário global, podemos trabalhar juntos em temas cruciais para nossos países e para comunidade internacional.

Lula: "especulação desavergonhada"

Mais cedo, durante palestra para empresários brasileiros e franceses, o presidente Lula falou, de improviso, da especulação exacerbada do mercado financeiro:

- Todos nós sabemos que essa crise é resultado de uma especulação financeira desavergonhada. Todos nós sabemos que o petróleo nunca valeu US$150 o barril.

Sarkozy afirmou que é necessário lançar as bases de um sistema monetário mais equilibrado, em "todas as grandes moedas do mundo, e digo no plural, e não no singular".

Nesse trabalho conjunto, Sarkozy falou da Organização Mundial do Comércio (OMC) e se opôs ao protecionismo:

- Apreciei muito os apelos lançados pelo presidente Lula nas negociações da OMC para a Rodada de Doha. Não há nada pior do que protecionismo e é uma convicção muito arraigada do presidente José Manuel Durão Barroso (da Comissão Européia). Vamos trabalhar com o presidente Lula em iniciativas futuras em matéria de OMC - disse o presidente francês mais cedo.

Lula aproveitou para falar de uma das questões nas quais há mais divergências com a Europa: as barreiras aos produtos agrícolas. Lula afirmou que há espaço para crescimento e diversificação, citando o diálogo com "ênfase nos problemas sanitários e fitossanitários".

O presidente Lula aproveitou para responder às críticas de que é muito otimista, diante da crise.

- As pessoas acham que eu deveria ir para a televisão chorar, reclamar, dizer que a crise acabou com o país - disse, acrescentando que é o fluxo de produção e de comercialização que leva a economia para frente. Na mensagem de Natal do presidente que foi ao ar ontem à noite, Lula afirmou que o brasileiro não deve "frustrar seu sonho com medo do futuro":

- A crise não nos assusta.

Amazônia: partilha de benefícios

A Amazônia freqüentou os discursos dos presidentes. Lula lembrou o compromisso de reduzir em 70% o desmatamento da região até 2017.

- A Amazônia é brasileira, mas nós queremos partilhar os benefícios, sobretudo no que diz respeito à sua biodiversidade.

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, respondeu ao assessor do governo francês, Jean-David Levitte, que dissera no sábado, no GLOBO, que a Amazônia era de todos:

- Ele devia estar se referindo à Amazônia na Guiana Francesa. A Amazônia brasileira é nossa.

José Manuel Durão Barroso, presidente da Comissão Européia, disse que "a Amazônia é brasileira":

- Sabemos disso. Mas, sem dúvida, é um problema global.