Título: O ano em que a bolha estourou
Autor: Rangel, Juliana
Fonte: O Globo, 31/12/2008, Economia, p. 21

Bovespa fecha 2008 com queda de 41%, a pior em 36 anos. Dólar acumula alta de 31%.

Abolha das ações e dos preços das commodities estourou em 2008 e respingou no investidor brasileiro. O Ibovespa, principal índice da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), encerrou o ano com variação negativa de 41,2%, o pior resultado anual desde 1972, quando caiu 44,42%. Já os fundos FGTS-Vale e FGTS-Petrobras, após quatro anos como as melhores aplicações, lideraram as perdas entre os investimentos, com queda superior a 50%. Na outra ponta, o dólar - que chegou à mínima de R$1,55 em agosto -, na lanterninha há cinco anos, disparou 31,34% e levou os fundos cambiais a lucro anual de 37,61%.

Segundo dados da Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid), os fundos de renda fixa tiveram o segundo melhor resultado do ano, com ganhos médios de 12,62% até 24 de dezembro. Os fundos DI se valorizaram 11,9% e os CDBs, 10,69%, em média. Já os fundos multimercados, promessa de sucesso de 2008, renderam apenas 4,74%, em média, abaixo da poupança, com 7,90%.

Nas bolsas mundiais, o resultado não foi diferente. As asiáticas tiveram seu pior ano desde 1990: Japão teve queda de 42,1%, Coréia do Sul, de 40,7%, e Taiwan, de 46%. A Bolsa de Xangai acumulou perda de 62,8%, segundo a Bloomberg News. A Islândia teve o maior prejuízo: 97,1%. Na Europa, Frankfurt, até ontem, havia recuado 42,4% em 2008, o pior resultado em seis anos. Paris acumulava queda de 44,7%, e Londres, de 32,4%, a maior desde 1985, segundo o jornal britânico "Financial Times". Em Nova York, ainda segundo o "FT", os mercados caminham para o pior ano desde a Grande Depressão. O S&P acumulava perda de 39,3% e o Dow Jones, de 34,7%. Em 1931, eles perderam 47,1% e 52,7%, respectivamente. Nasdaq recua 41,5%.

Segundo o administrador de investimentos Fabio Colombo, o mundo viveu uma série de situações artificiais nos últimos anos. Entre elas, os preços das commodities. O petróleo, por exemplo, encostou em US$150, impulsionando as ações da Petrobras, de mineradoras e siderúrgicas. Influenciada por esses papéis, a Bovespa atingiu sua máxima histórica em maio, de 73.516 pontos, quando outros mercados já estavam em fase de correção.

- Nos últimos anos, o mundo cresceu a um ritmo muito forte devido à expansão da China e de outras economias emergentes. As commodities dispararam e houve uma conversa de que o Brasil se descolaria dos EUA. Era insustentável - avalia Colombo, para quem a alta da Bolsa por cinco anos seguidos não tinha precedentes. - Da mesma forma que ela subiu muito, com economistas projetando o Ibovespa a 80 mil pontos, a queda foi forte quando o cenário se deteriorou.

GM ganha US$6 bi do Tesouro dos EUA

Para o economista da Ágora Corretora Álvaro Bandeira, a aversão ao risco contribuiu para a valorização do dólar. Segundo ele, investidores buscaram aplicações conservadoras, como títulos do Tesouro americano, o que fortaleceu a moeda dos EUA e enxugou o dinheiro em circulação nos países emergentes. O superintendente de Tesouraria do Banif, Rodrigo Trotta, também prevê mais turbulência. E indica aplicações conservadoras:

- O Brasil ainda tem um dos maiores juros reais do mundo. Em momentos de instabilidade, nada melhor que renda fixa.

Em visita a Pernambuco, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem que não permitirá que o problema afete as camadas pobres da população, que, segundo ele, "não pagarão a conta da crise neste país".

- Estados Unidos e Europa são grandes compradores (das exportações brasileiras). Por isso, estou torcendo para que a Europa resolva logo o seu problema e Barack Obama tome posse, e resolva logo o dos EUA.

Em dezembro, os fundos FGTS Petrobras recuperaram parte das perdas e subiram 8,8%, diante da alta do petróleo com o corte de produção da Opep e o conflito no Oriente Médio. Em seguida, vieram fundos cambiais, com alta de 2,67%, e multimercados, de 1,27%. Fundos de renda fixa e DI subiram 1,14% e 0,89%, respectivamente. O pior resultado foi dos fundos FGTS Vale, que perderam 6,10%.

No último pregão do ano, o Ibovespa subiu 1,32%, para 37.550 pontos. O volume de negociação foi de apenas R$2,6 bilhões, com investidores fazendo pequenos ajustes nas carteiras, já que as bolsas americanas funcionam hoje. O dólar recuou 3,35%, para R$2,334. O Banco Central fez um leilão de linhas para exportação, de US$530 milhões, e vendeu cerca de US$360 milhões no mercado à vista, a R$2,329.

Ontem, graças ao socorro à GM, o Dow fechou em alta de 2,17%, o Nasdaq, de 2,67%, e o S&P, de 2,44%. O GMAC, braço financeiro da General Motors, obteve na noite de segunda-feira financiamento de US$6 bilhões do Tesouro americano, sendo US$5 bilhões diretamente para suas operações e US$1 bilhão para a montadora aumentar sua participação no banco. O valor se soma aos US$9,4 bilhões concedidos pela Casa Branca para a GM em 19 de dezembro, totalizando US$15,4 bilhões. Os recursos virão do pacote de US$700 bilhões. O Tesouro receberá, em troca, ações preferenciais da empresa, que pagam 8% em dividendos, além de garantias de compra de ações adicionais.

COLABOROU Letícia Lins, com agências internacionais

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