Título: Fracassa negociação sobre Código Florestal
Autor: Franco, Bernardo Mello
Fonte: O Globo, 10/01/2009, O País, p. 5

Ambientalistas acusam Stephanes de querer "assinar sentença de morte da Amazônia" e abandonam grupo de discussão

Bernardo Mello Franco

BRASÍLIA. Acabaram mal as negociações entre os ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente para elaborar uma proposta comum de mudança do Código Florestal, com a participação de parlamentares da bancada ruralista e representantes de ONGs ambientalistas. Parado há mais de um mês, o grupo de trabalho que discutia o assunto está extinto, segundo a assessoria do ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes. Ruralistas planejam uma ofensiva no Congresso para tentar flexibilizar a lei ainda no primeiro semestre.

O principal motivo de discórdia é a pressão do agronegócio, apoiado por Stephanes, para encolher a reserva legal na Amazônia, regra que impede a derrubada de árvores em 80% das propriedades. Os ambientalistas, que não admitem a mudança, abandonaram o debate com um manifesto em que acusaram o ministro de querer assinar a sentença de morte da floresta.

O grupo de trabalho continuou a existir no papel, mas Stephanes concluiu, nas últimas semanas, que não faria sentido mantê-lo apenas com os ruralistas e o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc.

Na primeira das três reuniões, em novembro, Stephanes irritou os ambientalistas ao apresentar uma proposta que reduzia a reserva legal na Amazônia para 50%. Na segunda, as ONGs propuseram pena de um a três anos de prisão para quem desmatar em reserva legal. Minc disse não ter lido o documento inteiro e pediu tempo para formular uma contraproposta, mas os ambientalistas divulgaram a carta contra Stephanes e o deixaram sozinho no terceiro encontro.

A proposta da Agricultura diz que as restrições ao plantio em encostas, várzeas e topos de morro em outras regiões do país significam "destruir o sistema produtivo" e dizimar "milhões de empregos e renda".

Ruralistas tentarão aprovar mudanças no Congresso

O documento também sugere mudanças polêmicas que já foram admitidas por Minc, como a permissão para recuperar áreas desmatadas ilegalmente com o plantio de espécies exóticas.

Presente às duas primeiras reuniões, o advogado André Lima, do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), criticou a adesão de Stephanes à causa ruralista.

- Participo desses debates há 15 anos e nunca tinha visto uma proposta tão ruim como a do ministro Stephanes - disse Lima, que integrou o Ministério do Meio Ambiente na gestão da senadora Marina Silva (PT-AC).

Informado do fim dos debates, o coordenador da frente ruralista, deputado Valdir Colatto (PMDB-SC), se disse surpreso e afirmou que a mudança do Código Florestal será tocada pelo Congresso, com ou sem aval dos ambientalistas:

- Precisamos definir a questão ainda este semestre. Não dá para continuar com a legislação que está aí, que inviabiliza estados inteiros para a produção.

A assessoria de Stephanes informou que ele não falará mais no assunto. Procurado, Minc não respondeu.

Em agosto passado, após reuniões para discutir o novo zoneamento da cana-de-açúcar, Minc e Stephanes divergiram em público sobre a liberação do plantio no Planalto Pantaneiro; o projeto foi congelado pelo Palácio do Planalto. Em outubro, num debate com Minc no Senado, Stephanes disse que "não há nenhuma possibilidade de se manter sem alteração o Código Florestal" e que, se todas as leis do setor forem respeitadas, "é melhor fechar o Brasil".