Título: Uma imobiliária abarrotada
Autor: Luiz, Edson
Fonte: Correio Braziliense, 23/03/2009, Política, p. 02

Com 450 mil imóveis cedidos e 1,5 mil apartamentos à disposição de servidores, Executivo federal deve aumentar patrimônio com extinção de órgãos públicos

A União é uma grande imobiliária. E, além de colocar 1,5 mil apartamentos e casas à disposição de funcionários públicos, ainda cede, em todo o país, outros 450 mil imóveis a terceiros, seja por aluguel e permutas ou para famílias de baixa renda. O número é bem superior ao que é ocupado por repartições públicas, hoje distribuídas em 26 mil prédios, sendo a maioria no Distrito Federal. A tendência é de que esse patrimônio cresça depois da incorporação dos bens das empresas públicas extintas nos últimos anos.

O Executivo tem hoje o maior número de apartamentos e casas cedidas a servidores públicos. Só em Brasília, são 1.535 imóveis, dos quais 1.088 ocupados por servidores civis e outros 282 por militares. Na contabilidade imobiliária, estão incluídas 50 casas. Dessas, seis foram destinadas a ministros. Além disso, há a reserva técnica que atende funcionários de outros poderes. Para a Câmara, por exemplo, foram emprestados 33 apartamentos funcionais que atendem a assessores de alto escalão da Casa, muitas vezes por indicação de políticos.

Outras 143 residências administradas pela Secretaria de Patrimônio da União (SPU) encontram-se vazias ¿ 120 reservadas a servidores civis e 23 a militares ¿ seja por falta de interessados, por estarem deterioradas, seja pela localização. Além disso, cada órgão possui uma cota, que muitas vezes não é preenchida. A Presidência da República e o Ministério das Relações Exteriores administram seus imóveis. Os militares têm 305 moradias sob seus cuidados e 75 estão cedidos a outros poderes.

Dívidas Apesar de ocuparem os imóveis quase de graça ¿ os funcionários só pagam uma taxa de ocupação, que varia entre R$ 79 e R$ 600, além do condomínio ¿, muitos moradores deixam os apartamentos com as contas atrasadas e em mau estado de conservação. O calote fez com que o governo gastasse R$ 1,7 milhão, no ano passado, para cobrir as despesas com reparos. Ainda assim, houve saldo positivo: as receitas com as taxas de ocupação foram de R$ 3,9 milhões, no período. ¿Estamos fazendo um levantamento e entrando na Justiça para cobrá-los¿, afirma Ana Ninout, da Gerência Regional da SPU em Brasília, responsável pela administração dos imóveis.

Se o volume de recursos gerado é pequeno, em se tratando de residências funcionais, os números são bem maiores com os aluguéis de outros imóveis. ¿São R$ 420 milhões por ano¿, conta o secretário-adjunto de Patrimônio da União, Jorge Arzabe. ¿A receita tem aumentado a cada ano. Em 2003, só arrecadamos R$ 190 milhões¿, acrescenta, explicando que o crescimento se deve, entre outras coisas, à fiscalização e à modernização no sistema de catálogos dos imóveis.

Incorporação Nos próximos meses, a grande imobiliária em que se transformou a União vai reforçar seu patrimônio com a incorporação de mais 60 mil imóveis de empresas públicas extintas nos últimos anos. Só da Rede Ferroviária Federal (RFFSA) serão 57 mil em todo o país. Entre as propriedades, há estádios de futebol em várias regiões onde existiam estradas de ferro. Um deles pertence ao Paraná Clube, time da primeira divisão do campeonato estadual. Outros 3,4 mil serão repassados pelo extinto Departamento Nacional de Estradas e Rodagens (DNER) e 500, pela Legião Brasileira de Assistência (LBA).

Em muitos casos, os bens são oferecidos a seus próprios ocupantes, como os da RFFSA, que ficaram com os ferroviários. Em outros casos, a venda demora por causa da burocracia cartorial e de dívidas com impostos urbanos. A própria RFFSA tem hoje 46% de seus imóveis sem matrícula, dificultando a regularização e, consequentemente, a comercialização.

Outro problema que a União vem enfrentando é identificar seu patrimônio, parte do qual permanece desconhecido, como é comum aos imóveis da RFFSA. ¿Vamos fazer uma ação de grande porte para atualizar os levantamentos¿, afirma Arzabe. Na época em que foi criada, os prédios eram localizados por linhas e não nome de ruas, o que dificulta sua localização.

-------------------------------------------------------------------------------- Governo procura dados

O governo vai fazer um levantamento para saber quantos prédios públicos existem atualmente em Brasília, onde está a maioria dos imóveis funcionais da União. O mesmo trabalho será feito posteriormente em outras regiões do país, já que o número exato dos bens é desconhecido. A administração pública possuía um patrimônio constituído no Império, quando D. Pedro II criou a Repartição das Terras Públicas, há 155 anos. As estimativas são de que o governo tem em torno de 700 mil imóveis, sendo que 450 mil estão alugados para terceiros.

Em Brasília, há mais de 1,5 mil imóveis destinados a servidores que não possuem residência própria no Distrito Federal, além de outros 8 mil prédios públicos cadastrados oficialmente. A Secretaria de Patrimônio da União (SPU) acredita que o número seja bem superior. ¿Hoje, a contagem é feita levando-se em conta os complexos, mas não o número de edifícios que existem dentro deles¿, afirma Jorge Arbaje, secretário-adjunto da SPU. Segundo ele, na Esplanada não são contados os prédios dos ministérios, mas apenas o espaço público onde os órgãos estão situados. ¿No Setor Militar, por exemplo, não há levantamentos sobre moradias e demais prédios. Apenas conta-se o espaço¿, explica.

O problema do governo é saber que tipos de imóveis possui e onde estão. No cadastro, há estádios de futebol, ferrovias e até ilhas que, teoricamente, são áreas da União, mas não estão todas catalogadas. Até mesmo a legislação é confusa quanto a isso. Todas as ilhas oceânicas são do poder público, enquanto que as costeiras nem sempre. Se não abrigam municípios, pertencem ao Estado. Mas se for sede de alguma cidade, apenas parte cabe à União. As ilhas que circundam Angra dos Reis, na região sul fluminense, por exemplo, apesar de estarem em mãos de particulares, são do governo federal. (EL)

-------------------------------------------------------------------------------- Recursos

R$ 1,7 milhão é o custo anual dos 1.535 imóveis residenciais da União

R$ 420 milhões é o valor da arrecadação da União com o aluguel de imóveis

57 mil é o número de imóveis da Rede Ferroviária Federal (RFFSA) que deverão ser repassados à União. Entre eles, há estádios de futebol em várias regiões do Brasil