Título: Votorantim leva Aracruz
Autor: D'Ercole, Ronaldo; Rangel, Juliana
Fonte: O Globo, 21/01/2009, Economia, p. 17

BNDES entra com 40% dos R$5,4 bi que criam maior fabricante mundial de celulose de eucalipto.

Ogrupo Votorantim anunciou ontem a compra, por R$5,4 bilhões, do controle da Aracruz, que será incorporada pela Votorantim Papel e Celulose (VCP) para formar a maior fabricante mundial de celulose de fibra curta (obtida a partir do eucalipto). A transação só foi fechada graças a uma pesada participação do BNDES, que fará um aporte de R$2,4 bilhões na VCP, que corresponde a mais de 40% do valor do negócio. Com isso, o banco estatal de fomento, que detinha 12,5% do capital votante da Aracruz e uma participação simbólica na VCP, passará a integrar o bloco controlador da nova companhia, com 26% do seu capital total, em sociedade com o Votorantim, que ficará com 29,1% da ações.

Também foi determinante o acordo fechado no início da semana pela Aracruz com um grupo de bancos, para a rolagem de uma dívida de US$2,13 bilhões, decorrentes de transações com derivativos cambiais (contratos negociados no mercado futuro em que a empresa apostava na queda do dólar). A descoberta destas perdas, logo depois do agravamento da crise internacional, em setembro, fez fracassar o projeto inicial de fusão das duas empresas.

Para incorporar a Aracruz, a Votorantim, que já detinha participação de 28% no bloco controlador da Aracruz, pagará a cada um dos sócios majoritários - Arapar e Arainvest - R$2,7 bilhões pelos 28% que detêm.

Em comunicado ao mercado, o diretor-geral da Votorantim Industrial (VID, controlador da VCP), Raul Calfat, informou já ter acertado a compra da parte da Arapar (holding das famílias Lorentzen, Moreira Salles e Almeida Braga). Mas, disse ele, os controladores da Arainvest (os irmãos Joseph e Moise Safra) ainda não anunciaram sua decisão.

- Estamos assumindo a premissa de que os acionistas da Arainvest irão optar pela venda de suas participações. Mas não há (da parte deles) nenhuma manifestação sobre a venda - disse Calfat.

Pagamento será feito em 6 parcelas

Embora pelo acordo de acionistas da Aracruz os irmãos Safra tenham 90 dias para se manifestar, uma fonte próxima às negociações disse que eles devem anunciar que concordam com a venda ainda esta semana.

Em setembro do ano passado, o grupo controlado pela família Ermírio de Moraes havia fechado acordo com a Arapar para comprar sua participação pelos mesmos R$2,7 bilhões. A Arainvest (dos irmãos Safra) não quis vender sua parte e acertou que dividiria o controle da empresa resultante da fusão com a Votorantim. O negócio foi desfeito quando vieram à tona as perdas da Aracruz com derivativos. Além do baque como acionista da Aracruz, a Votorantim reconheceu prejuízos de R$2,2 bilhões com operações semelhantes. Apesar disso, Calfat afirmou que o grupo não tem problemas de ordem financeira.

- A Votorantim não tem qualquer tipo de dificuldade - afirmou o executivo, informando que a VID tem R$8 bilhões em caixa.

O executivo assegurou também que nenhum centavo dos R$4,2 bilhões recebidos pelo grupo pela venda de 49% do capital do banco Votorantim ao Banco do Brasil, há duas semanas, será usado no negócio industrial.

O pagamento pelas participações da Arapar e da Arainvest na Aracruz será feito em seis parcelas ao longo dos próximos 30 meses. Isso, segundo Calfat, descontando a variação da taxa básica de juros no período, significa que os sócios receberão efetivamente R$2,35 bilhões cada. Se considerada a desvalorização do real frente ao dólar, os R$2,7 bilhões oferecidos pela VCP em setembro do ano passado tiveram redução de 40%, de US$1,6 bilhão (com o dólar a R$1,60) para US$1 bilhão pelo câmbio atual.

Calfat fez questão de afirmar ainda que a nova empresa deverá gerar dois mil empregos (diretos e indiretos) para a fábrica que irá construir este ano em Três Lagoas (MS). Mas admitiu que deverá haver cortes nas áreas administrativas e de vendas, já que as duas empresas concentram seus escritórios em São Paulo. Os ganhos com sinergia, segundo ele, chegam a R$4,5 bilhões ao longo de dez anos.

Para se tornar o maior fabricante de celulose de fibra curta do mundo (usada, por exemplo na fabricação de papéis para impressão e escrita), com 12% de participação no mercado global da commodity, a VCP fará um aumento de capital, no valor de R$4,2 bilhões, operação que espera concluir em março. A expectativa do grupo é de que em seis meses, no máximo, consiga encerrar o processo de incorporação, com as trocas de ações da Aracruz por papéis seus. Depois dessa reestruturação societária, o BNDES passa a integrar o bloco de controle da nova empresa, com poder de veto.

Parte dos R$2,4 bilhões que serão desembolsados pelo BNDES (R$1,8 bilhão) será pago à VCP em troca de ações preferenciais, enquanto R$580 milhões servirão para adquirir debêntures da Votorantim Industrial, conversíveis em ações da VCP. A contribuição do banco na operação, porém, pode chegar a R$3,2 bilhões, considerando a hipótese de os minoritários da Aracruz subscreverem integralmente suas ações à Votorantim. Assim, a troca de papéis da Aracruz pela Votorantim significaria um aumento de capital de R$800 milhões.

- Uma das missões do BNDES é apoiar a formação de empresas brasileiras eficientes e com forte competitividade para atuar no mercado global, traduzindo a excelente vantagem comparativa que o Brasil possui em diversos setores, como o de papel e celulose - disse o presidente do BNDES, Luciano Coutinho.

Ações da Aracruz disparam 108%

A operação foi o grande destaque ontem na Bovespa. As ações ordinárias (ON, com direito a voto) da Aracruz dispararam 108,04%, para R$11,65. A avaliação do mercado foi de que o valor do negócio foi alto.

- O preço é absurdo. Acabou sendo o mesmo valor que estava sendo negociado antes das perdas da Aracruz com derivativos o que é muito caro - observou o gerente de análises do Modal Asset, Eduardo Roche.

- A VCP poderia ter negociado a questão das perdas para reduzir o valor - disse Peter Ping Ho, analista da Planner Corretora da Valores.

O valor de mercado da empresa despencou de R$8,759 bilhões, em 25 de setembro de 2008, quando anunciou perdas cambiais, para R$4,11 bilhões anteontem. Para a sócia da Global Equity Patrícia Branco, o negócio era a única saída para a Aracruz.

- O momento não está favorável a empresas de commodities - disse, lembrando que, com a crise global, o valor da tonelada de celulose na Ásia caiu de US$810 em junho de 2008 para US$470 em dezembro.

Os papéis preferenciais (PN, sem direito a voto) da Aracruz caíram 11,32%, para R$2,35. Na relação de troca estabelecida no acordo, cada ação PN da Aracruz valerá 0,1347 ação PN da VCP. Como o papel da Aracruz estava acima disso, a cotação ontem sofreu um ajuste. As ações da VCP fecharam em queda de 3,65%.