Título: Líderes se unem contra intolerância religiosa
Autor: Menezes, Maiá
Fonte: O Globo, 22/01/2009, O País, p. 10

Representantes de religiões e do poder público lançam cartilha com orientações sobre como combater esse crime.

Unidos em torno do lançamento de uma cartilha para orientar o cumprimento da lei que pune a intolerância religiosa, ecumênicos fizeram ontem um minuto de silêncio em homenagem às vítimas da queda do teto da sede da Igreja Renascer, em São Paulo. O Guia de Luta Contra a Intolerância Religiosa e o Racismo levou religiosos e vítimas do preconceito a fazer um apelo coletivo pelo respeito à fé de cada cidadão. O guia, que será distribuído por enquanto a policiais e casas religiosas no Rio, orienta a aplicação do artigo 20 da Lei Caó, que prevê penas de até cinco anos para crimes de racismo e intolerância religiosa. O guia contém endereços de auxílio para vítimas do crime.

O padre Fábio Luiz, da comissão de ecumenismo e liberdade religiosa da Arquidiocese do Rio de Janeiro, afirmou que o guia "será uma verdadeira arma para construir a paz e a união".

- A Igreja Católica deseja de fato que caia todo tipo de intolerância religiosa - disse.

- Quando você fica omisso, pode ser atingido. Quem se cala será atingido mais cedo ou mais tarde - concordou Sérgio Niskier, presidente da Federação Israelita do Rio de Janeiro.

- Precisamos nos conscientizar de que não existe religião ou raça melhor do que a outra. Estamos lutando por essa evolução - disse mãe Fátima Damas, da umbanda.

Religiões de origem africana são as que mais sofrem

Autor da cartilha, o coronel Jorge da Silva, professor da Uerj e ex-secretário estadual de Direitos Humanos, afirmou que o guia ajudará policiais e cidadãos comuns a se afastarem de um risco usual: o de minimizar os casos concretos de discriminação. Já o policial civil Henrique Pessoa, representando a chefia da Polícia Civil, afirmou que o projeto do estado é resgatar um "déficit histórico" dos policiais com as religiões de matriz africana - principal alvo de intolerância. Há, no Rio, 15 casos de intolerância sendo assistidos pela ONG Projeto Legal, 70% deles referentes a crimes contra religiões de origem africana.

Presidente da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa, Ivanir dos Santos disse que é hora de mudar a cultura em relação à tolerância religiosa "antes que as futuras gerações paguem o preço". O ministro interino da Igualdade Racial, Eloy Ferreira, propôs a criação de delegacias especializadas para cuidar dos crimes de intolerância:

- O encarceramento apenas não resolve. É preciso mudar os valores - disse o ministro.

O reverendo Marcos Amaral, da Igreja Presbiteriana de Jacarepaguá, que mediou encontro entre vítimas da intolerância no Rio, ressaltou que é equivocado generalizar, quando se fala em preconceito religioso:

- Quando falamos em evangélicos que agem com intolerância, estamos falando de maus evangélicos. Se fosse possível, gostaria de pedir desculpas, mas infelizmente não posso pedir, pois não me delegaram poder para tal - disse Amaral.

No palco, vítimas da intolerância relataram momentos de angústia. Uma delas foi Cosme Luiz Castro da Silva que, no último dia 12, foi agredido verbalmente por um pastor, enquanto fazia um trabalho para sua religião. Disse que ouviu "várias barbaridades", porque estava exercendo sua crença.

- Ele disse que eu era filho do demônio. Eu perguntei se ele sabe que no país há leis que permitem o livre arbítrio - afirmou Cosme, que entrou com ação na 35ª DP contra o pastor, pelo crime de intolerância religiosa.