Título: Queda dos juros não retiram PIB do atoleiro
Autor: Nunes, Vicente
Fonte: Correio Braziliense, 20/03/2009, Economia, p. 16

BC diz que crise abalou o crédito e que esfriamento da economia pode ser mais persistente que o esperado. Taxa Selic deve seguir em declínio

A redução da taxa básica de juros (Selic) não será suficiente para tirar a economia brasileira do buraco neste ano. Segundo o economista-chefe do Unibanco, Marcelo Salomon, o impacto da crise internacional no país foi tão forte ¿ travando os investimentos, derrubando o consumo das famílias e fazendo tombar a produção ¿, que o afrouxo da política monetária só terá efeito em 2010. Por isso, ele aposta que o Banco Central manterá o pé no acelerador e cortará a Selic em 1,5 ponto percentual na reunião de abril do Comitê de Política Monetária (Copom) e mais um ponto em junho. Com isso, a taxa que serve de parâmetro para toda a economia cairá dos atuais 11,25% para 8,75% ao ano, sem nenhum suspiro da inflação. ¿Independentemente dessa baixa, estamos prevendo retração de 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2009¿, disse.

A previsão de Salomon se consolidou depois da divulgação, ontem, da ata do Copom referente à reunião da semana passada, quando a Selic caiu 1,5 ponto. O BC admitiu que o impacto da crise destruiu um dos pilares do crescimento, a oferta de crédito, que bateu pesado nos investimentos produtivos e no consumo. O pior, segundo o BC, é que há riscos de os efeitos serem mais persistentes do que o imaginado, o que torna a situação atual mais preocupante, pois as consecutivas diminuições dos juros só darão resultados a partir do terceiro trimestre do ano, na melhor das hipóteses.

Os diretores do BC assinalaram que ¿a contribuição do crédito para a sustentação da demanda doméstica arrefeceu de forma intensa¿ e a confiança dos consumidores e dos empresários evaporou. ¿Nessas circunstâncias, o dinamismo da atividade passa a depender crescentemente da expansão da massa salarial real e dos efeitos das transferências governamentais (Bolsa Família, sobretudo)¿. O problema, destacou o economista do Unibanco, é que a renda será afetada pelo aumento do desemprego, principalmente na indústria, na qual a destruição de vagas é crescente. Teremos, portanto, um mercado doméstico contraído em meio à demanda externa no chão, devido à recessão mundial. Repasse contido Na opinião do economista-chefe da SLW Asset Management, Carlos Thadeu Filho, o quadro econômico é tão dramático que o BC mudou totalmente o seu discurso. Assumiu, na ata do Copom, que a prioridade, agora, é preservar o que resta da demanda doméstica e não o controle da inflação. E, pela primeira vez, o banco admitiu, claramente, espaço para a ¿flexibilização¿ da política monetária. As projeções indicam, pelas contas do BC, que tanto a inflação deste ano quanto a de 2010 estão abaixo do centro da meta definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), de 4,5%. ¿O BC também assumiu que já não vê mais ameaça de repasse da alta do dólar para os preços, pois a valorização da moeda (mais de 40% desde agosto do ano passado) está sendo mais do que compensada pela Queda das cotações das commodities (mercadorias com cotação internacional)¿, assinalou Thadeu. ¿E mais: mesmo os preços dos serviços, que vêm se mantendo resistentes, sucumbirão ao tombo da atividade econômica e à fragilidade do mercado de trabalho¿, acrescentou. Foi essa visão, por sinal, que levou o economista-chefe do Banco Santander, Alexandre Schwartsman, a mudar a sua estimativa para a Selic neste ano, de 11,25% para 9%, com Queda de 1,5 ponto já no mês que vem.

Para Flávio Serrano, economista-sênior, do Banco BES Investimento, o melhor é ter cautela. Ele acredita que, ainda que de forma muito incipiente, a atividade está recuperando o fôlego e o BC terá que ser mais comedido nos cortes dos juros para não estimular a volta da inflação. ¿Estimamos uma redução de um ponto percentual da Selic em abril. A partir daí, o Copom só continuará o processo de baixa da taxa se realmente estiver seguro da necessidade de dar mais estímulos à economia¿, ressaltou. ¿No nosso cenário, o PIB terá crescimento de até 1% nos primeiros três meses do ano em relação ao último trimestre de 2008, pondo fim à possibilidade de recessão técnica no país (dois trimestres consecutivos de contração do PIB)¿, afirmou.