Título: Governo de bolso vazio
Autor: Simão, Edna
Fonte: Correio Braziliense, 20/03/2009, Economia, p. 17

Arrecadação de tributos federais caiu 27% no mês passado e ficou R$ 16 bi menor por causa da crise

A crise econômica mundial provocou o quarto tombo consecutivo na arrecadação de impostos e tributos, exigindo do Governo Federal um ajuste de R$ 21 bilhões nas contas públicas. de janeiro para fevereiro, o recolhimento de impostos despencou, em termos reais, 26,99%. Com isso, a arrecadação totalizou R$ 45,106 bilhões, ou seja, R$ 16,336 bilhões a menos do que o apurado no primeiro mês de 2009 (R$ 61,442 bilhões). No bimestre, o recuo foi de 9,11%, passando de R$ 110,740 bilhões em 2008 para R$ 106,548 bilhões neste ano. Retirando as receitas previdenciárias, a diminuição real foi de 12,40%, o pior número desde 1996 ¿ quando a variação foi negativa em 12,96%.

Para não disseminar o pânico, o coordenador de Estudos, Previsão e Análise da Receita Federal do Brasil, Marcelo Lettieri Siqueira, disse que esse desempenho não deve ser considerado como uma tendência para o ano. Tentou vender o discurso de que apenas 20% da diminuição do recolhimento de imposto está atrelado à crise. No entanto, os 80% restantes refletem a queda da produção industrial, que chegou a 17,23% no primeiro bimestre do ano e medidas como redução de tributos feita pelo Governo para evitar uma deterioração maior do quadro por conta da turbulência internacional. Somente neste ano, a desoneração total de tributos deve totalizar R$ 138 bilhões ¿ sendo R$ 18 bilhões vinculados à crise. ¿Mas há um limite para as desonerações¿, destacou.

Cenário nebuloso

Para o coordenador da Receita, um cenário mais claro deve ser visualizado em março, mês em que já está sendo verificada a recuperação de alguns indicadores econômicos. Mas, Lettieri Siqueira admite que ainda tem dúvidas sobre se haverá contaminação da crise nos números do varejo e do atacado. ¿O impacto da crise ainda está concentrado na indústria e se propagando para a cadeia atacadista e varejista. Nesses segmentos, as taxas ainda são positivas, mas bem menor¿, afirmou Lettieri Siqueira.

Para o economista da consultoria Tendências, Felipe Salto, a situação da arrecadação no país continua bastante nebulosa. Ele espera um recuo real do recolhimento de imposto de 7,2%. Esse cenário considera um crescimento econômico de apenas 0,3% e um superávit primário de 2,8% do Produto Interno Bruto (PIB). O quadro desenhado pelo economista é bem pessimista quando comparado às previsões divulgadas ontem pelo ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, que espera um PIB de 2% e um superávit de 3,3% do PIB ¿ descontado o Projeto Piloto de Investimento (PPI).

Assim como outros analistas, Salto não acredita na confirmação das previsões do Governo e, portanto, novos cortes no orçamento estão sendo aguardados, além da queda na meta de superávit primário. ¿O arrefecimento forte da atividade econômica é implacável¿, afirmou o economista da Tendências, lembrando que todos os tributos ligados ao desempenho da indústria tiveram forte recuo no primeiro bimestre do ano.

Exemplos disso é o abrupto recuo, na comparação entre fevereiro de 2008 e 2009, da arrecadação da Cofins/PIS Pasep (-17,31%), IRPJ/CSLL (-14,23%), IPI-Outros (-26,11%) e IRPF (-18,56%). Dos 10 setores que representam 96,19% da arrecadação, todos apresentaram diminuição no recolhimento do tributo e oito deles estão ligados à indústria no bimestre em relação ao mesmo período de 2008. A arrecadação com a fabricação de veículos, por exemplo, caiu 40,69%. Já a metalurgia foi responsável pela baixa de 51,9%.