Título: Salário de R$16,5 mil por um dia de serviço
Autor: Vasconcelos, Adriana
Fonte: O Globo, 04/02/2009, O País, p. 3

Deputados licenciados que reassumiram mandato para votar na eleição têm pagamento extra

BRASÍLIA. Seis deputados que se licenciaram para exercer funções de secretário de estado e reassumiram o mandato para votar na escolha do presidente da Casa vão receber um salário extra de R$16.512,09 pela passagem relâmpago por Brasília. Isso graças a um ato conjunto das Mesas da Câmara e do Senado, de agosto de 2003, que prevê o pagamento de um salário extra aos parlamentares no início e outro no final de cada sessão legislativa. Os deputados alegaram que não sabiam dessa vantagem, e alguns tentaram devolver, mas isso não é possível. A opção de alguns, segundo declararam, é doar o dinheiro.

Passada a eleição, retornaram aos cargos Cassio Taniguchi (DEM), secretário de Desenvolvimento Urbano do Distrito Federal; Alberto Fraga (DEM), secretário de Transportes da capital federal; Jorge Bittar (PT), secretário municipal de Habitação do Rio; e Osmar Terra (PMDB), secretário estadual de Saúde do Rio Grande do Sul. Os deputados Bispo Rodovalho (DEM), secretário de Trabalho do Distrito Federal, e Walter Feldman (PSDB), secretário de Esportes de São Paulo, ficam uns dias a mais na Câmara.

Feldman só deixa o mandato hoje, após a escolha do líder da bancada. Rodovalho vai embora dia 12, depois da escolha do presidente da Comissão de Seguridade Social, que a bancada evangélica e a frente da família estão pleiteando.

Segundo a diretoria geral , esses salários extras seriam uma indenização e ajuda de custo para cobrir despesas de locomoção para que o parlamentar chegue para exercer o mandato em igualdade de condições. O que não seria o caso dos três deputados-secretários do DF, que moram na capital, mas também recebem.

Deputados dizem que vão doar o dinheiro extra

A despesa para os cofres públicos é ainda maior, porque, quando os suplentes reassumirem, eles também receberão o salário pago como indenização extra. Por decisão das Mesas, os parlamentares recebem 15 salários por ano, além da verba de gabinete e outras vantagens como passagens aéreas e ajuda de custo para moradia.

Os deputados procurados disseram desconhecer a regra e negaram ter reassumido por alguns dias para receber o salário extra. Todos alegaram que, como não podem devolver ou deixar de receber, vão doar para instituições de caridade ou escolas públicas. Jorge Bittar afirmou que a ajuda de custo é inaceitável e tem de ser revogada. Ele disse que só se justificaria se o deputado fosse permanecer mais tempo em Brasília, no mandato:

- Fui apanhado de surpresa como todo mundo. Nem imaginava que existia isso e não faz o menor sentido. Liguei na diretoria geral para me certificar e confirmaram o pagamento. Só faria sentido se for assegurada uma permanência do deputado no mandato. Eu fui aí em Brasília só para votar, meu Deus! Então eu vou doar para o Museu do Pontal, que é um museu de arte popular maravilhoso.

O ato foi assinado em 2003 pelos então presidentes Ramez Tebet (Senado) e Efraim Morais (interino na Câmara). Em 2007, Arlindo Chinaglia (PT-SP), que passou o cargo anteontem a Michel Temer, e o ex-presidente do Senado Renan Calheiros (PMDB-AL) assinaram um projeto de decreto legislativo regulamentando o ato e aumentando os vencimentos dos parlamentares para R$16.512,09.

- Para mim foi uma surpresa. Mas não tenho como não receber. Então vou receber e doar para uma escola pública carente do Distrito Federal. Já comuniquei isso ao governador Arruda - declarou o Bispo Rodovalho.

Em nota, Osmar Terra disse que não tinha conhecimento da ajuda de custo e que, ao saber, avisou à Mesa que queria abrir mão do dinheiro. "Caso não haja possibilidade de devolução, o deputado Osmar Terra fará a doação desta quantia de R$16.512,09 para uma entidade beneficente do Rio de Grande do Sul", disse em nota.

Quando um deputado ou senador assume uma secretaria ou ministério pode optar pelo salário de parlamentar, o que acontece na maioria dos casos. Assim, a Câmara acaba desembolsando dois salários, do secretário e do suplente. Levantamento do site Contas Abertas mostra que o gasto com suplentes em 2008 - 48 assumiram o mandato - foi de R$792 mil de ajuda de custo. Só recebe a indenização do final da legislatura o parlamentar que comparece a pelo menos dois terços da sessão legislativa.