Título: EUA perdem 598 mil vagas
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Fonte: O Globo, 07/02/2009, Economia, p. 21

Corte é o maior desde 1974. Obama ataca demora em aprovar plano, mas Senado adia votação.

Em um sinal de que a recessão americana está longe de acabar, o número de postos de trabalho que foram eliminados nos EUA em janeiro alcançou 598 mil, o maior corte mensal desde 1974, ou seja, em 34 anos. O fechamento de vagas, que superou a previsão do mercado, elevou a taxa de desemprego para 7,6% no mês, ante os 7,2% registrados em dezembro. O patamar é o maior desde 1992. Diante dos números, o presidente dos EUA, Barack Obama, disse que a notícia é "devastadora" e classificou a demora em aprovar o pacote de estímulo econômico de "imperdoável" e "irresponsável". Pressionados, os senadores fecharam um acordo na noite de ontem que reduziu os gastos previstos no plano para US$780 bilhões, informou o "New York Times". No entanto, decidiram adiar a votação do projeto. É possível que ela ocorra até amanhã.

Ao divulgar os dados de janeiro, o Departamento do Trabalho dos EUA apresentou uma revisão das estimativas feitas para 2008. Praticamente todos os dados mensais foram revisados, o que ampliou em cerca de 400 mil o número de vagas eliminadas em 2008. Os novos números mostram que, desde dezembro de 2007, quando os EUA entraram em recessão, 3,6 milhões de empregos sumiram do mapa. Hoje, o número de desempregados no país é de 11,6 milhões.

- É uma notícia devastadora. Tenho certeza de que os membros do Senado estão lendo esses números. Espero que eles partilhem do meu senso de urgência e cheguem à mesma indiscutível conclusão: a situação não poderia ser mais séria. Esses números demandam ação. É imperdoável e irresponsável que qualquer um de nós fiquemos presos em divagações, demoras ou questões políticas, como habitualmente, enquanto milhões de americanos perdem seus empregos - disse Obama ao comentar o relatório do governo durante cerimônia de nomeação de seu Conselho para a Recuperação Econômica, na Casa Branca, antes do possível acordo no Senado.

Na véspera, após encontro com democratas em Williamsburg, no estado de Virgínia, Obama atacara as críticas "mesquinhas" ao pacote e as "falsas teorias" formuladas sobre ele.

- Os americanos não votaram nas falsas teorias do passado, tampouco votaram para (ouvir) argumentos obscuros e políticas mesquinhas - disse o presidente, em um de seus mais duros ataques à oposição republicana.

Aprovação depende dos republicanos

Desde quinta-feira, um grupo de 20 senadores bipartidários tentava aprovar um plano econômico mais enxuto. Ontem, após um longo dia de tensas negociações, os senadores democratas concordaram em retirar itens do pacote, como corte de impostos para empresas, para ganhar apoio dos republicanos, abrindo caminho para o consenso. O maior esforço em reduzir o valor do pacote veio após os comentários de Obama e os números de desemprego.

- O mundo está esperando para ver o que vamos fazer nas próximas 24 horas. Confrontados com essa crise econômica, os republicanos devem decidir hoje (ontem) se vão se unir ao presidente e ao Congresso democrata no caminho da recuperação - disse o líder da maioria no Senado, Harry Reid, de Nevada, horas antes de o consenso ser alcançado.

Apesar do acordo, os senadores decidiram encerrar a sessão por volta de 20h de ontem (23h em Brasília), sem voltar o pacote. Os democratas têm maioria na Casa, mas não suficiente para a aprovação. São necessários 60 dos 99 votos para que o projeto seja aprovado. Um projeto inicial - de US$819 bilhões - fora aprovado na Câmara, mas havia sido inflado para mais de US$920 bilhões no Senado. Na quinta-feira, projetos alternativos que visavam a reduzir o valor do plano não passaram. Foi feita apenas uma alteração na cláusula "Compre América" - que impõe restrições ao uso de aço e produtos manufaturados estrangeiros em projetos financiados pelo pacote -, o que amenizou críticas de parceiros comerciais como Canadá. Visando à rápida aprovação, Obama buscou não entrar em polêmica quanto ao valor do pacote:

- Falando de forma geral, o pacote está do tamanho certo, com foco correto e tem as prioridades corretas para criar de três a quatro milhões de empregos e pavimentar o caminho para um crescimento de longo prazo - disse o presidente, insistindo na urgência da votação. - Eles (os americanos) não nos mandaram para Washington para colhermos ganhos políticos e ficarmos paralisados em brigas bipartidárias.

Os dados sobre desemprego divulgados ontem mostraram que a perda de vagas se deu de forma generalizada, em todos os setores da economia, com exceção da área de saúde. Só a indústria perdeu 207 mil vagas em janeiro, a maior perda mensal desde 1982. Diante desse quadro, uma tendência tradicional no mercado de trabalho pode estar mudando: o número de mulheres deve ultrapassar o de homens nas folhas de pagamento dos EUA, assumindo a liderança pela primeira vez na história do país. Mas a razão tem pouco a ver com a capacitação feminina. A proporção de mulheres trabalhando mudou pouco desde que a recessão começou. Já 82% das perdas de emprego atingiram os homens, que são maioria nos setores mais atingidos pela crise, como industrial e de construção civil. As mulheres tendem a trabalhar em áreas como educação e saúde, que são menos sensíveis aos altos e baixos da economia, e empregos que permitam ter tempo para cuidar das crianças e outros trabalhos domésticos.

Falta dinheiro para pagar seguro-desemprego

O crescente fechamento de vagas também está alterando a rotina dos governos estaduais. Cada vez mais estados estão enfrentando problemas de falta de caixa para pagar o seguro-desemprego, cujos pedidos subiram para o maior patamar desde 1982 este mês. Em sete estados, os fundos para o pagamento do benefício já esgotaram. Caso da Carolina do Sul, onde a taxa de desemprego chega a 20% em algumas cidades. Outros 11 estados estão sob ameaça de esgotar suas reservas para este fim, segundo relatório da National Conference of State Legislatures. Até agora, os governadores já tomaram emprestados US$2,3 bilhões do governo federal, para honrar seus compromissos.

A situação não é melhor no Canadá, que perdeu 129 mil postos de trabalho em janeiro, o que elevou a taxa de desemprego no país para 7,2%. Foi o maior corte mensal desde o início da série, em 1976. A expectativa dos analistas era de perda de 40 mil vagas.