Título: Diplomacia brasileira já discute com os EUA efeitos do Compre América
Autor: Oliveira, Eliane; Paulo, Gustavo
Fonte: O Globo, 07/02/2009, Economia, p. 22

Reuniões técnicas avaliam impacto da medida sobre siderurgia nacional.

BRASÍLIA. O governo brasileiro já iniciou contatos com as autoridades dos EUA para discutir os efeitos do "Compre América". O programa, aprovado na última quarta-feira pelo Senado americano, determina que projetos financiados com recursos públicos devem ter insumos produzidos no país ou em nações signatárias do acordo de compras governamentais da Organização Mundial do Comércio (OMC). A medida inclui a compra de aço e afeta o Brasil, que está fora desse tratado.

Nos últimos dias vêm ocorrendo, com discrição, reuniões técnicas entre diplomatas brasileiros e americanos, para levantamento de informações. Para municiar o governo, a embaixada do Brasil em Washington tem enviado relatórios a Brasília. O tema, dependendo do desdobramento do projeto, será obrigatório na agenda do encontro previsto para o próximo mês em Washington entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Barack Obama.

Os EUA não são os únicos na lista dos problemas do Brasil que vêm surgindo com o recrudescimento da onda protecionista no mundo. Países como Rússia, Argentina, Ucrânia, França e Equador dão seu jeitinho para subsidiar exportações e proteger as indústrias locais, contornando as regras da OMC.

Onda protecionista preocupa governo brasileiro

O secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Welber Barral, avalia que o momento atual é de um "neo-neo-protecionismo", cujo combate é mais complexo e difícil do que os aumentos tarifários tradicionais.

- Com a crise, a maioria dos países não está aumentando tanto as tarifas de importação, como em momentos anteriores. O protecionismo agora se expressa também em medidas para privilegiar o consumo interno e promover as exportações. É um protecionismo financeiro - diz Barral, também autor do livro "O Brasil e o Protecionismo".

Ele se refere a barreiras não-tarifárias, como burocracia excessiva, novas exigências fitossanitárias, redução de cotas e, especialmente, a concessão de créditos subsidiados às exportações, que cresceu no período pós-crise. A OMC só prevê regras claras em relação a barreiras tarifárias.

Para enfrentar esse fenômeno, a estratégia coordenada pelos ministérios do Desenvolvimento e das Relações Exteriores abrange, basicamente, três pontos: reforçar a postura antiprotecionista do Brasil em todos os fóruns internacionais; fortalecer os mecanismos bilaterais de consulta; e manter os mercados abertos, evitando adotar medidas que estimulem retaliações protecionistas de outros parceiros. Neste caso, as ações em estudo para incentivar exportações estão sendo debatidas com toda a cautela.

No próximo dia 13, em Brasília, haverá uma reunião bilateral com autoridades do Equador, que elevou as tarifas de importação para 35% e excluiu o Brasil e outros países de regimes de preferências tarifárias. Segundo o presidente da Associação Brasileira da Indústria Eletroeletrônica (Abinee), Humberto Barbato, os fabricantes brasileiros de celulares deixarão de vender pelo menos um milhão de unidades, o correspondente a cerca de US$50 milhões.

Com o excesso de medidas burocráticas, marcadas por licenças de importação que levam mais de 60 dias para serem liberadas, o governo argentino atingiu em cheio os fabricantes brasileiros de produtos têxteis e de linha branca e televisores. Também há uma reunião com o governo russo, marcada para o próximo dia 18, em Moscou. A Rússia reduziu as cotas de importação de frangos e suínos.