Título: Biodiesel ainda não tem fiscalização nos postos
Autor: Ordoñez, Ramona
Fonte: O Globo, 08/02/2009, Economia, p. 31

Lei faz um ano, mas faltam equipamentos para monitorar nas bombas adição de 3% ao óleo diesel de carros e caminhões.

Poucos se lembram, e muitos já esqueceram. Mas há um ano é obrigatória por lei a adição de biodiesel - feito a partir das plantas (óleos vegetais) ou de animais (gordura animal) - no óleo diesel, combustível para carros e caminhões. Inicialmente a adição obrigatória foi de 2% e, desde meados de 2008, passou a 3%. Mais grave que o desconhecimento do consumidor, no entanto, é o fato de que não existe ainda um sistema de fiscalização do governo com equipamentos apropriados para testar nas bombas dos postos se o diesel vendido tem realmente 3% de biodiesel.

O alerta sobre a falta de fiscalização foi feito pelo vice-presidente do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis (Sindicom), Alísio Vaz. Ele destaca que, com isso, as distribuidoras que fazem a mistura acabam sendo prejudicadas e perdem os consumidores, já que o preço do biodiesel é mais caro.

E no atual ambiente de crise econômica mundial alguns executivos do setor de distribuição temem que o desenvolvimento desses equipamentos de fiscalização demore ainda mais por causa dos custos elevados.

A falta de informação sobre a adição de biodiesel ainda é ampliada pelo fato de a legislação não obrigar distribuidoras ou postos a comunicarem a exigência aos consumidores. O contador Gustavo Costa, que mora em Araruama e estava abastecendo o automóvel em um posto no Rio, é um dos consumidores que não sabia da obrigação da mistura. Ele ficou preocupado ao descobrir que não existem equipamentos disponíveis no mercado capazes de medir o percentual do biodiesel no diesel.

- Eu sabia do biodiesel, mas não que já era obrigatório adicioná-lo ao diesel. É preciso ter aparelhos para fiscalizar os postos e garantir que nós, consumidores, não estamos sendo lesados - disse Costa.

Percentual de biodiesel passará a 4% este ano

O diretor de Combustíveis Renováveis do Ministério de Minas e Energia, Ricardo Dornelles, informou que este ano o governo federal vai aumentar para 4% a adição do biodiesel no diesel. Já a meta de 5% prevista para 2013 será antecipada para 2010. O aumento para 4% significará consumo da ordem de 1,6 bilhão de litros de biodiesel por ano, contra volume atual de 1,2 bilhão. Já o consumo de diesel está em torno de 44 bilhões de litros anuais.

Com o aumento do mercado, Dornelles também concorda que é preciso aprimorar os mecanismos de fiscalização. Segundo ele, é importante que o mercado desenvolva equipamentos para que os fiscais da Agência Nacional do Petróleo (ANP) possam fazer a medição nos postos.

- É importante que os fiscais da ANP tenham os equipamentos para fazerem a verificação nos postos. O programa do biodiesel deve crescer com segurança e credibilidade - destacou Dornelles.

Alísio Vaz, do Sindicom, destaca que os instrumentos capazes de medir o percentual de biodiesel no diesel são muito sofisticados. Ele estima que apenas cinco ou seis laboratórios são equipados para tal aferição, dos 23 credenciados pela ANP que participam do Programa de Monitoramento da Qualidade dos Combustíveis.

Atualmente, a ANP faz a fiscalização da mistura através dos números de venda do diesel e do biodiesel da Petrobras e da refinaria Refap. A Petrobras e a Refap compram o biodiesel nos leilões realizados pela ANP e promovem novos leilões para as distribuidoras comprarem o produto. Com base no volume de diesel comprado por cada distribuidora junto à Petrobras, é vendido o volume necessário de biodiesel para fazer a mistura de 3%.

Brecha para fraude de R$0,04 por litro de diesel

Segundo a agência, as distribuidoras que não comprovarem mensalmente a compra de biodiesel em volume necessário para a mistura têm seus pedidos de fornecimento de diesel para o mês seguinte suspensos.

A ANP informou ainda que, até o fim de março deste ano, metade dos 23 laboratórios de pesquisa credenciados da agência terá os equipamentos para a aferição. Até o fim de abril, serão mais de 90%.

Alísio Vaz concorda com Dornelles sobre a necessidade do desenvolvimento de equipamentos para medir com rapidez, nos postos, o percentual da adição. Ele lembra que, caso uma distribuidora não faça a mistura de 3% de biodiesel, tem vantagem competitiva de cerca de R$0,04 por litro de diesel vendido.

- Quem não fizer a mistura pode ganhar muito dinheiro, pois os volumes envolvidos são enormes - ressaltou Alísio, que defende mais segurança nos processos tanto de controle como de qualidade, para assegurar um mercado equilibrado.

O Sindicom defende, no entanto, que até a implementação do novo sistema de fiscalização a Petrobras continue monitorando a adição de biodiesel pelo volume de diesel comprado.

- Temos alertado a ANP que a Petrobras não pode sair da intermediação enquanto o sistema de fiscalização não estiver implantado. Senão vai ser um salve-se que puder. Um posto que vende dois milhões de litros por mês, por exemplo, pode ter um ganho de R$800 mil - alertou Alísio Vaz.

Fecombustíveis recebeu denúncias de notas frias

A Federação do Comércio Varejista de Combustíveis (Fecombustíveis), que reúne postos revendedores de todo o país, também defende a necessidade de se aprimorar a fiscalização da mistura do biodiesel.

- Esse produto (o biodiesel) merece um cuidado maior. Não existe um mecanismo confiável para se medir, só alguns equipamentos em poucos laboratórios no país. Não existe equipamento para se fazer teste na rua para o óleo diesel - disse Paulo Miranda, presidente da Fecombustíveis.

Miranda afirmou que a Fecombustíveis recebeu denúncias de fraudes de notas frias de venda de biodiesel, uma delas em São Paulo.

- A revenda também está preocupada com a situação porque o biodiesel custa o dobro do diesel. A margem da revenda é apertada e se tiver um concorrente que já entra com R$0,04 de lucro, acaba com o mercado legal - destacou.