Título: Rumo ao desmatamento zero
Autor: Minc, Carlos
Fonte: O Globo, 12/02/2009, Opinião, p. 7

O Zoneamento Econômico Ecológico (ZEE) é uma das chaves para combatermos o desmatamento, a violência, a exclusão e melhorarmos a qualidade de vida de 24 milhões de amazônidas, preservando o bioma. Empresários, ambientalistas, seringueiros clamam pela conclusão do ZEE na Amazônia. O Ministério do Meio Ambiente (MMA) organizou com o IBGE, a Embrapa e a CPRM (recursos minerais) o Consórcio ZEE Brasil para apoiar os estados na elaboração dos seus zoneamentos. Dois estados, Acre e Rondônia, já os concluíram. Outros três os enviaram às Assembléias Legislativas. No dia 6 de fevereiro o estado do Amazonas concluiu o seu ZEE que será enviado este mês ao parlamento. O Pará apresentou a lei estadual de janeiro, que aprovou o ZEE para a área de influência da BR 163 (Cuiabá-Santarém).

Essa lei não prevê qualquer aumento de desmatamento ou expansão de agropecuária em áreas preservadas. Em duas das áreas demarcadas ao longo da BR 163, com mais de 80% de desmatamento e atividades econômicas consolidadas, o ZEE possibilita a intensificação e a legalização das atividades, mediante a recomposição da Reserva Legal, de no mínimo 50% da área, mais as APPs - áreas de preservação permanentes. Isso implicará o reflorestamento de 1,5 milhão de hectares de matas nativas. A comissão técnica interministerial do ZEE a recepcionou, visto que não havia ilegalidades e os mapas e estudos foram apresentados, e o encaminhou ao Conama.

Note-se que essa comissão não tem poderes para flexibilizar nenhuma lei federal - só o Congresso Nacional dispõe desta prerrogativa. Tampouco poderia vetar uma lei estadual do Pará, mas solicitar documentação indispensável ou que o governo e o parlamento sanassem vício legal, que inexistia, pois está de acordo com o Código Florestal. Estabelecer uma regra clara, o que pode ser feito, como e onde é a base para defender a Amazônia, colocar as atividades na legalidade e intensificar as operações de combate ao crime ambiental.

O desmatamento da Amazônia (e dos outros biomas) não se enfrenta apenas com o Ibama e a Polícia Federal. Nestes oito meses houve uma redução de 40% da área desmatada, em comparação com os mesmos meses do ano anterior; isto devido à intensificação das operações, a entrada em vigor da resolução do Banco Central que veda o crédito para quem esteja na ilegalidade fundiária ou ambiental, aos leilões do boi pirata e da madeira pirata, ao controle de alguns entroncamentos rodoviários. Mas esse resultado é precário e insuficiente.

Sem a regularização fundiária, o ordenamento territorial através do ZEE, o Fundo Amazônia, o financiamento de um modelo de desenvolvimento inclusivo e não predatório, a transformação e valorização da cadeia de produtos do extrativismo, o manejo florestal e a implementação do PAS - Plano Amazônia Sustentável, a destruição da floresta continuará. Isso representaria um atentado à biodiversidade, às populações tradicionais e às comunidades indígenas; e também o não cumprimento do Plano Nacional de Mudanças Climáticas, assinado pelo presidente Lula em dezembro, e festejado na Polônia, pelo secretário-geral da ONU e por Al Gore como um significativo avanço da posição do Brasil, e exemplo para outros países.

Hoje é mais fácil e barato um agente desmatar a floresta nativa do que recuperar e intensificar a produção numa área degradada. Ele não paga a terra, não assina a carteira, não paga multas e tem sempre algum político para protegê-lo. Temos de inverter esse quadro, combatendo a impunidade, impedindo que criminosos ambientais enriqueçam com o produto de atos ilícitos (com leilões de boi e madeira piratas) e criar apoio técnico, econômico e um marco legal que incentivem a recuperação de áreas degradadas, base para o desmatamento zero. Isso só avançará com regularização fundiária de todas as terras da Amazônia, que o governo Lula pretende concluir em três anos, a finalização do ZEE e a implementação do PAS. Pela defesa da Amazônia, de sua população e do clima do planeta.

CARLOS MINC é ministro do Meio Ambiente.