Título: Força feminina contra o tráfico
Autor: Berta, Ruben
Fonte: O Globo, 16/02/2009, Rio, p. 8
Prefeitura recrutará mães para atuar como monitoras em escolas de favelas.
Legenda da foto: MORADORAS DO Complexo da Maré incluídas no projeto Mulheres da Paz, do governo federal, que oferece auxílio a jovens ligados ao tráfico de drogas na comunidade
Após uma primeira semana de aulas em que mais de seis mil estudantes tiveram o início do ano letivo prejudicado por causa de confrontos entre policiais e bandidos em Senador Camará, a secretária municipal de Educação, Claudia Costin, anuncia mais uma iniciativa para tentar melhorar o desempenho de alunos nas escolas em áreas de risco: mães de crianças e jovens de comunidades serão convidadas a atuar como auxiliares dos professores. A prefeitura dará uma ajuda de custo para transporte e alimentação.
- Queremos que as mães atuem principalmente junto às crianças em processo de alfabetização nessas comunidades. A presença da família na escola tem um efeito importante, ajuda na disciplina e no respeito. Dificilmente a criminalidade da região agride o ambiente escolar, mas se a figura da mãe está presente, isso acontece menos ainda - afirmou Claudia Costin.
A preocupação da secretária com os colégios em áreas de risco - existem 200 unidades na cidade do Rio, onde estudam cerca de cem mil alunos - não é à toa. Uma pesquisa inédita realizada pelo Observatório de Metrópoles da UFRJ, com o apoio da Faperj, mostra que as escolas situadas em favelas puxam para baixo o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) no Rio de Janeiro. Enquanto no asfalto 35% das unidades apresentaram rendimento considerado baixo pelos pesquisadores (média menor que 4,3), nas comunidades, a porcentagem quase dobra: 64%.
- O objetivo dos estudos é relacionar a questão territorial com a educação. As favelas são locais onde a precariedade urbana e habitacional e a tensão social têm de ser levadas em conta nos projetos de políticas públicas de ensino - diz o pesquisador Luiz Cesar Queiroz Ribeiro, coordenador do Observatório de Metrópoles.
O estudo considerou escolas situadas num raio de até cem metros das favelas. O Ideb abordado foi aquele referente apenas ao período do 1º ao 5ºano do ensino fundamental. O índice, divulgado pelo Ministério da Educação, leva em conta provas de português e matemática e fluxo escolar.
Profissionais ganharão bônus
Além da participação de mães nas salas de aula, a Secretaria de Educação já tem uma série de outras ações preparadas para as escolas nas áreas de risco. Uma comissão foi formada com organizações não-governamentais como o AfroReggae e o Observatório de Favelas para a elaboração de projetos. Além de bônus expressivos para profissionais que atinjam metas e a implantação de um projeto de ciências já aplicado em muitas escolas particulares do Rio, deve haver reformulação nas creches, que terão um sistema de autogestão, com pessoas recrutadas na própria comunidade.
- Quando olhamos para a educação, não podemos ter um olhar tecnocrático. Tenho de tratar desigualmente o que é diferente. Ter um olhar mais cuidadoso com os que em condições normais não vão conseguir aprender - diz a secretária Claudia Costin.
Na análise do Ideb de 2007, feita pelo Observatório de Metrópoles da UFRJ, 32% das escolas do asfalto tiveram nível considerado médio (4,3 até 4,8). Na favela, a porcentagem nessa faixa foi de 23%. Com a média mais alta (acima de 4,8) ficaram 34% dos colégios fora das comunidades. Dentro, a porcentagem foi de apenas 13%. A média geral do Rio de Janeiro foi de 4,5 no período.
A presença de colégio em área de risco nem sempre é sinônimo de baixo desempenho. No Complexo da Maré, a Escola Municipal Quarto Centenário, com 400 alunos do 1º ao 5º ano do ensino fundamental, atingiu o Ideb de 5,2 em 2007. O índice já supera a meta estipulada pelo Ministério da Educação para 2009, que é de 5. Um dos trunfos da escola é o Conselho Escola Comunidade, em que representantes de alunos, professores e da comunidade opinam até sobre onde a verba do colégio deve ser aplicada. A presença de mães, que será incentivada pela Secretaria de Educação, já é constante.