Título: Invasões de sem-terra em SP são políticas
Autor: Gomes, Wagner
Fonte: O Globo, 25/02/2009, O País, p. 3

Secretário do estado diz que Rainha, que comandou invasões, deveria protestar em Brasília

Osecretário de Justiça de São Paulo, Luiz Antônio Marrey, classificou de políticas as invasões de fazendas por sem-terra no Pontal do Paranapanema na segunda-feira, e afirmou que o governo paulista não revogará, em hipótese alguma, as duas portarias que excluem a participação de movimentos sociais nas comissões de seleção de assentados no estado. A revogação dessas portarias é uma das reivindicações feitas por José Rainha Júnior, que liderou as invasões no Pontal.

Marrey assegurou ainda que o estado vai agir com rigor nas reintegrações de posse determinadas pela Justiça, utilizando inclusive a força policial, se necessário. O secretário disse que a responsabilidade pela reforma agrária é do governo federal e que os movimentos deveriam protestar e cobrar novos assentamentos em Brasília.

- Os movimentos deveriam cobrar novos assentamentos na Esplanada dos Ministérios. O governo federal tem a faca e o queijo na mão para realizar a reforma agrária. Estamos no sétimo ano do governo Lula, que tem muita afinidade com os movimentos sociais. Aliás, soube que Rainha já recebeu cerca de R$10 milhões do governo federal e que o Ministério Público estaria apurando a aplicação desses recursos - disse Marrey.

Na madrugada de segunda-feira, movimentos ligados a Rainha, líder dissidente do MST, invadiram 20 fazendas em 15 municípios paulistas. Eles batizaram a operação de Carnaval Vermelho e protestaram contra o que chamaram de "descaso e falta de eficiência" do governo José Serra nos assentamentos. Os manifestantes reclamam ainda de um projeto que legaliza as terras públicas ocupadas por posseiros e reduz o número de assentamentos para a reforma agrária.

Uma reunião que Rainha teria com o secretário de Justiça amanhã foi cancelada depois das invasões desta semana.

-- Eu desafio o secretário a marcar uma reunião com o ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, para levar a reforma para o comando do Incra. Eu e Marrey falamos a mesma linguagem. Nós dois queremos que a reforma agrária seja de responsabilidade do governo federal. Se Marrey não marcar reunião com o ministro, eu mesmo vou marcar e dizer que o governo Serra coloca milhões na construção de presídios em São Paulo, mas não põe um centavo nos assentamentos - disse Rainha.

Marrey foi taxativo:

- Não vamos revogar as portarias em hipótese alguma e nem mesmo retirar o projeto de lei que tramita na Assembleia Legislativa. O Legislativo é o fórum adequado para o aprimoramento de qualquer projeto sobre o assentamento em São Paulo. As invasões são políticas e não trazem resultado positivo. Pelo contrário, geram um clima de insegurança e rompimento da paz - disse o secretário de Justiça.

Segundo Marrey, embora o estado administre terras desapropriadas, a atribuição maior na reforma agrária é do governo federal. O secretário disse que o estado tem função subsidiária na arrecadação de terras devolutas e que em dois meses instalou dois novos assentamentos, em Presidente Venceslau e Euclides da Cunha. Segundo o secretário, outros dois assentamentos estão em fase de licença ambiental na região. Ele disse que, nas áreas onde o estado tem acesso, o assentamento é feito; e que São Paulo administra pelo menos cem assentamentos. Marrey afirmou que o governo estadual tem lista de pessoas para receber terras e não abrirá mão de assentar famílias com vocação rural.

-Vamos sempre dar preferência a quem tenha vocação rural e não a quem invadiu a terra simplesmente. Não é papel do governo fazer política de clientelismo do movimento sem-terra. O governo tem um cadastro de pessoas interessadas na terra e vai dar preferência a esta lista. Os movimentos sociais não vão controlar São Paulo. Eles querem dominar a escolha de famílias, mas não vão conseguir. Esses movimentos, que vivem de conflitos, querem infernizar os assentamentos, e nós não vamos dar o controle do processo a eles - disse o secretário de Justiça paulista.

Rainha acusa o Itesp, que reage

No sábado passado, duas fazendas já haviam sido ocupadas por integrantes do MST, de cuja direção Rainha se afastou em 2005. Nas invasões de segunda-feira, participaram dissidentes do MST e integrantes do Movimento dos Agricultores Sem-Terra (Mast) e do Terra Brasil União dos Trabalhadores Sem-Terra (Uniterra).

Rainha disse que a ocupação das 20 fazendas será mantida. Ele prepara um abaixo-assinado pedindo o fechamento do Itesp, Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo. Rainha espera ter a adesão de cinco mil pessoas que, segundo ele, estão descontentes com o processo de assentamento na região. Ele disse que o órgão não cumpre o seu papel, de monitoramento e fiscalização das terras.

- O Itesp, com os seus 700 funcionários, é um verdadeiro cabide de emprego. Boa parte dos empregados não é concursada. O órgão tem que cuidar da questão fundiária, de fiscalização e da legalidade das terras, e não dos assentamentos. O Itesp cadastrou seis mil pessoas no Pontal, mas até agora não fez nada por ninguém - disse Rainha.

Em nota, o Itesp disse que o Pontal do Paranapanema é prioritário e que desenvolve na região projetos e ações de estímulo ao desenvolvimento, "tanto por meio da promoção de assentamentos de trabalhadores rurais, com a devida assistência técnica para a produção, como através de regularização fundiária, buscando segurança jurídica para facilitar a atração de novos investimentos".

"O Itesp viabiliza a ocupação produtiva de áreas públicas e presta assistência técnica gratuita a 104 assentamentos naquela região, beneficiando mais de 5.500 famílias de pequenos produtores rurais, gerando milhares de empregos, aumentando a renda e contribuindo para o crescimento econômico das cidades", diz o comunicado.