Título: China, esperança dos mercados
Autor: Scofield Jr., Gilberto; Frisch, Felipe
Fonte: O Globo, 05/03/2009, Economia, p. 23

Expectativa de novo pacote chinês leva alta às bolsas globais: Bovespa salta 5,3%.

AChina comunista, quem diria, pode se tornar a salvação do mundo capitalista. A expectativa de que a reunião anual do Partido Comunista da China (PCC), que começa hoje, traga um novo pacote de estímulo à economia fez os mercados de todo o mundo fecharem em alta. O Dow Jones, principal índice da Bolsa de Nova York, subiu 2,23%, dois dias depois de registrar seu menor patamar desde abril de 1997. Já o Ibovespa, da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), avançou 5,31%, aos 38.402 pontos. Foi a segunda maior alta do ano, só perdendo para os 7,17% do primeiro dia útil de 2009. Com isso, a Bovespa voltou a ficar positiva no ano, em 2,27%.

- O que é bom para a China é bom para o mundo - disse Paul Mendelsohn, diretor de Investimentos da Windham Financial Services.

O PCC vai aproveitar a reunião do Congresso Nacional do Povo (CNP), em Pequim, para afirmar que a crise exige a união do país em torno de sua liderança. Em meio a uma crise que já ceifou mais de 26 milhões de empregos - invertendo o processo de urbanização do país e levando inquietação ao campo -, o primeiro-ministro da China, Wen Jiabao, deve anunciar o segundo pacote de estímulo do país. O primeiro, em novembro, foi de US$586 bilhões.

O novo pacote, que deve ampliar a cobertura dos benefícios previdenciários para quem perdeu o emprego na crise, pode inverter a queda das exportações do país. E até, dependendo das medidas a serem anunciadas, reativar a economia chinesa, que cresceu 6,8% no quarto trimestre de 2008, e reduzir o desemprego, hoje em 10% nos grandes centros.

Os mercados também foram influenciados pela alta da produção industrial chinesa. O Índice de Gerentes de Compra passou de 45,3 para 49 pontos em fevereiro, aproximando-se do patamar de 50, acima do qual há indicativo de expansão.

A China ofuscou vários dados ruins da economia americana divulgados ontem. O índice do Instituto de Gerenciamento de Estoques para o setor de serviços caiu de 42,9 para 41,6 pontos em fevereiro. E pesquisa da ADP Employer Services mostrou que o setor privado demitiu 697 mil mês passado, contra 614 mil em janeiro. Foi a maior queda da série histórica, de 2001. Além disso, o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) afirmou, em seu Livro Bege, que as condições da economia do país se deterioraram em janeiro e fevereiro, e os empresários não esperam melhora até o fim deste ano ou início de 2010.

Até a queda de 0,5% da economia australiana no quarto trimestre, divulgada ontem, ficou de lado. Foi o primeiro recuo em oito anos. Analistas esperavam expansão de 0,2% frente ao terceiro trimestre, que subira 0,1%. A Bolsa de Xangai subiu 6,12% e a de Tóquio, 0,85%. Frankfurt avançou 5,24% e Londres, 3,81%.

Dólar recua 1,7%, para R$2,370

Na Bolsa brasileira, as maiores altas foram as ligadas às commodities (matérias-primas), sobretudo as metálicas, que podem se beneficiar de uma recuperação da China. As ações ordinárias (ON, com direito a voto) da Vale subiram 10,14%, e as preferenciais (PNA, sem voto), 9,69%. A maior alta foi dos papéis da Bradespar, do grupo de controle da empresa: 10,86%. Os papéis das siderúrgicas também saltaram: CSN subiu 9,15% e Usiminas, 8,13%. A alta da Petrobras foi mais modesta: 6,33% (PNs) e 6,59% (ONs).

Até o volume de negócios surpreendeu: R$4,722 bilhões, contra média diária de R$3,836 bilhões no ano. O dólar acompanhou o otimismo e caiu 1,7%, para R$2,370. Se ficar fora do mercado hoje, o Banco Central completará um mês sem vender dólares no mercado à vista para conter a escalada da moeda americana.

Mas o maior benefício do pacote chinês será do próprio PCC, que ganha tempo para contornar a crise. O governo autoritário, afinal, deve sua legitimidade à expansão da economia e à retirada de 250 milhões de pessoas da miséria desde os anos 80.

- Os líderes chineses não querem nenhuma surpresa. Eles querem projetar uma imagem de unidade do topo do PCC até a base - afirmou Deng Xueliang, ex-membro do PCC e professor da Universidade de Ciência e Tecnologia de Hong Kong.

Tanto o primeiro-ministro quanto o presidente chinês, Hu Jintao, já disseram que 2009 será o ano mais difícil da economia chinesa, já que o crescimento está bem abaixo do considerado ideal pelo governo para a criação de empregos: 8% ao ano. Semana passada, o Politburo chinês disse que a crise será enfrentada com mais gastos públicos e ampliação da rede social.