Título: Lula defende estatização de banco em país rico
Autor: Gois, Chico de
Fonte: O Globo, 06/03/2009, Economia, p. 25
Para presidente, Manifesto Comunista era seguido como se "tivéssemos que ser um robô, sem direito de pensar"
BRASÍLIA. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu ontem a estatização de bancos nos países desenvolvidos como forma de promover a retomada do crédito, que secou durante a crise. Em sua avaliação, a crise expõe o declínio do neoliberalismo, e o Estado não é um estorvo para o desenvolvimento. O presidente se disse ainda favorável a uma ação política dos governantes mundiais para enfrentar a crise global:
- A ideologia neoliberal do Estado mínimo experimenta o seu crepúsculo.
Lula criticou o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Manifesto Comunista, de Karl Marx e Friedrich Engels, que, segundo ele, dizia o que se tinha de fazer para que outros obedecessem como robôs. Lula discursou durante abertura do Seminário Internacional de Desenvolvimento, que marca a 29ª reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES).
- O dilema que está colocado para os países é saber o seguinte: podemos ou não voltar ao crédito que tínhamos antes da crise? Esse é um desafio. Onde está o dinheiro, Gerdau, que circulava pelo mundo afora? Desapareceu? - perguntou Lula, dirigindo-se a Jorge Gerdau Johannpeter, do grupo Gerdau. - Será que os países ricos vão continuar apenas colocando dinheiro com o intuito de salvar bancos, ou alguns países terão coragem de estatizá-los, recuperá-los, fazer voltar o crédito?
Lula fez uma analogia com a evaporação da água para demonstrar que só injetar recursos em bancos não funciona.
- O que não pode é ficar colocando água na panela quente sem os ingredientes para fazer a comida, porque a água evapora. Pode colocar mais um copo, que vai evaporar. O que precisamos é colocar os ingredientes para, daquela água, fazer nossa comida e sobreviver.
Lula também elogiou os que foram contrários à ideia do Estado mínimo.
- Definitivamente, essa crise deixa claro que a política não é o oposto da eficiência, é um dos seus pressupostos essenciais. Tampouco o Estado é o estorvo do desenvolvimento. Ele é, sobretudo, o indutor.
O presidente voltou a criticar a atuação do Fundo Monetário Internacional (FMI) nos países em desenvolvimento. E, apesar do discurso de cunho socialista, aproveitou para fustigar ideias comunistas em voga nos países do Terceiro Mundo antes da queda do Muro de Berlim, em 1989:
- Eu me lembro que, quando caiu o Muro de Berlim, fui muito criticado no Brasil, porque dizia que a queda do muro era a oportunidade de repensar as coisas no mundo, porque até então estava tudo escrito. O Manifesto Comunista dizia tudo o que a gente tinha que fazer. O Marx já tinha dito tudo o que tínhamos que fazer. Era como se tivéssemos que ser um pequeno robô, sem ter o direito de pensar.
Mantega ressalta bons indicadores econômicos
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, presente no seminário, afirmou que os indicadores da economia brasileira melhoraram neste início de ano, apesar da crise. Ele lembrou que as vendas de veículos mostraram pequena recuperação e que as admissões devem superar as demissões em março. Num momento em que o governo discute reduzir a meta de superávit primário, disse que haverá cortes nos gastos correntes para acomodar uma queda na arrecadação tributária. (Colaboraram Martha Beck e Gustavo Paul)