Título: Dilma corre o país na milhagem do PAC
Autor: Alvarez, Regina; Jungblut, Cristiane
Fonte: O Globo, 08/03/2009, O País, p. 8

Em 12 meses, ministra e pré-candidata à sucessão de Lula fez 30 viagens para promover obras do programa.

BRASÍLIA. Ungida pelo presidente Lula como a candidata do governo à sucessão presidencial, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, dedica-se, desde o início de 2008, a uma maratona de viagens cuidadosamente planejadas para torná-la conhecida e popular. Com o selo de "mãe do PAC", criado pelo presidente no começo dessa trajetória, em março do ano passado, no Rio, Dilma fez nos últimos 12 meses 30 viagens para promover 43 obras do Programa de Aceleração do Crescimento, sendo que 26 têm conclusão prevista para o fim de 2009 ou 2010, no auge da campanha eleitoral. Entre as intervenções visitadas por Dilma nesse período, 19 estão com execução física abaixo de 20% - as tocadas por estatais ou pela iniciativa privada estão em ritmo mais avançado.

No cardápio das viagens da ministra, as primeiras sempre acompanhada de Lula, figuram nove inaugurações de obras e dois "batismos" de plataformas da Petrobras, além de lançamentos e vistorias em outras 32, por sete estados. Predominam visitas ou lançamentos de intervenções do PAC com grande apelo popular, como projetos de saneamento e habitação.

Em praticamente todas elas, o discurso político de Lula esteve presente, mas o tom eleitoreiro denunciado pela oposição ganhou força no segundo semestre do ano passado. Em 2008, ainda ostentando um perfil técnico e sem experiência com palanques, Dilma fez a maior parte das viagens em companhia do presidente Lula, mas já na campanha eleitoral começou a mudar o tom, ganhou desenvoltura e partiu para voos solos. Ao mesmo tempo, Lula também passou a tratá-la em público como pré-candidata.

Para a oposição, toda a agenda de viagens da ministra é recheada de discursos políticos, com forte viés eleitoral, o que tem fundamentado as ações na Justiça Eleitoral. Estudiosos da política também concordam que há um processo antecipado de campanha, mas alguns alegam que isso é até natural no Brasil.

O cientista político Leonardo Barreto, da Universidade de Brasília (UnB), diz que é evidente que o calendário de obras do PAC está intimamente relacionado às pretensões eleitorais da ministra.

- Esta é uma eleição com fortes características de reeleição. A ministra é novata, mas ocupa cargo estratégico no governo, é uma espécie de primeira-ministra. É uma candidatura de laboratório - afirma, ponderando que na democracia os políticos estão em campanha permanente: - O que não pode é deixar que o clima eleitoral tome conta do Congresso, dos partidos e comprometa a governabilidade.

Para Jairo Nicolau, cientista político do Iuperj, é natural a postura da ministra. Ele diz que os governadores tucanos José Serra (SP) e Aécio Neves (MG) agem de forma semelhante, como pré-candidatos, só que com menos visibilidade.

- Todo mundo sabe que a Dilma é pré-candidata do PT. Ela se expõe, circula. Não se pode extinguir a ação política. Não vejo nada demais (ela viajar). Seria diferente se ela, nas visitas das obras do PAC, pedisse votos - afirma Nicolau.

Apesar dos protestos da oposição, juristas são mais cautelosos. Ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Fernando Neves pondera sobre a dificuldade de se fazer a distinção entre atos públicos e eleitoreiros:

- É muito difícil saber o que são atos normais da vida da administração pública ou quando são atos de campanha. Conversas políticas são próprias do sistema político. O que não se pode é usar a máquina para campanha eleitoral - diz Neves, sem comentar casos específicos.

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e ex-presidente do TSE Marco Aurélio Mello também não quis comentar o caso específico da ministra Dilma, mas alertou os políticos para o fato de que o tribunal vem aumentando o rigor no cumprimento da legislação eleitoral.