Título: ONGs pressionam contra CPI do Aborto
Autor: Alencastro, Catarina; Tabak, Flávio
Fonte: O Globo, 12/03/2009, O País, p. 10

Comissão investigaria comércio de substâncias que interrompem gestação.

RIO e BRASÍLIA. ONGs ligadas a movimentos feministas querem barrar a instalação da CPI do Aborto, proposta por deputados ligados à Igreja e aprovada no fim do ano passado, na Câmara. A CPI teria como objetivo investigar o comércio clandestino de substâncias abortivas. No país, somente casos de estupro e de gravidez com perigo de vida para a mãe têm previsão legal. No entanto, estima-se que mais de um milhão de abortos clandestinos são feitos todos os anos no país. Um quarto dessas intervenções provocam atendimentos hospitalares decorrentes de complicações.

- Para nós, feministas, essa é a CPI da fogueira, que quer execrar mulheres que decidem interromper uma gravidez - disse Natália Mori, do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea).

- Tem de ser chamada de CPI da excomunhão. Enquanto centenas de mulheres são estupradas e engravidadas, eles querem investigar os abortos ilegais. Trata-se de uma perseguição religiosa - completou o juiz Roberto Lorea, do TJ do Rio Grande do Sul.

As ONGs apresentaram dados do Ministério da Saúde. Entre 2000 e 2006, 192.445 meninas até 14 anos foram mães e outras 105 de mesma idade morreram por problemas relacionados à gravidez. Em 2006, 250 meninas de 15 a 19 anos morreram.

- Esse discurso conservador contra o aborto e pela vida muitas vezes levam à morte das mães - disse Natália.

O médico Olimpio Moraes, que fez o aborto da menina de 9 anos estuprada pelo padrasto em Pernambuco, participou do encontro. Disse que respeita os católicos e que eles não devem sentir vergonha pela decisão de interromper a gravidez da garota. Segundo ele, seria um erro ético não fazê-lo.

Bispo critica declarações de Dom José Cardoso Sobrinho

No Rio, o bispo auxiliar Dom Antônio Augusto Dias Duarte, responsável pelas paróquias da Zona Sul, fez ontem à noite, na Igreja Nossa Senhora da Paz, em Ipanema, uma palestra para defender os dogmas da Igreja sobre o aborto. Dom Antônio, no entanto, criticou a forma com que o arcebispo de Olinda e Recife, Dom José Cardoso Sobrinho, se pronunciou sobre o caso da menina de Pernambuco.

- Talvez o momento não fosse o mais adequado pastoralmente. Embora o conteúdo tenha sido absolutamente correto. E a Igreja não procurou a TV, mas sim foi procurada.

Na palestra para cerca de 150 fiéis, Dom Antônio, que também é pediatra, falou sobre os riscos de uma gravidez aos 9 anos de idade. Ele citou um exemplo recente no Chile, onde uma menina da mesma idade, também vítima de estupro, teve o filho e agora é assistida pelo Estado.