Título: Brics são contra dar dinheiro extra ao FMI
Autor: Duarte, Fernando
Fonte: O Globo, 14/03/2009, Economia, p. 34

Mantega afirma que novos recursos só serão considerados após reforma que dê mais poder no Fundo a emergentes.

HORSHAM, Inglaterra. Embora durante a semana tenha se falado em divergências entre Estados Unidos e União Europeia em relação à pauta do encontro dos países do G-20 (grupo de nações mais ricas e emergentes), no dia 2 de abril em Londres, foi o grupo dos Brics (formado por Brasil, Rússia, China e Índia) que ontem apresentou o primeiro desafio mais formal do encontro. Os países vão vetar a proposta de aportes adicionais de recursos ao Fundo Monetário Internacional (FMI), como parte dos esforços de combate à crise mundial, até que a instituição passe por uma reforma radical em termos de representatividade.

Tal posição, anunciada ontem pelo ministro da Fazenda do Brasil, Guido Mantega, será comunicada formalmente hoje na reunião preparatória com os ministros da área econômica, em Horsham, um enclave rural nos arredores de Londres.

Países ricos apoiam aumento de recursos no Fundo

E desde já representa um golpe nas intenções do Reino Unido, cuja proposta de aumento de aporte de recursos do Fundo vinha sendo alardeada como chave para o encontro na capital britânica.

- Não faremos aporte adicional de capital enquanto não houver reformas de cotas e vozes. No atual contexto, a representação dos Brics ainda é pequena diante de sua força. Nossa sugestão é que se apresse a proposta de reforma do Fundo prevista para 2001 - disse Mantega, em entrevista coletiva após encontro com representantes dos Brics.

Nas últimas semanas, o FMI vem dizendo que precisa dobrar o atual volume de recursos para US$500 bilhões para ter condições de contribuir com o fortalecimento das economias dos países em desenvolvimento.

Entre países mais ricos há movimentos favoráveis nesse sentido, com o Japão oferecendo US$100 bilhões e a União Europeia (UE) considerando uma injeção de US$150 bilhões. Recentemente, um dos principais assessores do primeiro-ministro Gordon Brown, Lord Malloch-Brown, mencionou especificamente o envolvimento da China.

Mantega admitiu que será virtualmente impossível que os Brics obtenham ganhos significativos na questão do FMI já na reunião de Londres, mas acredita que o encontro possa ao menos trazer a reivindicação dos países emergentes para um ponto mais prioritário na agenda do G-20. Mas ele alertou que cada dia perdido pode ser prejudicial para a revitalização da economia mundial.

- Se houver vontade política, poderemos até fazer uma reforma mais rápida, talvez até na reunião do G-20 de outubro, mas mesmo assim talvez seja tarde para tomar medidas necessárias agora - completou o ministro.

Segundo o ministro brasileiro, os Brics estão de acordo com uma política fiscal mais ativa no combate à crise mundial, mas não chegou a um acordo sobre o volume dos estímulos de cada país. A proposta britânica é de um compromisso em torno de 2% das economias nacionais.

Durante a semana, vieram à tona diversos focos de divergência entre alguns dos principais países envolvidos. A principal diferença está no posicionamento de EUA e União Europeia. Os americanos, com o apoio do Reino Unido, defendem estímulos fiscais como molas mestras para a recuperação, um plano rechaçado por gigantes europeus como França e Alemanha, defensores de mais regulação do sistema financeiro internacional.

Concessões de paraísos fiscais com sigilo bancário

Em uma tentativa de evitar uma sanção severa contra os paraísos fiscais por casos de evasão de impostos, Suíça, Áustria e Luxemburgo fizeram concessões, mas insistiram que o sigilo dos bancos permaneça intacto.

Representantes dos países se encontraram na quinta-feira à noite, antes da reunião do G-20, e se comprometeram a seguir as regras da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) de compartilhamento de informações sobre correntistas com outros países, mas considerando caso a caso, e não automaticamente como muitos países defendem. O anúncio não foi suficiente, no entanto, para evitar protestos de integrantes de ONGs na ilha de Jersey, no Reino Unido, que pediram reformas na regulação desses paraísos fiscais.