Título: Caso Telebrás: Justiça absolve; MP vai recorrer
Autor: Brígido, Carolina; Rodrigues, Eduardo
Fonte: O Globo, 14/03/2009, Economia, p. 37

Após dez anos, integrantes do alto escalão do governo FH são inocentados por favorecimento em privatização.

BRASÍLIA e RIO. A Justiça Federal absolveu integrantes do governo Fernando Henrique Cardoso da acusação de terem conduzido ilegalmente a privatização do Sistema Telebrás. Eram réus no processo o então ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros, dois ex-presidentes do BNDES, André Lara Resende e José Pio Borges, e o ex-presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), Renato Guerreiro. A decisão foi tomada pelo juiz da 17ª Vara Federal em Brasília, Moacir Ferreira Ramos, no dia 4, uma década após o início do processo. O Ministério Público, autor da ação, anunciou que vai recorrer. Porém, o novo procurador designado para o caso, Wellington Divino Marques, preferiu não comentar a decisão antes de conhecer o processo.

O grupo foi acusado de ter privilegiado o Banco Opportunity e outras empresas no leilão de venda da Telebrás, em julho de 1998. Mendonça de Barros foi acusado de encorajar fundos de pensão, como a Previ e a Funcef, e seguradoras ligadas ao Banco do Brasil a investirem no consórcio Telemar. Escuta telefônica divulgada pela imprensa na época revelou o diálogo do então ministro com os representantes dessas instituições.

Segundo Luiz Carlos Mendonça de Barros, um outro processo que tramita na Justiça Federal do Rio deverá ter o mesmo fim, com a absolvição dos acusados. Segundo ele, apesar da demora, ficou provado que não houve favorecimento à Telemar:

- A decisão do juiz se baseou em parecer do Tribunal de Contas da União (TCU) de 2002, que comprovou que não houve favorecimento.

Ação na Justiça envolveu ainda BNDES e Anatel

No mesmo processo, o BNDES foi acusado de emprestar quase R$500 milhões a três empresas que participaram do leilão: a construtora Andrade Gutierrez, a Macal Investimento e Participações e a Inepar Indústria e Construções - que se associaram no consórcio que levou a Tele Norte Leste (ex-Telemar e atual Oi), da qual o braço de participações do banco, a BNDESPar, tornou-se sócio. De acordo com o Ministério Público, o dinheiro teria sido emprestado "a juros baixíssimos". A Anatel, responsável pela regulação do setor de telefonia, foi considerada co-responsável pelas supostas fraudes.

Na decisão, o juiz argumentou que Mendonça de Barros e o BNDES não interferiram na concorrência para favorecer participantes do leilão. Eles teriam apenas agido para viabilizar a licitação, umas das maiores privatizações já ocorridas no mundo. O juiz citou um parecer do TCU, que concluiu que as ações dos investigados não causaram prejuízo aos cofres públicos nem restringiram a disputa no leilão.

- É uma decisão esperada, pelo menos no que me diz respeito, pois há muito tempo está comprovado que não houve ilicitude. Mas é uma pena ter que esperar dez anos para resolver o assunto. Foi uma ação baseada em interesses políticos da época - disse Renato Guerreiro.

José Pio Borges e André Lara Resende, outros absolvidos, não foram localizados.

A ação foi proposta pelo Ministério Público, a pedido de integrantes do PT. Segundo o juiz, o partido poderia ter contribuído com as investigações a partir de 2003, quando Luiz Inácio Lula da Silva assumiu a Presidência. O senador Aloizio Mercadante (PT-SP) reagiu, classificando como descabida a cobrança do juiz. Afirmou que nunca foi solicitado para ajudar no processo e que as investigações são de responsabilidade do Ministério Público.

Mercadante criticou a decisão do juiz de absolver os acusados, lembrando que um dos envolvidos chegou a falar publicamente que tinha preferência pelo grupo Opportunity, referindo-se a Mendonça de Barros.

- Como a decisão é em primeira instância, espero que o MP recorra - afirmou o senador.

Relembre o episódio

A origem do caso Telebrás remonta à sua privatização, em julho de 1998. No dia 29 daquele mês, 12 empresas do Sistema Telebrás foram vendidas por R$22 bilhões, com ágio de mais de 60%. A Tele Centro Sul (hoje Brasil Telecom) foi arrematada por cerca de R$2 bilhões por consórcio liderado pelo Opportunity. Já a Tele Norte Leste (hoje Oi) foi adquirida - por R$3,43 bilhões - pelo consórcio Telemar, capitaneado pelo grupo La Fonte. O então ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros, os dois ex-presidentes do BNDES André Lara Rezende e José Pio Borges, bem como o ex-presidente da Anatel Renato Guerreiro, foram acusados de favorecer o Opportunity, com base em trechos de conversas telefônicas grampeadas clandestinamente. No mesmo processo, o BNDES foi acusado de emprestar ilegalmente quase R$500 milhões a empresas que se associaram ao consórcio Telemar, conforme ação proposta pelo Ministério Público Federal, em 23 de março de 1999. Em 4 de março deste ano, os acusados foram inocentados.