Título: Para mercado, Brasil crescerá apenas 0,59%
Autor: Martins, Marília; Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 17/03/2009, Economia, p. 17

Juro básico ficaria em um dígito. Morgan Stanley prevê retração de 4,5% este ano

BRASÍLIA e NOVA YORK. Bancos e corretoras cortaram à metade a projeção de crescimento da economia brasileira para este ano. Em uma semana, a pesquisa Focus, feita pelo Banco Central (BC) com 80 instituições financeiras, diminuiu de 1,2% para 0,59% a estimativa de expansão do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país) para 2009. Ou seja, o mercado espera estagnação. Com base nisso, o mercado se convenceu de que o Banco Central (BC) vai levar a Taxa Selic para o patamar inédito de apenas um dígito a curto prazo: a pesquisa aponta juros de 9,75% em dezembro deste ano, contra 10,25% no levantamento anterior.

- A Selic de um dígito está dada. A dúvida é se ela pode ficar entre 8,5% e 9% ao ano - afirmou o economista-chefe do banco Fator, José Francisco Gonçalves, que aposta em 9%.

O banco Morgan Stanley divulgou um relatório bastante pessimista ontem, prevendo retração de 4,5% para a economia brasileira este ano. A previsão anterior era de estagnação. O texto cita a queda de 3,6% do PIB no quarto trimestre, com sinais de desaceleração neste início de ano, e "a preocupação de que o quadro global se mostrará pior do que o previsto". Para a América Latina, a previsão de retração passou de 0,5% para 4,3%.

"Bancos não acertam nem no crescimento deles", diz Lula

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, depois de participar de um seminário sobre economia brasileira patrocinado por "Wall Street Journal" e "Valor Econômico", em Nova York, comentou essa previsão:

- Esses bancos não acertaram nem no crescimento deles, que dirá do Brasil. Não vamos crescer tanto quanto gostaríamos, mas 2009 terá crescimento positivo. Eu sei da grandeza da crise e acho que o Brasil tem oportunidade de poder dar um salto de qualidade nesses fóruns internacionais.

A revisão das projeções para os juros básicos ocorreu depois que o Comitê de Política Monetária (Copom) cortou em 1,5 ponto a Selic na semana passada, para 11,25%, retornando ao mínimo histórico, de 2007. A redução foi motivada pela queda do PIB. Agora, o mercado espera outro corte de 1,5 ponto na próxima reunião do BC, em abril, e mais na seguinte, em junho.

Além de apontar crescimento quase zero, o Focus revela que o grande responsável pela desaceleração econômica brutal será a indústria. Se na pesquisa anterior a estagnação já estava consolidada (retração de 0,04%), agora o quadro é de uma recessão significativa, com queda de 1,59%. Isso explica por que a recuperação, para o mercado, desenha-se apenas em 2010, quando o PIB poderá crescer 3,5%, segundo a média das projeções.

Apesar da esperada reação do BC, com importante flexibilização da política monetária, o mercado faz coro ao afirmar que só a redução da Selic não vai resolver. São necessárias mais ações governamentais, com investimentos diretos ou incentivados.

- Nossa recuperação não vai depender apenas da Selic. É preciso recuperar a confiança do consumidor, trazer mais investimentos - disse o economista-chefe do banco Schahin, Sílvio Campos Neto, que espera expansão do PIB de 0,7% neste ano, mas mantém viés de baixa.

Tanto Lula como o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, afirmaram que o Brasil não passará por uma recessão, será um dos primeiros países do mundo a sair da crise e crescerá este ano. Segundo Dilma, os indicadores do governo mostram que a recuperação deverá começar já agora no segundo semestre.

- Nas crises do México, da Rússia e dos países asiáticos, menos graves que a atual, o Brasil quebrou em poucos dias. Desta vez, o Brasil não quebrou, nem vai quebrar. Cresceremos em 2009 menos do que gostaríamos, menos do que poderíamos se não fosse a crise externa, Mas, estejam certos, vamos crescer - afirmou Lula, garantindo que não cortará os investimentos sociais e em infraestrutura.

Presidente defende consenso contra a crise no G-20

Os ministros e assessores passaram a tarde de ontem no seminário em Nova York preocupados em mostrar que, ou a crise não afetou o Brasil na mesma magnitude que outros países, ou que o país já mostra sinais de recuperação. Ao fim de sua palestra, Mantega chegou a fazer piada com os títulos americanos ao pedir mais investimentos para o Brasil.

- As autoridades chinesas estão preocupadas com seus investimentos em títulos dos EUA por causa do alto endividamento e da situação econômica do país. Diante do que mostrei aqui, posso dizer para quem busca um investimento seguro: em vez de aplicar em títulos dos EUA, que tal comprar títulos do Tesouro brasileiro?

Em seu programa semanal de rádio "Café com o presidente", Lula comentou o encontro com Barack Obama, no sábado, e insistiu que os EUA "têm papel extremamente importante" na solução da crise:

- O presidente Obama tem clareza do tamanho da crise, da responsabilidade dos Estados Unidos e de que é preciso estabelecer um consenso entre os países do G-20 para que possamos tomar medidas capazes de debelar essa crise.

COLABOROU Luiza Damé

(*) Enviado especial