Título: Caixa-preta até para senadores
Autor: Vasconcelos, Adriana; Fernandes, Diana
Fonte: O Globo, 22/03/2009, O País, p. 3

Estrutura fechada e controlada por poderosos impede acesso a dados da Casa.

Para ter acesso à surpreendente lista de servidores com cargos de direção no Senado, o 1º secretário, Heráclito Fortes (DEM-PI), esperou quase cinco dias. Demora que levou a instituição a corrigir pelo menos três vezes a lista de diretores, que começou com 147 nomes, caiu para 136 e depois foi fechada em 181. Para receber da diretoria geral, na sexta-feira, a lista dos primeiros 50 diretores que seriam dispensados da função, Heráclito mais uma vez penou: fez vigília de mais de três horas até que seu pedido fosse atendido. É apenas um exemplo de como a estrutura fechada, viciada e controlada por poucos poderosos funcionários do Senado dificulta - e muitas vezes impede - o acesso a informações da caixa-preta mais bem lacrada do setor público atualmente.

Não são poucos os que consideram que essa estrutura é herança de Agaciel Maia, diretor-geral do Senado por 14 anos, que exerceu o cargo com uma forte concentração de poder. Poder que tem ecos ainda hoje, mesmo depois de sua saída do cargo, dia 3 de março, após denúncia de que ocultou de seu patrimônio uma mansão de R$5 milhões.

- É uma pauleira receber informações. Quem sai leva todas as informações, e quem chega fica no escuro - reclamou Heráclito Fortes, na última sexta-feira.

Nem dados oficiais e que deveriam ser públicos, como contratos e atos normativos internos, são integralmente fornecidos pelo Senado.

Da tribuna, também na última sexta-feira, o senador Pedro Simon (PMDB-RS) - o mais antigo parlamentar da Casa, exercendo seu quarto mandato - reconheceu que a falta de transparência na instituição é resultado da omissão de seus próprios integrantes:

- Vamos ser sinceros, a culpa é nossa! Começando por mim, que sou o senador mais antigo, logo devo ser o mais culpado - afirmou.

Pelo menos um grupo teve grande influência na construção dessa caixa-preta: o PMDB. Desde a redemocratização, em 1985, esse partido esteve fora do comando do Senado por apenas quatro anos - na gestão do pefelista baiano Antonio Carlos Magalhães - e por curtos períodos de transição, justamente aqueles em que senadores do partido foram desalojados da presidência para responder a processos por quebra de decoro, casos de Jader Barbalho (PA) e Renan Calheiros (AL).

Em 24 anos, 9 senadores do PMDB no comando

Nove senadores peemedebistas já ocuparam a presidência do Senado nos últimos 24 anos, sendo que o atual, José Sarney (AP), está no cargo pela terceira vez. Foi ele que, na primeira vez que chegou ao cargo, em 1995, nomeou Agaciel Maia para a diretoria geral.

Agaciel foi peça importante na ampliação da estrutura administrativa que permitiu aos senadores e ao alto escalão do Senado criarem muitas funções de confiança: todos por lá afirmam que 70% das 181 diretorias foram criadas após a chegada da dupla Sarney/Agaciel ao comando da Casa.

Entre os servidores da Casa, Agaciel conquistou prestígio e respeito ao dividir com eles, a cada fim de ano, o que chamava de "sobras de orçamento", como aconteceu em janeiro, quando a instituição desembolsou R$6,2 milhões de horas extras para 3.883 servidores durante o recesso. Dados que só foram descobertos quando alguém resolveu denunciar, porque detalhes da folha de pagamento do Senado também estão na caixa-preta.

Mesmo fora do cargo, Agaciel ainda mantém um séquito de fiéis seguidores.

- Estou com vontade de bater em todos vocês! Tem gente que vai sentir muita falta do doutor Agaciel - disparou uma de suas antigas secretárias, ao recepcionar um grupo de jornalistas que pedia para falar com o novo diretor-geral da Casa, Alexandre Gazineo.

A despeito da surpresa geral com a revelação de que a Casa dispunha de 181 diretores em ação, ninguém no Senado se dispôs a informar como e quando todos esses cargos foram criados. Nem mesmo para responder à suspeita de que foi a partir da gestão de Sarney que a estrutura da Casa inchou.

A resistência da diretoria geral em fornecer dados tem levado a Secretaria de Comunicação Social à loucura.

- A mesma dificuldade que vocês (jornalistas) têm nós também temos para conseguir informações - desabafou uma das diretoras da área.