Título: Repasses federais aos estados entram no jogo de alianças da eleição de 2010
Autor: Lima, Maria; Alvarez, Regina
Fonte: O Globo, 22/03/2009, O País, p. 4

Transferências voluntárias da União subiram 40,8% de 2007 para 2008.

BRASÍLIA. O governo trabalha em várias frentes para angariar apoios e garantir palanques nos estados para a ministra Dilma Rousseff, pré- candidata do PT à sucessão presidencial. O assédio a alguns governadores de oposição é explícito, e a divisão do bolo orçamentário reflete o viés político nos repasses de recursos da União. As transferências voluntárias do governo federal aos estados - aquelas não previstas na Constituição - cresceram 40,8% de 2007 para 2008, mas o rateio das verbas é desigual, beneficiando aliados e governadores que não fazem oposição ferrenha ao governo Lula

Enquanto Pernambuco - estado natal do presidente -, governado pelo aliado Eduardo Campos (PSB), teve um aumento de 136,8% nessas transferências em 2008 em relação a 2007, o Rio Grande do Sul, da tucana Yeda Crusius, teve uma queda de 27,3% no mesmo período. Segundo Yeda, o governo federal, de olho em 2010, também inviabilizou acordo com as concessionárias de rodovias que resultaria em investimentos de R$4 bilhões nas estradas gaúchas ainda na sua gestão:

- O Rio Grande não é tratado com igualdade. Fazemos a nossa parte, mas sabemos que vamos ser prejudicados pelas escolhas do governo federal.

Entre os principais estados governados pela oposição, apenas o Distrito Federal aparece em posição confortável no rateio dos recursos federais, com aumento de 82,3% entre 2007 e 2008. Não é por acaso que a relação de José Roberto Arruda (DEM) com o governo federal é de total harmonia. Único governador do DEM, partido que faz oposição mais ferrenha ao governo petista, Arruda se derrete ao falar, nos bastidores, da dupla Lula/Dilma. Admite que não falta dinheiro federal para todos os projetos que apresenta.

Arruda escapa da decisão entre Dilma ou um tucano

O governador relaciona as obras em regiões degradadas e de baixíssima renda que usará para enfrentar o populista Joaquim Roriz (PMDB) em 2010, e diz que não falta dinheiro para tocá-las: são 1.715 projetos com recursos de Banco Mundial, Caixa Econômica Federal, Ministério das Cidades e GDF, que somam R$6 bilhões este ano.

Obras que ajudaram sua popularidade pular de 52%, no início do governo, para mais de 70%, agora. Por isso, Arruda evita falar de 2010, quando abordado sobre a opção entre Dilma e o candidato tucano - José Serra (SP) ou Aécio Neves (MG):

- Não vou entrar nessa onda de antecipação da campanha de 2010. Vou manter o foco na gestão administrativa.

As transferências voluntárias são recursos que o governo federal repassa aos estados, como deseja, para investimentos em infraestrutura, habitação, saneamento, segurança e outras áreas, por meio de convênios. Num quadro de crise econômica, em que as transferências constitucionais - atreladas à arrecadação - caem, o poder discricionário do governo cresce.

Vizinho da sede do poder, Goiás vive situação bem diferente do Distrito Federal. As transferências voluntárias cresceram apenas 20% . Além disso, o governador Alcides Rodrigues (PP) tem dificuldades para liberar empréstimo de R$1,2 bilhão do BNDES, para sanear as contas da Centrais Elétricas de Goiás.

As negociações já duram dois anos, e, segundo o presidente do PSDB goiano, deputado Leonardo Vilela, os negociadores do governo estariam pressionando Rodrigues a romper a parceria política com o senador Marconi Perillo (PSDB) para permitir um palanque forte para Dilma. A estratégia seria uma chapa estadual entre PP, PMDB e PT - com o presidente do Banco Central, Henrique Meireles (PP), e o prefeito Iris Resende (PMDB).

- A negociação não avançou. O Lula vem passando mel no bico dele e só tem mandado uma merrequinha de dinheiro para Goiás. Sabem que o palanque do Marconi é muito forte para Serra ou Aécio. Investem pesado para tirar o governador da órbita do PSDB e ter palanque para Dilma - reclama Vilela.

"Espero que o presidente se dê conta da relevância de SP"

Segundo parlamentares goianos, por trás do atraso na liberação do empréstimo do BNDES estariam o ex-ministro José Dirceu e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, que quer disputar uma vaga na Câmara, em 2010. Aliados do governador dizem que em Brasília já ouviram nas reuniões: as liberações vão se resolver se a relação com o governo de Goiás evoluir para uma parceria política explícita.

No rateio dos recursos das transferências voluntárias, estados governados por petistas ou aliados, como Pará e Mato Grosso, tiveram aumento de mais de 100%. Já em São Paulo o crescimento entre 2007 e 2008 foi de 23,2%, e em Minas, de 12,7%.

O líder do PSDB na Câmara, José Anibal (SP), critica:

- Espero que o presidente Lula se dê conta da relevância de São Paulo para a recuperação da economia nacional e que o fato de ser uma administração de oposição não seja objeto de mesquinharia. Esse jogo da política de discriminar opositores com recursos federais é um retrocesso na política brasileira.

O presidente do PT, Ricardo Berzoini (SP), rebate as acusações de uso da máquina:

- É legítimo que o PT tente formar palanques grandes para 2010. Mas não acredito que um governador de estado se submeta a uma lógica dessa.