Título: O preço da imunidade
Autor: Marinho, Antônio
Fonte: O Globo, 22/03/2009, Saúde, p. 41

Faltam ainda vacinas para completar o calendário gratuito do Ministério da Saúde.

Ocalendário do Programa Nacional de Imunizações (PNI) do Ministério da Saúde é um dos mais completos do mundo. Mas pediatras dizem que ele seria ainda melhor se pudesse incluir gratuitamente vacinas só encontradas em clínicas privadas, muitas com preços inacessíveis à população. Para se proteger de doenças de alta incidência como gripe, catapora, hepatite A, HPV (papiloma vírus humano), além de infecções por meningococo e pneumococo, é preciso pagar. Só esta última custa R$1.300, as quatro doses. E não apenas crianças precisam de imunização periódica. Adolescentes, adultos e idosos têm seus calendários. Nem sempre em dia.

Edimilson Migowski, professor de infectologia pediátrica na UFRJ, diz que há diferença expressiva entre os calendários do Ministério da Saúde e da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).

Vacinas importantes estão indisponíveis em postos de saúde, segundo Migowski, como catapora (varicela), gripe (crianças e adultos), meningococo, pneumococo, hepatite A e HPV. Além disso, a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm) recomenda que a vacina contra a poliomielite seja do tipo inativada, ou seja, com vírus mortos porque há menor chance de efeitos adversos em crianças vulneráveis. O MS oferece a gotinha com o vírus vivo atenuado:

- Vacina não é despesa, é investimento em saúde. Todas essas vacinas deveriam compor o calendário do MS. Talvez a única que não pudesse entrar, e aí não seria por não ter importância, mas sim por falta de capacidade produtiva para atender ao aumento da demanda, seria a da gripe. Ela é fabricada em ovos embrionados, o que limita sua produção.

No caso da gripe, lactentes, crianças e idosos são os que mais sofrem. A infecção costuma complicar nesses grupos. O calendário da SBIm prevê a imunização de bebês a partir de seis meses. É segura, eficaz e adolescentes e adultos também deveriam tomar a vacina, segundo Migowski. A dose anual custa R$45. No caso da catapora, a SBIm diz que uma só dose (são duas) já induz a imunidade em 70% a 90% das crianças que a recebem.

Migowski receita ainda a anti-HPV (dois fabricantes) em meninas, de preferência antes de iniciar a vida sexual, entre 11 anos e 12 anos. Este vírus causa o câncer de colo de útero, que no Brasil, devido ao diagnóstico tardio e à falta de tratamento, afeta milhares de mulheres, a maioria jovem e com filhos pequenos. Muitas morrem. O custo total das três doses varia de R$1 mil a R$1.200.

- Sai muito mais caro tratar o câncer. O esquema é de três doses e, por enquanto, não se recomenda doses de reforço - diz.

Gripe pode levar a diversas outras infecções

Como vacina não é só para crianças, outras faixas têm que se proteger. Cerca de 90% dos casos de tétano ocorrem em adultos.

- Será que todos sabem que uma dose da vacina contra tétano e difteria deve ser tomada a cada dez anos? Será que a vacina contra a hepatite B é usada como deveria? No Brasil, este vírus mata quatro vezes mais do que o da Aids- lembra Migowski.

Luiza Falleiros, pediatra, da Comissão Científica do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, diz que, em saúde pública, se faz o que é possível. Ela concorda que os calendários do MS são bons e a que a cobertura vacinal é excelente, se comparada a de outros países da América Latina. Porém, isso não significa que outras vacinas não devam entrar:

- A vacina contra catapora não é gratuita. Ao contrário do que muita gente pensa, não é uma doença benigna. Trata-se de infecção grave e muitas vezes requer internação.

A gripe é outra que requer atenção, alerta Luiza. A recomendação da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) é vacinar crianças até 5 anos. Até 2008 era de 2 anos. Nos EUA a indicação é até 18 anos, faixa obrigatória:

- O problema não é a gripe, mas tudo que ela pode trazer, como pneumonia pneumocócica e otites.

Ela também chama a atenção dos adultos, que não dão muita atenção para o calendário vacinal. E não é só com relação ao tétano, à febre amarela, à gripe e a hepatites. Há outras doenças pouco percebidas, como coqueluche (pertússis).

- Adultos acham que passaram da época de tomar vacinas ou que já se imunizaram na infância e estão protegidos pelo resto da vida. Há anos estão sendo identificados casos de coqueluche em adultos e adolescentes. Eles são os principais transmissores da doença a bebês de até dois meses ainda não imunizados e também aqueles de quatro meses, que estão completando a vacinação.

Para Eitan Berezin, diretor do Departamento de Infectologia Pediátrica da SBP, por limitações e falta de verbas nem todas as vacinas são oferecidas. Mas ele também afirma que algumas deveriam ser incluídas, como a antipneumocócica conjugada heptavalente (ou 7-valente). Ela protege contra bactérias tipo pneumococo, que causam doenças graves como meningite, pneumonia, otite média aguda, sinusite e bacteremia (presença de bactérias no sangue). E deve ser aplicada o mais cedo possível, de preferência, a partir do segundo mês. São três doses e um reforço.

- No Brasil nascem 3 milhões de crianças por ano e precisamos de um grande número de vacinas. No caso da gripe, como as crianças têm muitas infecções virais, as mães terminam não percebendo os benefícios da imunização. A vacinação nas crianças reduz a circulação do vírus em outras faixas etárias - diz. - Também é um erro achar que câncer de colo de útero só ataca populações carentes.

Uma outra vacina importante, em fase de aprovação na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), é a pneumocócica conjugada 13-valente (VPC 13), que deve substituir a 7-valente, que sai por cerca de R$250, cada uma das quatro doses. Será a primeira a prevenir contra 13 sorotipos da bactéria Streptococcus pneumoniae, causadores de doenças como meningite bacteriana e pneumonia. De acordo com a OMS, as doenças pneumocócicas são as que mais matam menores de 5 anos. E algumas são muito resistentes a antibióticos.