Título: Atas provam que regime queria bomba atômica
Autor: Franco, Bernardo Mello; Éboli, Evandro
Fonte: O Globo, 25/03/2009, O País, p. 10

Em reunião do Conselho, ministros propuseram tirar a expressão "fins pacíficos" de documento.

BRASÍLIA. Documentos do Conselho de Segurança Nacional provam que a fabricação da bomba atômica passou pelos planos da ditadura. Em 4 de outubro de 1967, o presidente Costa e Silva reuniu os ministros no Planalto para discutir a redação da Política Nacional de Energia Nuclear. A sessão foi dominada por um só debate: incluir ou não, no texto, a expressão "para fins pacíficos", que impediria o Brasil de produzir o artefato.

Enquanto o Itamaraty temia a reação das potências estrangeiras, os generais pressionavam por projeto que deixasse espaço para a construção da bomba. A palavra bomba foi mencionada quatro vezes na reunião. Tentando encerrar a polêmica, Costa e Silva arriscou solução inusitada: "Não vamos chamar de bomba, vamos chamar de artefatos que possam explodir". A ata dá a entender que os ministros fingiram não ouvir a sugestão.

Apesar de agradar à linha dura do regime, a bandeira da bomba começou a ser empunhada por um ministro civil: Macedo Soares, da Indústria e Comércio. "Eu retiraria a palavra fins pacíficos (sic). Seria o mesmo se disséssemos que a fábrica Piquete é para fins pacíficos, porque o que ela produz, nitroglicerina, é um medicamento", afirmou. "Dizer que o Brasil um dia não fabricará algum armamento com energia nuclear é ilusão".

O ministro do Exército, Lyra Tavares, fez coro: "Concordo com o ministro Macedo Soares (...). Não devemos autolimitar o uso de energia nuclear". O ministro de Minas e Energia, Costa Cavalcanti, tentou um meio-termo: "O documento é secreto, mas quem o ler poderá deduzir que o Brasil está se preparando para a bomba. Talvez o documento devesse ser mais genérico, sem especificar esse detalhe".

O sonho da bomba foi adiado por intervenção do ministro Magalhães Pinto (Relações Exteriores). Ele convenceu Costa e Silva ao lembrar que o Brasil assinou o Tratado do México: "O tratado autoriza explosões para fins pacíficos, mas a proíbe, de maneira definitiva, para fins bélicos. Tenho a impressão, senhor presidente, que vamos sofrer pressão muito maior, porque vão duvidar das intenções do Brasil".