Título: Doações por fora, doleiros e off-shores como estratégias para desviar dinheiro
Autor: Freire, Flávio; Galhardo, Ricardo
Fonte: O Globo, 26/03/2009, O País, p. 3

Empresas de fachada também seriam usadas para enviar remessas ao exterior.

SÃO PAULO. O relatório da Polícia Federal sobre a Operação Castelo de Areia afirma que os suspeitos presos ontem falam em doações para campanhas eleitorais "por dentro" e "por fora" (caixa dois). Com os doleiros presos no Rio, a PF apreendeu R$1,5 milhão. Na sede da Camargo Corrêa, em São Paulo, foram apreendidos documentos e computadores.

Em uma conversa interceptada pela PF, um diretor da construtora pede que sejam enviados R$300 mil ao PMDB do Pará. Em outra ligação, os envolvidos citam uma remessa de dinheiro em espécie para Recife. A conversa ocorreu no mesmo período em que, segundo o Tribunal de Contas da União, o consórcio Camargo Corrêa teria superfaturado em R$71,9 milhões obras para a construção da Refinaria Abreu e Lima, construída pela Petrobras em Pernambuco. "Há enorme coincidência de dados, e eles precisam ser devidamente aprofundados de imediato", disse o juiz Fausto De Sanctis ao determinar a prisão dos diretores da empreiteira.

O relatório sugere que os diretores da Camargo Corrêa presos usavam o mesmo esquema de lavagem de dinheiro utilizado por uma facção criminosa que age nos presídios paulistas. Em depoimento à Justiça Federal em 2008, Roberto Luiz Moreira, envolvido na Operação Downtown, que investiga 14 quadrilhas que lavavam dinheiro para a facção paulista, vinculou um doleiro uruguaio identificado como "Tigrão" à empreiteira.

Escritório em Saquarema movimentou R$2 milhões

Segundo a PF, o suíço naturalizado brasileiro Kurt Paul Pikel, preso ontem, intermediava o esquema entre um grupo de doleiros cariocas e diretores da Camargo Corrêa. Esse grupo usava empresas de fachada, off-shores e operações dólar-cabo - nas quais uma rede internacional de doleiros executa remessas sem que o dinheiro deixe fisicamente o país - para enviar dinheiro a paraísos fiscais, incluindo Uruguai, Ilhas Cayman e Suíça.

Nesse esquema, um doleiro no Brasil pode pedir a um cúmplice em Cayman que deposite certa quantia em determinada conta. Um recibo de depósito (swift) é enviado por fax, comprovando a transação. Depois, por meio de empresas de fachada, o dinheiro é efetivamente enviado ao doleiro de Cayman, usando um banco oficial, tendo como justificativa a compra de equipamentos.

Uma das empresas utilizadas foi o Instituto Pirâmide. O banco usado foi o Unibanco. O juiz De Sanctis enviou ofício ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) para que apure a participação de funcionários do banco. O Instituto Pirâmide, em Saquarema, no Rio, movimentou mais de R$2 milhões em um ano. No local onde deveria estar a empresa, há só um escritório de advocacia e um centro educacional. Outras empresas de fachada, como Admaster Serviços e Altercom S.A., foram utilizadas no esquema. (Ricardo Galhardo e Flavio Freire)