Título: Lula acusa brancos, de olhos azuis, por crise
Autor: Gois, Chico de; Oliveira, Eliane
Fonte: O Globo, 27/03/2009, Economia, p. 23

Em encontro com primeiro-ministro britânico, presidente diz que não conhece banqueiros negros ou índios

BRASÍLIA. Ao lado do primeiroministro britânico, Gordon Brown, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não fez cerimônia e apontou aqueles que seriam os responsáveis pelos problemas econômicos mundiais: os brancos de olhos azuis, que agiram de forma irracional. Um jornalista do grupo britânico de mídia BBC perguntou ao presidente se as declarações não continham um viés ideológico. Mas Lula manteve sua posição, argumentando que não conhecia ¿nenhum banqueiro negro¿.

¿ É uma crise causada, fomentada, por comportamentos irracionais de gente branca, de olhos azuis, que antes da crise parecia que sabia tudo e que, agora, demonstra não saber nada ¿ disse o presidente, ao lado de Brown, que tem olhos claros e ficou ligeiramente constrangido. Após a intervenção do jornalista, Lula respondeu: ¿ Não existe nenhum viés ideológico. Existe a constatação de um fato. Acompanhando os índices econômicos e de desemprego, o que percebemos é que, mais uma vez, grande parte dos pobres do mundo, que ainda não estavam sequer participando do desenvolvimento causado pela globalização, são as primeiras vítimas. Vejo o preconceito que se estabelece contra imigrantes nos países mais desenvolvidos. O presidente prosseguiu, afirmando que a origem dos problemas é a falta de regulação do sistema financeiro global, que precisa se reeducar. E defendeu uma grande reforma e normas mais rígidas para os bancos: ¿ O Brasil, há muito tempo, vem tendo responsabilidade na regulação do nosso sistema financeiro. Aqui no Brasil, um banco só pode alavancar até dez vezes seu patrimônio líquido. No caso da crise, havia bancos alavancando até 35 vezes seu patrimônio. Como não conheço nenhum banqueiro negro ou índio, eu só posso dizer que (não é possível que) essa parte da humanidade, que é a mais, eu diria, vítima do mundo, pague por uma crise. Não é possível. Lula alertou que é preciso recuperar a credibilidade do sistema. Do contrário, a classe média empobrecida poderá criar manifestações que começam como protestos políticos, depois se transformam numa grande greve e viram convulsão social. O presidente voltou a defender a atuação do Estado e criticou os ¿deuses da economia¿ que consideram o setor público um entrave. Lula também se disse favorável a uma atuação mais política dos líderes internacionais e atacou os paraísos fiscais: ¿ (É preciso) mexer nos paraísos fiscais. Não pensem que será uma luta fácil. Até porque quem tem dinheiro nos paraísos fiscais não são os pobres dos quais estou falando. São outros. Vamos ter um duro enfrentamento no G-20 para conseguirmos mexer nos paraísos fiscais. Se fosse só as Ilhas Cayman não teria problema. Mas tem países importantes, como a Suíça, que nunca foi chamado de paraíso fiscal, mas todo mundo sabe que tem muita semelhança.