Título: Aumento de capital do BID enfrenta resistência do Congresso dos EUA
Autor: Scofield Jr., Gilberto
Fonte: O Globo, 29/03/2009, Economia, p. 28

Legislativo do maior cotista do banco reclama de prejuízo da instituição.

MEDELLÍN, Colômbia. Os ministros da Fazenda dos paísesmembros do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) iniciaram a reunião anual da instituição dando como certa a aprovação do acalentado projeto de aumento do capital da instituição. A medida permitiria ampliar os empréstimos a uma região duramente afetada pela crise econômica.

Mas, a julgar pela reação do Congresso dos EUA ¿ o maior doador do BID, com 30% de suas cotas ¿, a proposta deve encontrar sérias dificuldades.

E a razão é que o BID fechou 2008 com prejuízo de US$ 22 milhões, um valor inexpressivo em comparação com o capital de US$ 100 bilhões do banco, mas, ainda assim, seu primeiro prejuízo nos últimos cinco anos (ano passado, o lucro foi de US$ 134 milhões). Este resultado ruim foi provocado, sobretudo, por um prejuízo de US$ 1,6 bilhão que o BID teve em 2008 em sua carteira de investimentos ¿ cujo valor total é de US$ 16 bilhões ¿ devido à desvalorização de títulos hipotecários.

Ainda que estes papéis tenham rendido ao banco uma receita de US$ 600 milhões com o pagamento de lucros e dividendos, reduzindo o prejuízo final a US$ 1 bilhão, estes números se transformaram na mais nova dor de cabeça do secretário do Tesouro dos EUA, Timothy Geithner, que fala hoje na reunião anual do banco em Medellín. E dos países-membros latinos que querem um BID maior. Espera-se que Geithner apoie as pretensões da cúpula do BID de ampliar as contribuições.

¿ O Congresso precisa ter certeza de que qualquer aumento de capital será usado para ajudar países latino-americanos em dificuldades, não para ajudar administradores de bancos que apostaram nos mercados financeiros ¿ disse à agência de notícias AP o senador republicano Dick Lugar, do Comitê de Relações Estrangeiras do Senado.

China usa ajuda ao banco para crescer na região O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, disse ontem que vai sugerir à presidência do BID que, enquanto o processo de aumento do capital da instituição esteja sendo estudado pelos países-membros ¿ processo que, segundo ele, pode levar anos ¿, o banco aprove medidas que permitam aumentar imediatamente o volume de dinheiro emprestado pela instituição.

Uma das fórmulas seria alterar a forma como o BID calcula o volume de dinheiro que empresta.

Hoje, esta fórmula exclui o dinheiro injetado pelos países que recebem recursos de empréstimo, ou seja, a maioria dos países latinos, contabilizando só os aportes dos países ricos ou emergentes com grandes reservas, como a China.

Edward Bartholomew, gerentegeral do Departamento de Finanças do BID, disse que o banco não pode investir em papéis de alto risco, só em ativos com grau de crédito elevado pelas agências de classificação de risco.

O que não impediu que o banco comprasse papéis lastreados por ativos e hipotecas, justamente os mais afetados pela crise. Estas aplicações representavam 60% da carteira de investimentos do BID em 2006, um ano após Luis Alberto Moreno ter assumido a Presidência do banco, agora esta fatia é de 26%, disse o próprio Moreno.

Esta será uma nova explicação que o secretário Geithner terá que dar ao Congresso americano caso aprove o aumento do capital do BID se não quiser desapontar todo um continente.

Ontem mesmo, o comitê consultivo do BID (do qual faz parte o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci) sugeriu aos membros do banco que aprovem o aumento de capital.

O ex-presidente Bill Clinton, que participa da reunião do BID para debater a crise financeira global, aproveitou a presença na Colômbia para visitar uma escola fundada pela cantora Shakira, em Barranquilla. Clinton brincou com crianças da escola ao lado de líderes políticos locais.

A reunião do BID revelou uma preocupação de representantes dos países-membros com respeito à presença chinesa na região.

O país, admitido em janeiro como membro-doador, acenou com um aporte de US$ 350 milhões para os programas do BID voltados a países de baixa renda.

Mas, a concorrência com produtos chineses está levando os governos locais a questionar se o aporte de recursos compensa, ao fim e ao cabo, uma nova ¿ameaça chinesa¿.