Título: A nova ordem financeira mundial
Autor: Duarte, Fernando
Fonte: O Globo, 03/04/2009, Economia, p. 19

Documento do encontro faz cerco a paraísos fiscais e diz que "era do segredo bancário acabou".

Por mais que haja diferença entre o escrito e o feito, a reunião de cúpula dos líderes do G-20 lançou ontem em Londres os alicerces de uma nova arquitetura para o sistema financeiro mundial, cujo destaque foi a confirmação do aporte de recursos da ordem de US$1,1 trilhão para o Fundo Monetário Internacional (FMI) - antecipado na véspera para a imprensa brasileira pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. Com a afirmação no documento final de que "a era do segredo bancário acabou", os países também concordaram em apertar o cerco sobre os paraísos fiscais e decidiram submeter, pela primeira vez, os hedge funds (fundos altamente especulativos) a uma rígida regulação.

A ação mais rigorosa contra os paraísos fiscais inclui a publicação imediata de uma lista de países que se recusam a aceitar novas regras contra o sigilo financeiro, com direito a possíveis sanções. De acordo com a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que será responsável pela lista "suja", Uruguai, Costa Rica, Filipinas e Malásia recusaram-se a aderir às normas. Este ponto representa uma vitória para a agenda trazida à mesa de negociações pelo presidente francês, Nicolas Sarkozy, que durante a semana até ameaçara abandonar as discussões.

Os líderes também concordaram em criar um novo órgão, o Conselho de Estabilidade Financeira, que servirá como uma espécie de sistema de alerta para novas crises, ao lado do próprio FMI. Além disso, assumiram o compromisso de uma injeção total de US$5 trilhões na economia mundial até o final de 2010 como parte dos esforços de combate à crise e que deverá resultar num crescimento global maior que a estimativa de 2% para o ano que vem, feita anteriormente pelo próprio fundo. A cifra inclui programas de estímulo já anunciados.

- Hoje (ontem) é o dia em que o mundo agiu junto para lutar contra a recessão global usando não apenas palavras, mas um plano de recuperação e reformas com um prazos definidos. É claro que nossas decisões não solucionarão a crise de forma imediata, mas deram início ao processo de solução - disse o premier britânico, Gordon Brown.

Lula: emergentes em igualdade

Brown disse ainda que o encontro do G-20 decretou o fim da prevalência do Consenso de Washington - como ficou conhecida a cartilha recomendada nos anos 1990 por instituições sediadas na capital americana, como o FMI, a países em desenvolvimento que enfrentavam dificuldades. Para o premier, há agora uma nova era de cooperação internacional progressiva:

- Na era global, a prosperidade tem de ser indivisível e o crescimento tem de ser compartilhado. O Consenso de Washington está superado.

Numa entrevista na Embaixada Brasileira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva também não economizou pompa ao avaliar o encontro:

- Fizemos hoje uma reunião importante para a história do mundo. Foi a primeira vez que vi os países emergentes e desenvolvidos em igualdade de condições.

Para Sarkozy, uma página da história foi virada:

- O mundo há muito tempo vive no sistema financeiro anglo-saxão. Sei que ele tem suas vantagens, mas hoje (ontem) viramos uma página na história.