Título: SNI vigiava ligações de Brizola no exterior
Autor: Franco, Bernardo Mello
Fonte: O Globo, 31/03/2009, O País, p. 5

Para militares, ex-governador era instrumento de conspiração destinada a implantar regime de esquerda radical no Brasil

BRASÍLIA. O fantasma do comunismo internacional assombrou os arapongas do Serviço Nacional de Informações (SNI) que vigiaram o primeiro governo de Leonel Brizola no Rio. Os arquivos secretos sobre a gestão pedetista mostram que os militares temiam a aproximação entre o fundador do PDT e a Internacional Socialista, que reúne partidos de esquerda do mundo.

A máquina de espionagem monitorou as relações do ex-governador com grupos que participaram da luta armada contra outras ditaduras no continente, como os montoneros argentinos e os tupamaros uruguaios.

Para os generais da linha dura que chefiavam o SNI, Brizola seria o instrumento de uma conspiração internacional destinada a implantar um regime de esquerda radical no país. Usado para justificar o golpe que derrubou o ex-presidente João Goulart em 1964, o argumento se repete em relatórios produzidos na década de 80, no apagar das luzes da ditadura brasileira.

Os arapongas insinuaram que Brizola teria criado o PDT como mera forma de chegar ao Palácio do Planalto e implantar um modelo de partido único. ¿A clareza e a objetividade com que o governador Leonel Brizola lidera no país a ideologia socialista evidencia um curto prazo para a sobrevivência do PDT, o que representa um passo para a mudança do regime brasileiro¿, diz um dossiê de 1984.

Em março do ano anterior, dias antes da posse de Brizola, agentes secretos acompanharam um seminário que reuniu socialistas de diversos países no Rio. ¿O evento nada mais foi do que um pretexto para que personalidades estrangeiras participassem, sem melindrar o governo federal, da posse do governador Brizola¿, registrou o SNI. Em agosto, uma reunião com esquerdistas da América Latina e do Caribe foi alvo de atenção.

A vigilância contou com a colaboração de militares de outros estados. Em novembro de 1985, oficiais da 8aBrigada de Infantaria de Pelotas (RS) avisaram o Centro de Informações do Exército que os tupamaros mandariam representantes para ¿frequentar cursos de capacitação política, trocar experiências e corrigir erros cometidos durante as operações subversivas¿. Sem provas, os arapongas acusaram Brizola de financiar a visita com verbas oficiais: ¿Tais pessoas saem do Uruguai e entram no Brasil com vistos de turista, permanecendo no Rio durante 90 dias com empregos fornecidos pelo governo do estado¿. Na opinião de parlamentares, os informes do SNI acusando Brizola de montar na década de 80 um caixa dois com dinheiro de empresas de ônibus e do jogo do bicho não são provas de que, de fato, esses episódios ocorreram. Para o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ), que disputou o governo do Rio contra Brizola em 82, e anos depois aliouse a ele, o conteúdo dos documentos não é verdadeiro.

¿ Acusações feitas por serviços de repressão só merecem repulsa. Não dou crédito a acusações que não tiveram consequência formal. Eles (militares) eram detentores do poder e, se tinham conhecimento de irregularidade ou corrupção, tinham obrigação de formalizar inquéritos e processos.

O deputado Fernando Gabeira (PV-RJ) disse que a informação de que a violência aumentou no governo Brizola porque ele afrouxou o combate coincide com a de outros setores.

¿ O relatório do SNI sobre a propina, sem evidência, é muito difícil de considerar como verdadeiro. Em relação à denúncia de escalada da violência, o SNI faz uma análise que coincide com a análise que as pessoas fizeram nos últimos anos. Denúncias que podem ter sido extraídas de leitura de jornais ¿ disse Gabeira.

COLABOROU: Evandro Éboli