Título: Crédito escasso atrasa recuperação
Autor: Duarte, Patrícia; Rodrigues, Eduardo
Fonte: O Globo, 06/04/2009, Economia, p. 14

Alguns fornecedores de matéria-prima ainda estão sem fôlego.

BRASÍLIA. Para os mais céticos, a economia só vai desafogar no segundo semestre. Enxergam que a queda abrupta da produção industrial nos últimos meses - 17% só em fevereiro, recuando a quantidade produzida aos níveis de 2004 - ainda vai contaminar outras áreas, como o varejo. E o crédito, apesar da recuperação, ainda está longe dos patamares de antes da crise. Sem contar a dificuldade que pequenas e médias empresas enfrentam para se financiar.

Para o professor da Unicamp e consultor do Iedi Júlio Gomes de Almeida, o mercado de crédito ainda é um problema. A recuperação está sendo sustentada pelos recursos públicos (direcionados), mostrando que os bancos privados ainda relutam em emprestar.

- Não há recuperação digna do nome. Alguns setores pararam de cair e, aos poucos, acomodam-se em um nível mais baixo - afirma.

Segundo o Banco Central (BC), entre janeiro e fevereiro, o saldo dos empréstimos com recursos livres recuou 0,3%, enquanto o de direcionados cresceu 1,6%. Dentro do governo, porém, a recuperação do crédito é vista como um fator positivo, inclusive com os juros em queda e a expectativa de que continuem neste rumo. As projeções gerais são que o BC vai continuar cortando a Selic, a taxa básica de juros, hoje em 11,25% ao ano. Desanimam os prazos dos financiamentos, que recuaram após o agravamento da crise, em setembro, e ainda não deram sinais de melhora.

No mercado, especialistas estão pessimistas e acreditam numa reação mais tardia. O economista-chefe da corretora Concórdia, Elson Teles, diz que a ação do governo é a saída de curto prazo, com mais investimentos. Mas este é um esforço só para evitar que a economia fique menor este ano. Expansão só em 2010:

- Estamos prevendo 3% de crescimento (em 2010).

Na linha de frente da equipe econômica, porém, há quem acredite que o Brasil poderá chegar ao fim do ano já crescendo a um ritmo de 4%. No mercado, a expectativa é de apenas 2%.

Setores fornecedores de matéria-prima ainda estão sem fôlego. O coordenador de Economia da Associação Brasileira do Alumínio (Abal), Claudio Chaves, diz que a crise praticamente fez parar a produção no último trimestre do ano passado:

- Prevemos uma queda de 5,6% este ano.

A presidente da Associação Brasileira de Celulose e Papel (Bracelpa), Elizabeth Carvalhaes, explica que a produção de papel-cartão - largamente usado em embalagens e um importante termômetro de atividade - despencou quase 25% no início do ano.

O emprego, apesar dos sinais tímidos de retomada em fevereiro, é fonte de preocupação. O diretor-técnico do Dieese, Clemente Ganz Lúcio, calcula que, para absorver a mão de obra que entra no mercado todo o ano, a economia teria de crescer, pelo menos, 3%:

- Se isso não acontecer, a taxa de desemprego vai subir e afetar a produção, já que o consumo vai diminuir - disse. (Patrícia Duarte e Eduardo Rodrigues)