Título: Saindo do fundo do poço
Autor: Duarte, Patrícia; Rodrigues, Eduardo
Fonte: O Globo, 06/04/2009, Economia, p. 14

Parte das empresas e governo vê reação no 2º trimestre, outros só no 2º semestre.

Os próximos três meses serão decisivos para a economia brasileira. Diante de diversos sinais de retomada de fôlego - embora todos ainda abaixo do excelente ano de 2008 - boa parte do governo e do setor produtivo acredita que a atividade dará sinais ainda mais claros de recuperação entre abril e junho, deixando o pior da turbulência para trás e evitando a estagnação em 2009. O trabalho, porém, não será fácil, o que leva muitos agentes a acreditar que a recuperação definitiva virá apenas no segundo semestre, já que ainda existem obstáculos importantes puxando a atividade para baixo. Em comum, essas correntes têm a convicção de que é possível ao Brasil fechar o ano crescendo 2%, impulsionado pelos estímulos do governo.

- O segundo trimestre vai marcar o tom do que vai acontecer neste ano. Já há alguma recomposição, como no crédito, mas as dificuldades permanecem grandes - afirmou o gerente-executivo de Política Econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castelo Branco, referindo-se, por exemplo, à confiança do empresariado ainda em níveis baixos, aos 47,4 pontos em janeiro, o menor em dez anos.

A expectativa dele é de que haja recuperação "muito pequena" neste mês, o que pode antecipar o retorno dos investimentos, que têm sido adiados, e não cancelados. Esse adiamento é um dos principais argumentos dos mais otimistas, como o governo federal, para acreditar na retomada da economia. Desde a divulgação de que a economia havia parado bruscamente no fim de 2008, na Esplanada dos Ministérios e no Palácio do Planalto há um discurso único de que abril marca o início do fim da crise no Brasil.

O primeiro setor citado para sustentar o discurso é o automobilístico. Carregado pela mão do governo, que isentou por seis meses o IPI de carros populares, foi um dos primeiros a reagir e registrou este ano seu melhor primeiro trimestre da história do setor. Somente em março foram vendidas 271,3 mil unidades, alta de 36,1% frente a fevereiro. O presidente da federação dos distribuidores (Fenabrave), Sérgio Reze, disse que os estoques se normalizaram no período. As encomendas devem voltar agora, garantindo a expansão das montadoras:

- Para a economia como um todo, a crise não acabou e nem está perto do fim. Mas não existe mais aquela visão de que o mundo vai acabar.

Para o comércio varejista, a sensação é também de que o pior pode já ter passado. O economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas, diz que os lojistas devem refazer seus estoques, após as liquidações estendidas até março, que os ajudaram a levantar capital de giro diante da falta de crédito. Mesmo assim, o crescimento de 9% em 2008 ficará entre 2% e 3,5% este ano.

Um dos segmentos mais otimistas é o de supermercados. O presidente da associação do setor (Abras), Sussumo Honda, estima alta de 2,5% do faturamento, que se expandiu 9% em 2008. Os alimentos são gêneros essenciais - cujas marcas podem ser trocadas para evitar corte - e pouco dependentes do crédito.

- Todo mundo precisa comer.

Na indústria elétrica e eletrônica, a queda de vendas do início do ano foi estancada. De acordo com Humberto Barbato, presidente da Abinee (entidade que representa o setor), no mês passado 55% das empresas disseram que as encomendas estavam menores do que um ano antes. Em fevereiro, o percentual era de 70%.

- A recuperação está vindo, mas ela só vai se firmar mesmo quando a confiança do consumidor melhorar. Para quem fabrica bens duráveis, isso é vital - afirmou ele.

Importação de máquinas cresceu

Embalado pelas boas perspectivas para o setor da construção civil, com o pacote do governo de R$34 bilhões, o presidente do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), Paulo Camillo Penna, está otimista porque o abalo global não afetou o consumo das construtoras em areia, saibro e brita. Além do mercado interno aquecido, as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) ajudaram a manter as vendas. E já há sinais de recuperação das exportações:

- É um quadro adverso, mas parou de piorar. Em março, o volume vendido ao exterior superou as 22 milhões de toneladas, próximo ao patamar negociado nos meses que antecederam a crise - disse Penna, lembrando que ainda é cedo para prever o resultado de 2009, pois o comércio exterior é muito volátil.

De forma geral, a balança comercial ainda não deu mostras de reação. Mas há luz no fim do túnel. Em março, a média diária de exportações foi de US$536,8 milhões contra US$532,6 milhões do mês anterior. Além disso, no mês passado, as importações de máquinas e equipamentos (indicadores de investimentos) cresceram 2,5% sobre um ano antes.