Título: Pode levar a família Pode voar ao exterior Pode juntar créditos
Autor: Braga, Isabel; Vasconcelos, Adriana
Fonte: O Globo, 17/04/2009, O País, p. 3

Câmara e Senado anunciam medidas sobre uso de passagens aéreas, mas mantêm diversos privilégios.

Numa ação combinada, as Mesas Diretoras da Câmara e do Senado atenderam ontem a parte da recomendação do Ministério Público do Distrito Federal, aprovando uma redução de 20% e 25%, respectivamente, no valor mensal das cotas de passagens aéreas a que deputados e senadores têm direito. Mas, em vez de deixar claro que só quem tem direito a viajar às custas do erário é o parlamentar, como sugeriu o Ministério Público, as duas Casas acabaram legalizando a norma que permite que cônjuges, dependentes e assessores tenham passagens pagas pelos cofres públicos, inclusive ao exterior.

A nota da Procuradoria da República do Distrito Federal, que investiga abusos com passagens, é clara: ¿A utilização da cota de transporte aéreo só é legítima quando vinculada diretamente ao exercício do mandato eletivo. Embora não haja vedação expressa no ato normativo da Câmara à utilização da cota para emissão de passagens em nome de terceiros e para destinos diversos do estado de origem, a prática é ilegal¿.

A Câmara decidiu o contrário.

¿ O Inocêncio (Oliveira) entendeu que levar a família na cota de suas passagens da Câmara não é proibido. E a Mesa acabou ratificando a posição dele. Vai explicitar isso na normatização ¿ contou, após a reunião da Mesa, o 3osecretário, Odair Cunha (PT-MG).

No Senado, o corte de 25% vai gerar economia anual de R$ 3,75 milhões.

E, na Câmara, a expectativa é de uma redução de despesas da ordem de R$ 15,6 milhões, num gasto total de R$ 78 milhões registrado em 2008. Mas as decisões de ontem têm medidas bem generosas. Os senadores, por exemplo, perderam dois bilhetes mensais a que tinham direito para o Rio, mas passaram a ter cinco passagens aéreas mensais entre Brasília e seus respectivos estados ¿ eram quatro. Em contrapartida, integrantes da Mesa e líderes partidários no Senado ficaram sem a cota extra de duas passagens mensais, o que não foi aprovado na Câmara.

Embora o texto não inclua entre esses possíveis beneficiários eventuais namoradas ou namorados de parlamentares ¿ como fez o deputado Fábio Faria (PMN-RN) com a então namorada Adriane Galisteu ¿ o 1osecretário, senador Heráclito Fortes (DEM-PI), confirmou essa possibilidade em tom de brincadeira: ¿ Se for bonita (a namorada), pode.

Da forma anunciada, e por declarações dos integrantes da Mesa, não ficou claro se a nova regra vedará o uso da cota para viagens do parlamentar com a família em férias.

¿ Ficou confuso. Acho que vai ficar explicitado que não pode ¿ disse Inocêncio Oliveira.

¿ Viagem internacional, se for a trabalho, pode levar a mulher. Mas a passeio, não, só com milhas ¿ ponderou, sem muita certeza, o 4osecretário, Nelson Marquezelli (PTB-SP).

¿ Férias não são atividade parlamentar.

O controle continua sendo do deputado ¿ disse Odair Cunha.

O próprio presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), tergiversou quando indagado se as novas regras impediriam o uso da cota para viajar com a família a turismo: ¿ A resposta imediata é o corte de 20%. Mais para a frente vamos estudar o restante com lupa.

Heráclito Fortes confirmou que os parlamentares continuam autorizados a usar parte da cota para viagens ao exterior e até para fretar aeronaves ou barcos, desde que dentro de seu estado. Pelo menos cinco senadores admitiram este mês terem usado sua cota para fretar aviões, entre eles Heráclito.

¿ Os critérios do uso da cota dependem de cada senador. Nosso objetivo foi o de evitar desvios. Mas quem cometer irregularidades pode ser punido pelo Conselho de Ética ¿ reagiu Heráclito.