Título: Credor do FMI
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Fonte: O Globo, 19/04/2009, Opinião, p. 6

A crise financeira internacional atingiu todas as economias do mundo, mas esse impacto negativo foi maior nos Estados Unidos, na Europa e no Japão. Com exceção do Leste da Europa, da Turquia e do México (mais dependentes das nações ricas abaladas pela crise), as chamadas economias emergentes vêm apresentando um desempenho que supera expectativas pessimistas, mantendo-se acima da média mundial. Não houve um descolamento, mas também não há catástrofes. Pela perspectiva do Século XX, é uma situação surpreendente, pois tais economias eram as que se mostravam mais vulneráveis diante de qualquer crise financeira de origem externa. No entanto, mudanças estruturais e ajustes conjunturais ocorridos nessas economias alteraram o quadro.

O Brasil, por exemplo, depois de passar por situações muito difíceis, acabou sendo obrigado a poupar mais internamente - em especial devido a um ajuste nas contas públicas -, e em consequência se tornou menos dependente de financiamentos em moeda estrangeira. O agravamento da crise internacional não apanhou desta vez a economia brasileira no contrapé. O Banco Central já acumulara mais de US$200 bilhões em reservas cambiais, de forma que a dívida externa líquida foi anulada após março de 2008. A redução da vulnerabilidade externa fez com que a economia brasileira galgasse alguns degraus na escala das agências classificadoras de risco, a ponto de conquistar o status de grau de investimento.

Esse processo de recuperação contribuiu para que o Brasil atraísse mais investimentos diretos de capitais estrangeiros, que se tornaram, assim, a principal fonte de financiamento do balanço de pagamentos, mais saudável do que os empréstimos convencionais. O agravamento da crise financeira fez com que o ritmo de atividade econômica no Brasil tivesse uma queda brusca, com reflexos nas importações e nas remessas de divisas para o exterior.

Com esse novo ajuste, é ainda mais improvável que a economia brasileira precise recorrer a auxílios de instituições internacionais. Ao contrário, o FMI até consultou as autoridades econômicas brasileiras sobre a possibilidade de uma pequena parte das nossas reservas vir a compor o programa de assistência a economias emergentes que estão vulneráveis - estima-se uma contribuição inicial de até US$4,5 bilhões. Se esse aporte ao FMI se confirmar, o Brasil, que foi um dos maiores devedores do Fundo, em poucos anos terá se transformado em um país credor da instituição. Fato histórico, que se deve ao bom senso de Lula ao seguir certos princípios de política econômica no primeiro mandato.