Título: Líderes também na farra das passagens
Autor: Vasconcelos, Adriana
Fonte: O Globo, 20/04/2009, O País, p. 3

Rodrigo Maia e Ciro Gomes usaram cota para turismo no exterior; PSOL deu bilhete a Protógenes

BRASÍLIA. Os líderes dos partidos na Câmara, de governo e de oposição, entraram na farra do uso da cota de passagens aéreas pagas com dinheiro público. Dos 23 comandantes de partidos na Casa, 11 usaram a cota em 82 viagens internacionais nos últimos dois anos, e pelo menos oito deles emitiram bilhetes ao exterior para parentes. A cota dos líderes é acrescida de 25% do valor da maior verba disponível na Casa para este fim, a dos parlamentares de Roraima (cerca de R$14 mil mensais). Levantamento do site Congresso em Foco sobre a emissão de passagens internacionais em viagens de turismo por parlamentares mostra que os maiores beneficiários, em 2007 e 2008, foram os líderes do PP, Mário Negromonte (BA), com 23 viagens; do PPS, Fernando Coruja (SC), com 19; e do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN), com 13.

- O procedimento é legal. Se não fosse, a Câmara não teria autorizado - afirmou Negromonte ao GLOBO. - Temos uma cota e eu fiz economia. Minha secretária faz pesquisa, viajei em muito horário inconveniente. Estou pedindo à Mesa uma pesquisa sobre os Parlamentos do G-20, para comparar as condições de trabalho. Porque falam que é subsídio a deputado. Não é, é para pagar ligação, às vezes socorrer uma pessoa desesperada que precisa de deslocamento para uma cirurgia.

Procurado, o líder do PMDB não retornou as ligações. Já Coruja divulgou nota reconhecendo que emitiu bilhetes para uso de "familiares e terceiros, entre estes assessores parlamentares, do PPS, palestrantes de eventos e jornalistas", e disse que os valores não utilizados ao longo do ano geram créditos. Mas salientou: "Em função do debate sobre a questão ética que está acontecendo na sociedade brasileira, o líder do PPS entende que essa situação deve ser mudada, e defende que se estabeleçam critérios mais restritivos para a utilização não só de passagens, mas de outras prerrogativas do setor público em geral".

Presidentes de partidos da base governista e da oposição também fizeram uso do expediente, segundo o jornal "Folha de S.Paulo" de ontem. São os casos dos dirigentes do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP), e do DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ). No primeiro caso, a reportagem cita a emissão de um bilhete para Buenos Aires para a filha do parlamentar, Natasja Berzoini, em dezembro de 2007. O petista não retornou as ligações.

Já Rodrigo Maia confirmou que emitiu, com sua cota, bilhetes para a mulher e a filha o acompanharem a Nova York, em julho de 2008, e apenas para a mulher, a Paris, em agosto de 2007. Ele disse que em ambos os casos estava em viagem oficial, "embora, se fosse turismo, as regras atuais também permitissem o uso". Maia afirma que a polêmica em torno da prática legal reflete uma mudança de cultura e, por isso, devem ser aprofundadas as discussões para aperfeiçoar o sistema:

- A questão do acompanhante pode ser discutida. Temos que refletir sobre procedimentos que estão suscitando dúvidas. Sou a favor de que se acabem com penduricalhos e se estabeleçam regras bastante claras, aumentando a transparência e a responsabilização do parlamentar.

Ex-candidato à Presidência, Ciro Gomes (PSB-CE) também teria emitido duas passagens para Nova York - em dezembro de 2007 e em abril de 2008. Uma delas seria em nome de Maria José Gomes. A mãe de Ciro se chama Maria José. Procurado, o deputado não retornou as ligações.

O deputado fluminense Chico Alencar, do PSOL - cujo líder, Ivan Valente, também emitiu bilhete para viagem dele e da mulher, Vera Valente, a Paris, em dezembro de 2007 - disse que a prática sob tiroteio é fruto do pensamento, consolidado ao longo das legislaturas, de que "a cota de passagem é do parlamentar, que a usa a seu exclusivo juízo". O PSOL, informou, vai propor mudanças, como o fim da geração de créditos, o detalhamento das viagens na internet e a negociação institucional da Câmara com as companhias aéreas.

Outro que usou passagens aéreas pagas pela Câmara foi o delegado Protógenes Queiroz. Ele usou a cota de passagens da deputada Luciana Genro (PSOL-RS) para participar de ato do partido contra a corrupção e dar palestra a estudantes, no Rio Grande do Sul, no fim do ano passado. Luciana confirmou que seu gabinete emitiu dois bilhetes para o delegado porque os atos eram relacionados ao combate à corrupção.

- O delegado usou, usará e considero um uso dos mais justos e legítimos da minha cota de passagem porque foi na luta contra a corrupção. É a mesma bandeira do PSOL e do delegado Protógenes - disse Luciana.