Título: Crise afugenta cliente de crédito
Autor: Simão, Edna
Fonte: Correio Braziliense, 22/03/2009, Economia, p. 23

Medo do endividamento reduz a procura por empréstimo. Em fevereiro, até a concessão do desconto em folha caiu, recuando 20%

Claydson Ericson tem quatro empréstimos com desconto em folha O pânico instaurado pela crise econômica mundial deixou não só os bancos brasileiros mais seletivos na hora de liberar empréstimos, mas também os clientes temerosos em se endividar mais. Essa composição teve um impacto imediato nas operações de crédito, que despencaram. Até mesmo a modalidade como o crédito consignado, cujo risco de calote é praticamente zero, sofreu com o desaparecimento do dinheiro no mercado. Dados da Associação Brasileira de Bancos (ABBC) mostram que a concessão de empréstimo com desconto em folha recuou 20% de janeiro para fevereiro. Mas já há sinais de recuperação.

A ligeira retomada em março, segundo o presidente do ABBC, Renato Oliva, está sendo puxada pela queda dos juros, que estimula os clientes bancários a renegociarem dívidas contraídas no ano passado por um custo bem maior. O problema, no entanto, é que a vontade de trocar dívida cara por mais barata esbarra na restrição do crédito pelos bancos. As pequenas e médias instituições financeiras só estão efetuando empréstimo consignado quando têm a certeza de que as operações serão compradas por maiores. Esse cenário limita a capacidade de crescimento das transações. Desde o ano passado, esses bancos enfrentam dificuldades de captar recursos em curto prazo para realizar empréstimos de longo. ¿Os bancos estão mais seletivos e aumentam a carteira apenas se tiverem certeza de que ela será adquirida por uma grande instituição. Quem não faz acordo diminui a quantidade de operações¿, afirmou o analista de bancos da Austin Rating, Luís Miguel Santacreu. A escassez do crédito inibe tanto as transações para servidores públicos e aposentados como também para os trabalhadores da iniciativa privada.

O Banco Cruzeiro do Sul, que trabalha apenas com aposentados e servidores públicos, por exemplo, intensificou os contratos com grandes instituições para a venda de carteira e, assim, garantir recursos para continuar oferecendo crédito. Por mês, o Cruzeiro do Sul tem contrato de cessão de crédito (venda de direito) de R$ 150 milhões por mês. No último trimestre do ano passado, esse tipo de linha totalizou R$ 1,5 bilhão. No período, as operações de crédito somaram apenas R$ 250 milhões.

Antes da crise, esse valor variava entre R$ 700 milhões e R$ 900 milhões. ¿Acho que no fim do primeiro trimestre aumentaremos em 75% a produção de crédito. As operações vão começar a voltar com a queda dos juros¿, disse o diretor-executivo do Banco Cruzeiro do Sul, Luis Octavio Indio da Costa. Para o superintendente de projetos especiais da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Jorge Higashino, as instituições financeiras não estão reduzindo as operações com crédito consignado. Segundo ele, o cliente bancário está temeroso em contrair dívidas e, portanto, a demanda por empréstimo caiu.

O servidor público Claydson Ericson, por enquanto, não está sentindo a retração do crédito por conta da crise. Obedecendo o limite de 30% da margem consignável, tem quatro empréstimos com desconto em folha. O medo do descontrole é grande. ¿É um crédito atrativo mas as taxas de juros deveriam ser menores porque o risco da operação é praticamente zero. Por enquanto, não vejo restrição de crédito. Não sei se a `marolinha¿ está afetando tanto assim o crédito¿, afirmou Ericson, que agradece a Deus por não ter entrado nenhuma vez no cheque especial neste ano.