Título: Por dentro e por fora
Autor: Vaz, Lúcio
Fonte: Correio Braziliense, 27/03/2009, Política, p. 2

Em conversas gravadas pela Polícia Federal, diretores da Camargo Corrêa dão a entender que parte dos repasses de recursos a partidos políticos era feita por caixa 2. Lista com supostos favorecidos é investigada.

São Paulo ¿ Diretores da empreiteira Camargo Corrêa sugerem, em conversas gravadas pela Polícia Federal, que parte das doações feitas a partidos políticos foi legal e outro montante por caixa 2. Ao combinar ou informar a remessa de recursos para partidos políticos ou diretamente para candidatos, os diretores ressaltam: ¿Essa é por dentro, essa é por fora¿. Nas conversas, eles citam nomes de políticos e as quantias destinadas, informou ontem a procuradora da República Karen Louise Kahn. A Polícia Federal investiga uma lista com o nome dos favorecidos.

Na decisão sobre o pedido de prisão dos diretores da empresa, o juiz federal Fausto de Sanctis afirma que a operação da PF apurou, ¿em tese, alguns diálogos que envolveriam supostas doações não declaradas para políticos e partidos políticos, eventualmente efetivadas pelo grupo Camargo Corrêa¿. Ele cita que representantes da empresa teriam entrado em contato com a Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) para a ¿suposta distribuição de valores a políticos ou partidos¿. Segundo a decisão do juiz, constaria distribuição de dinheiro a diversos partidos, como PPS, PSB, PDT, DEM e PP, ¿fato que estaria listado em algum documento ou mídia eletrônica¿. Os diretores Pietro Bianchi e Dárcio Brunato teriam uma relação das supostas doações. Numa das conversas, o diretor Fernando Gomes fala da destinação de R$ 300 mil ao PMDB do Pará.

Policiais e procuradores vão fazer agora um cruzamento de dados obtidos nos diálogos gravados com transferências de recursos e até com registros dos tribunais eleitorais, que informam as doações feitas de forma legal. A procuradora informou que parte dos diálogos sobre repassasses de dinheiro a políticos e partidos ocorreu durante o período eleitoral do ano passado. Ressaltou, porém, que não foram gravadas conversas com políticos. ¿Os políticos são mencionados, são terceiros. Não se pode dizer que eles receberam dinheiro irregularmente.¿ Informada de que alguns partidos apresentaram recibos de doações da empreiteira, comentou: ¿Se eles têm recibo, está perfeito, bom para eles. Estão juntas as duas pontas¿.

Sobre a declaração do presidente do PPS, Roberto Freire, que promete recorrer à Justiça contra a divulgação do nome do partido na Operação Castelo de Areia, a procuradora afirmou: ¿Não existe uma investigação contra o PPS. O partido foi mencionado, e desse fato não se pode fugir. Está mencionado por um dos integrantes da organização criminosa. A atitude (de Freire) é afoita e precipitada. Quem não deve não teme¿.

Indícios Karen Kahn informou que ninguém foi indiciado e, até agora, existem apenas indícios. ¿Fizemos uma operação de busca e apreensão para buscar provas. O objetivo era investigar lavagem de dinheiro, ocultamento de dinheiro cuja origem não podia ser declarada.¿ Ela também deixou claro que ainda não existem provas definitivas sobre superfaturamento de obras: ¿Dizer que as obras são superfaturadas seria leviano. Mas temos informações do Tribunal de Contas da União e do Ministério Público de outros estados que indicam a prática desse tipo de ilícito pela empresa. Teria havido favorecimento da empresa em licitações com a participação de políticos locais¿. O TCU apontou, em 2008, superfaturamento de R$ 72 milhões nas obras da Refinaria do Nordeste, tocada pela Petrobrás em Pernambuco.

A Polícia Federal e o Ministério Público não têm mais dúvidas sobre o poder de articulação, a estrutura e o poder de fogo do grupo. Essas conclusões teriam levado ao pedido de prisão dos líderes da organização. ¿O que mais chama a atenção é a forma articulada, sofisticada com que se comunicavam, o que demonstra o temor de serem descobertos. Eles usavam telefones criptografados, com a utilização de códigos, senhas.¿ Ela explicou que dados foram decifrados porque os diálogos são rastreados durante muito tempo. Toda a investigação durou um ano e dois meses.