Título: Vestibular em baixa
Autor: Oliveto, Paloma
Fonte: Correio Braziliense, 31/03/2009, Brasil, p. 10

Levantamento do Correio mostra que maior parte das universidades públicas já adotam forma de seleção diferente da tradicional prova. Proposta de mudanças do MEC será encaminhada hoje aos reitores

A preocupação do Ministério da Educação (MEC) em acabar com o modelo do vestibular tradicional não é novidade para as 89 instituições de ensino superior públicas brasileiras, sem contar os centros de ensino tecnológico. Levantamento do Correio mostra que somente 27 ainda utilizam a prova como única forma de seleção. As demais adotam também modelos inspirados no Programa de Avaliação Seriada (PAS) da Universidade de Brasília e as notas obtidas pelos estudantes no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Entre as 55 universidades federais, 19 adotam apenas o vestibular, sendo que duas delas estudam a adesão à avaliação seriada.

¿No geral, os reitores mostram interesse de analisar essas formas mais consistentes de exames, pois o vestibular tradicional tem limites¿, constata o reitor da Universidade de Brasília, José Geraldo de Sousa Jr. Mas, para ele, os diferentes tipos de prova se complementam, e uma não precisa eliminar a outra. ¿São formas complementares. O PAS pressupõe alunos em condição de permanência no ensino médio, e muita gente já tem idades diferentes, precisando, então, fazer o vestibular¿, lembra. O modelo de Brasília já foi exportado para todas as regiões do país. A instituição mais recente a aderir ao programa foi a Universidade de São Paulo (USP), que adota também o tradicional vestibular da Fuvest.

O importante, ressalta José Geraldo, é que tanto a prova tradicional quanto as avaliações seriadas levem em conta fatores como competências e habilidades individuais. ¿Na UnB, a produção dos dois modelos de prova (PAS e vestibular) respondem aos mesmos pressupostos que o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) pretende. Não nos preocupamos só com o conteúdo, mas com a estrutura.¿ O reitor espera que, em breve, a universidade possa se pronunciar sobre o projeto do MEC, que deve ser oficializado hoje à Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes).

Para o senador Cristovam Buarque (PDT-DF), ministro da Educação no primeiro ano de governo Lula, a proposta do MEC vai colocar em risco a pluralidade de opções de ingresso no ensino superior. Ele teme principalmente o fim do PAS. ¿Uma das grandes vantagens do PAS é que o estudante tem três chances diferentes. Além disso, passa a estudar todo o ensino médio, não fica estudando só para uma prova¿, sustenta o senador. O programa consiste na avaliação do aluno ao fim de cada uma das três etapas do ensino médio.

Para Cristovam, caso o projeto do MEC seja aceito, o PAS terá de ser extinto. ¿É um programa de 12 anos, que já provou que funciona, que provoca efeitos no ensino médio. Simplesmente vão matar uma bela experiência da UnB¿, lamenta. Já José Geraldo, reitor da universidade, diz que é preciso conhecer melhor a proposta antes de decretar o fim da avaliação seriada.

O documento do ministério deveria ter sido entregue ontem à Andifes, mas ajustes na redação do texto adiaram o envio para hoje. Nele, será detalhada a conversa que o ministro Fernando Haddad teve, na semana passada, com o presidente da associação, Amaro Lins.

Haddad, que em diversas ocasiões demonstrou discordar do modelo do vestibular, apresentou verbalmente a ideia do exame que, segundo o ministro, pretende combinar os pontos positivos da prova atual e do Enem. De acordo com ele, uma mudança na forma de ingresso às universidades terá reflexos no currículo do ensino médio. ¿Hoje, é muito traumática a passagem da educação básica para a educação superior. Se não revermos essa transição, não alcançaremos o padrão de qualidade que queremos¿, sustenta.

O modelo da prova terá de ser discutido com os reitores ¿ como as universidades são autônomas, o projeto do MEC não pode ser imposto. Mas já se sabe que serão quatro provas, cada qual de uma área do conhecimento, com uma redação. Segundo

Haddad, o conteúdo cobrado pelo vestibular será mantido, acrescido da forma como são feitas as questões do Enem, que privilegiam mais o raciocínio e a aprendizagem, no lugar da memorização. Ainda assim, os testes seriam objetivos. O presidente do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Reynaldo Fernandes, afirma que as questões serão tiradas do banco de provas do MEC, mas não descarta a participação das federais na elaboração do teste.

Unificação Autor de um projeto de lei que acaba com o vestibular e institui a avaliação seriada nas universidades públicas, Cristovam Buarque não vê novidades no modelo proposto pelo ministério. ¿É basicamente a mesma coisa que o vestibular. Só que com a vantagem de ser unificado. Mas no fundo, continua o mesmo trauma no estudante: ou entra ou não entra. E no PAS não é assim¿, defende. Ele afirma que o projeto, que foi aprovado em caráter conclusivo na Comissão de Educação do Senado e está na Câmara, não fere a autonomia universitária. ¿A autonomia é administrativa. Mas toda universidade precisa seguir a lei.¿

Os demais projetos que tramitavam no Congresso prevendo o fim do vestibular, porém, foram arquivados. Um deles, de Alex Canziani (PTB-PR), substituía a prova por um curso de pré-graduação, no qual os estudantes teriam acesso, durante um ano, a disciplinas básicas de várias áreas, para depois optar pelo curso.