Título: O fenômeno do desemprego contaminou a todos
Autor: D'Ercole, Ronaldo; Rodrigues, Lino
Fonte: O Globo, 03/05/2009, Economia, p. 34

Presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Marcio Pochmann diz que o desemprego afeta todos indistintamente.

Mas, destaca, os com menos experiência e qualificação, 80% dos desempregados, têm menos chances de voltar ao mercado. O governo vai precisar repensar sua assistência, diz.

Luciana Casemiro

O GLOBO: Parece que dessa vez não há um perfil específico de desempregado...

MARCIO POCHMANN: O fenômeno do desemprego contaminou a todos, independentemente de gênero, raça e escolaridade. O que tem de diferente é o tempo de manifestação nas regiões do país. A crise contaminou primeiro as regiões mais industriais e exportadoras, Sudeste e Sul; depois as mais dependentes do recursos públicos, reduzidos com a regressão da atividade econômica, Norte e Nordeste.

Como o senhor avalia o índice de desemprego no país? POCHMANN: Apesar de haver um saldo líquido negativo no emprego formal, no Brasil vaga fechada não significa diretamente desemprego, como nos países desenvolvidos.

Aqui há uma passagem pela informalidade ou o trabalho precário. Se o número de desemprego aqui não é tão significativo como dos EUA, não quer dizer que o mercado de trabalho não esteja sendo bastante afetado.

Qual a perspectiva para este ano? POCHMANN:Trabalhamos com a expectativa de expansão do emprego formal, de 500 mil a 600 mil vagas. O que é insuficiente para dar conta de quem chega ao mercado de trabalho.

Por isso, prevemos também aumento do desemprego e da informalidade. Isso representa uma inflexão da trajetória dos últimos quatro anos, em que houve alta do emprego formal e redução do desemprego e da informalidade.

O que significa essa ruptura? POCHMANN: Em 1980, 50% dos ocupados contribuíam para a Previdência. Hoje, o índice é de 48,7%. Antes da crise, esperávamos alcançar o patamar de 1980 no fim de 2010.

Mas já é possível falar em tendência? POCHMANN: Observando momentos de piora do mercado de trabalho, como em 1981/1983, 1990/1992 e 1999, a diferença é que nesses episódios não tínhamos medidas anticíclicas como agora. Foi o caso da redução da taxa de juros, da desoneração tributária, do aumento do salário mínimo, de programas de distribuição de renda como o Bolsa Família, que criaram um colchão na pirâmide social. Além disso, há ações em curso dos governos federais e estaduais, como o PAC, que permitirão desacelerar a queda (do desemprego).

Podemos ser mais otimistas? POCHMANN: Nossa projeção para o segundo semestre é melhor do que o primeiro.

Mas infelizmente há um estoque grande de desempregados e 80% deles não têm condições de competir no mercado de trabalho, por falta de experiência e qualificação.

Qual seria a saída? POCHMANN: O desemprego é um problema da sociedade, não uma questão pessoal. Por isso a procura coletiva, organizada, é mais efetiva. O governo precisa repensar políticas públicas de serviços aos desempregos. É preciso ter maior racionalidade, integrar a rede de benefícios à qualificação e à prospecção e mediação de vagas.