Título: Pânico ou pandemia?
Autor: Achenbach, Joel; Brown, David
Fonte: O Globo, 03/05/2009, O Mundo, p. 40

Disseminação da gripe suína leva a discussão sobre equilíbrio entre prevenção e alarmismo.

O patógeno que tem chamado a atenção mundial tem um nome oficial (vírus de origem suína influenza A H1N1), um acrônimo (S-OIV), um apelido (gripe suína) e um berço aparente (México). Mas a natureza essencial do patógeno, sua personalidade e virulência ainda são objeto de investigação frenética.

Como todos os vírus do tipo influenza, ele está em caprichosa mutação; assim, não é uma ameaça à saúde pública estática e previsível, mas uma em constante evolução.

O vírus ganhou rosto global, tendo chegado à Ásia dias atrás com os primeiros casos registrados em Coreia e Hong Kong. Ele também pipocou na Dinamarca, na Itália, na Irlanda e na Costa Rica, assim como em 21 estados americanos.

Mas também tem havido reações adversas a esse temor do vírus. Algumas autoridades se perguntam se as escolas estão se precipitando ao fecharem ao primeiro sinal da gripe suína.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) mencionou diretamente o tema da pandemiaversuspânico dias atrás alertando o público para que não se apresse nas conclusões sobre a virulência da nova gripe. O vírus ainda não mostrou letalidade fora do México ¿ o caso fatal registrado nos EUA foi de uma criança que tinha viajado do México para o Texas ¿ embora isso não signifique que ele vai continuar um patógeno brando nas próximas semanas ou meses, segundo as autoridades.

O vírus influenza é simples, com apenas oito genes, mas ele produz cópias imperfeitas de si mesmo, levando a mutações constantes.

A maioria delas são becos sem saída, mas dadas oportunidades suficientes, ele pode se tornar mais contagioso e mais letal.

Notícias positivas têm vindo à tona. Cientistas mexicanos disseram que a contagiosidade da gripe suína não é maior que a das gripes sazonais que circulam todo ano. E uma análise genética preliminar não revelou nenhum dos marcadores que os cientistas associam à virulência do vírus da Gripe Espanhola de 1918, segundo Nancy Cox, chefe do laboratório de gripe do Centro de Controle e Prevenção de Doenças. A pandemia de 1918-19 ¿ que matou cerca de 50 milhões de pessoas ¿ deixou marcas profundas no sistema de saúde de emergência de hoje.

OMS alerta para significado de pandemia

Jeffery Taubenberger, o pesquisador dos Institutos Nacionais de Saúde que reconstruiu o vírus da gripe de 1918, disse que está desenvolvendo o novo vírus da gripe suína em seu laboratório.

¿ Estamos ainda no começo da investigação de como o vírus se comporta. Ainda estou relutante para fazer previsões sobre o que um vírus da influenza que muda tão rapidamente vai fazer em seguida ¿ diz ele, que, no entanto, acredita que o agente infeccioso vá se espalhar pelo planeta.

Já o porta-voz da OMS, Gregory Hartl, observou que o público pode interpretar erroneamente a palavra ¿pandemia¿. O termo se refere ao grau de alastramento de uma moléstia, não à sua gravidade.

Um dos maiores fatores desconhecidos do vírus da gripe suína é seu percentual de mortalidade: a fração das pessoas infectadas que morrem em decorrência dele. Em relação à gripe de 1918, esse percentual era de 2% a 2,5% nos EUA.

As outras duas pandemias de gripe do século XX, no entanto, eram bem mais brandas. A gripe asiática de 1957-58 teve um índice de mortalidade entre 0,2% e 0,5%, e o percentual da gripe de Hong Kong de 1968-69 foi ainda menor, em torno de 0,1%, próximo ao das gripes sazonais.

A dúvida é de quantas pessoas contraíram o vírus influenza, mas nunca adoeceram ou nunca souberam disso. As primeiros pistas vindas dos EUA e de alguns países europeus onde a cepa está se alastrando sugerem que o vírus não é especialmente perigoso, já que houve poucas mortes até agora. Independentemente de quão perigoso o vírus mostre ser, a nova gripe suína tem grande chance de eventualmente infectar todos os continentes e países, embora isso possa levar anos. Estudos da década de 1930 revelaram que 97% das pessoas nascidas antes de 1920 tinha anticorpos para o vírus da gripe espanhola. Isso mostra que quase todo mundo vivo durante seus três anos de circulação ¿ 1918 a 1920 ¿ em algum momento foi infectado.

Um destino semelhante aguarda toda população exposta por tempo suficiente a uma nova cepa de vírus da gripe para a qual não é imune, acreditam os especialistas.